São Paulo, quarta-feira, 17 de maio de 2006

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GUERRA URBANA /A MADRUGADA

Donos e funcionários de bares do centro da capital dizem ter sido ameaçados por PMs e por civis para fechar estabelecimentos

Comerciantes relatam toque de recolher

Sidinei Lopes/Folha Imagem
Jovens são parados pela polícia no centro, durante a madrugada


KLEBER TOMAZ
DA REPORTAGEM LOCAL

Apesar de a madrugada de ontem ter sido a mais tranqüila, sem muitos ataques, desde as primeiras ações orquestradas pelo PCC (Primeiro Comando da Capital), o clima nas ruas do centro de São Paulo era de abandono e medo.
Segundo testemunhas, a polícia (civil e militar) haviam decretado "toque de recolher" a partir das 20h de anteontem. Mandou donos de bares e estabelecimentos comerciais abaixarem as portas. Quem desobedeceu a ordem chegou até a ser ameaçado por motociclistas, aparentemente civis a mando da organização criminosa, armados de pistolas.
"Pagamos impostos, alvará de funcionamento e tudo o que nos pedem. Aí vem essa onda de ataques, e até a polícia nos manda fechar o comércio. Nunca vi isso. Ao invés de nos dar proteção, ela morre de medo dos bandidos", falou Júlio César Gomes, proprietário de um bar próximo à praça da República.
Os poucos locais que insistiram em descumprir a ordem expressa e verbal da polícia tiveram de se explicar para os supostos bandidos.
Dois homens numa moto ameaçaram o manobrista de um estacionamento localizado na rua Maceió, no cruzamento com a rua da Consolação.
"Um motociclista parou na frente do estacionamento, mostrou o o relógio apontando o dedo para ele, e falou que já era hora de abaixar as portas. Perguntei por que, e ele levantou a blusa e mostrou a arma", relatou o manobrista A.S., que não quis se identificar.
"Tenho família, não sou louco. Eles matam policiais, por que não matariam a gente, que nem arma tem?", completou o funcionário.
Ainda na rua da Consolação, sentido avenida Paulista, só um bar estava aberto: o tradicional Sujinho. Mesmo assim, a contragosto de seus funcionários, que reclamaram do próprio patrão.
"Os policiais passaram aqui e falaram para nós que seria bom tomar muito cuidado. Não sei por que nosso chefe não nos deixou fechar as portas também. Estamos correndo risco de morte aqui", falou Valdo dos Santos, o Zezinho, um dos gerentes.
Segundo ele, o movimento no bar caiu 50%. "Ninguém é louco de sair na rua hoje [ontem], depois de tudo o que aconteceu envolvendo polícia e PCC. Infelizmente nós somos empregados e temos obrigações a cumprir", afirmou Zezinho.
Procurado pela Folha para falar sobre o assunto, o comando da PM não havia se pronunciado até o fechamento desta edição.
Uma das raras exceções de distúrbio ocorreu por volta das 3h de ontem. Foram mortos pela Rota dois homens que não portavam documentos e teriam atacado uma agência do Bradesco na avenida Mateo Bei, uma das principais de São Mateus.
Os policiais guardavam a agência à espera da perícia disseram que o grupo disparou e atirou bombas no local, que teve vidraças quebradas.
Um carro da Rota que passava pela avenida viu o ataque, foi alvejado, e os policiais reagiram com mais disparos.
A delegacia confirmou as mortes, mas ainda não tinha Boletim de Ocorrência sobre o caso. Os dois homens também foram levados ao Pronto Socorro de São Mateus, mas não resistiram.
Um homem que teria tentado assaltar um bar foi morto pela PM na avenida Dona Belmira Marim, no Grajaú, periferia da zona sul. Policiais que estavam no local não quiseram dar declarações.
O dono do bar, bastante amedrontado, também não quis falar com a reportagem. O acusado chegou morto ao Pronto Socorro do Grajaú, afirmaram os policiais.


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