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São Paulo, quinta-feira, 17 de abril de 2003

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FEBEM

240 internos maiores de 18 anos foram transferidos; segundo o presidente da instituição, não havia outra alternativa

Alckmin ignora lei, e infrator vai para prisão

Almeida Rocha/Folha Imagem
Policiais acompanham transferência de internos da Febem para quatro presídios no Estado


SÉRGIO DURAN
DA REPORTAGEM LOCAL

Sem autorização da Justiça, a Fundação Estadual do Bem-Estar do Menor (Febem) transferiu ontem 240 internos com idade superior a 18 anos da unidade de Franco da Rocha, na região metropolitana de São Paulo, para quatro presídios comuns.
A decisão -afirma o próprio presidente da Febem, Paulo Sérgio de Oliveira e Costa- fere o Estatuto da Criança e do Adolescente (ECA), segundo o qual menores infratores não podem ter o mesmo tratamento de presos do sistema carcerário. "De fato, contradiz a lei, mas não tínhamos opção. Estamos preparados para as críticas", disse Oliveira e Costa.
A transferência ocorre um dia após o governador Geraldo Alckmin defender mudanças no ECA para que infratores próximos da maioridade ou que a tenham atingido na Febem recebam tratamento mais rígido.
Segundo a Secretaria de Administração Penitenciária, 108 internos foram para o Centro de Reabilitação Penitenciária (CRP) Avaré 1, 66 para o CRP de Taubaté, o "Piranhão" -ambos de segurança máxima-, 49 e 17 para os centros de detenção provisória de Hortolândia e Suzano, respectivamente. A operação começou por volta das 6h de ontem.
Mães de internos transferidos ainda não sabiam onde os filhos estavam, segundo a Associação de Mães e Amigos de Adolescentes e Crianças em Risco.
Segundo Oliveira e Costa, os 240 internos ficarão nas prisões durante 30 dias, enquanto a unidade 30, onde ocorreram anteontem três rebeliões, é reformada.
Nos presídios, os menores não irão se misturar com os detentos comuns, afirmou Oliveira e Costa. Ele disse ainda que equipes da Febem acompanharão o dia-a-dia dos adolescentes transferidos.
Desde a manhã de ontem, representantes jurídicos da Febem tentam obter autorização da Corregedoria Geral de Justiça do Estado para legitimar a operação de transferência. Até a noite, não havia saído a decisão judicial.

"Selvageria"
A medida -"dramática", nas palavras de Oliveira e Costa- foi tomada "pelo governo" na madrugada de ontem, enquanto menores rebelados destruíam a unidade 30 de Franco da Rocha, no primeiro dos três motins que se seguiram. "Aquilo foi uma selvageria." A unidade rebelada enfrentava superlotação desde que os internos da vizinha unidade 31 foram transferidos para lá após motim ocorrido no sábado, que resultou na fuga de 121 jovens.
A mudança, porém, só piorou as coisas. Em cinco dias, a Febem conseguiu ficar com as duas unidades destruídas. De acordo com Oliveira e Costa, a situação da 30, a que passou pelos três motins seguidos, é ainda pior do que a da 31, atualmente em reforma.
"Dos colchões às portas e encanamentos, tudo está destruído. Até a rede elétrica está danificada. Depois das rebeliões, deixou de existir qualquer condição de habitabilidade", afirmou ele, que mostrou fotografias do interior da unidade após os motins.
Por essa razão, o presidente da Febem -promotor de Justiça licenciado- acredita que não deverá ser condenado judicialmente pelo confinamento provisório dos menores em presídios comuns. "Houve um estado de necessidade", argumentou.
Após concluídas as reformas, os adolescentes voltarão para a unidade 30, que, junto com a 31, têm o fechamento pedido na Justiça em ação da Promotoria da Infância e da Juventude.
Ontem, segundo a promotoria, a juíza-corregedora da Febem, Mônica Ribeiro Paukoski, determinou o fechamento da unidade 31 em 90 dias e o afastamento de dois ex-diretores. A Febem informou que não foi notificada oficialmente da decisão.

Sem roupas
O promotor da Infância Wilson Tafner condenou a transferência dos menores, mas ponderou que a situação e até o projeto arquitetônico das unidades de Franco da Rocha eram idênticos aos dos presídios onde eles estão agora.
"Basta reaproveitar as reportagens escritas em 1999. Não mudou nada", diz Tafner a respeito da primeira vez em que o governo do Estado transferiu adolescentes para presídios comuns -em 1999, após sucessivas rebeliões na extinta unidade Imigrantes.
Para o promotor, seria oportuno que a presidência da Febem investigasse as rebeliões de ontem. Ele diz que, após o primeiro motim da unidade 30, ainda na madrugada, as condições para que novas rebeliões eram limitadas.
Isso porque, após a primeira rebelião, a tropa de choque revistou os menores e os trancou nas celas apenas de cuecas. "Como eles conseguiram, assim, arrombar as portas e chegar ao telhado?"
Oliveira e Costa afirma que irá investigar a eventual participação de funcionários nos motins.

Colaboraram a Folha Vale e o "Agora"


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