São Paulo, quinta-feira, 17 de maio de 2007

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Limpar Tietê leva 10 anos, diz especialista

Para José Galizia Tundisi, um dos maiores especialistas em recursos hídricos do país, recuperar o rio custa pelo menos mais R$ 2 bi

Valor é semelhante ao custo da primeira etapa da linha 4-amarela do metrô, que contempla seis das 11 estações do projeto

AFRA BALAZINA
DA REPORTAGEM LOCAL

São necessários R$ 2 bilhões e pelo menos mais dez anos de trabalho "firme" para recuperar o rio Tietê. A avaliação é de José Galizia Tundisi, presidente honorário do Instituto Internacional de Ecologia e um dos maiores especialistas em recursos hídricos do país. O valor é semelhante ao custo da primeira etapa da linha 4-amarela do metrô, que contempla seis das 11 estações do projeto. Para Tundisi, que foi professor da Universidade Federal de São Carlos e da USP, o dinheiro já investido na despoluição do rio não foi "desperdiçado". A seguir, trechos da entrevista concedida à Folha.

 

FOLHA - O Tietê é um caso perdido?
JOSÉ GALIZIA TUNDISI -
Não. Mas recuperá-lo é algo muito complexo. Tem solução, mas dinheiro só não resolve, tecnologia só também não resolve. [...] O Brasil tem tecnologia, tem muita gente preparada. Mas uma coisa que me preocupa é que existe uma distância entre a questão técnica e a aplicação. Ou seja, nós não estamos conseguindo transformar o nosso conhecimento técnico, das nossas tecnologias e as nossas informações, em ações políticas. É fundamental que se avance nessa direção.

FOLHA - Foram investidos US$ 1,1 bilhão na primeira fase do Projeto Tietê e mais US$ 400 milhões na segunda, em andamento. Sem esse dinheiro, a situação seria pior?
TUNDISI -
Certamente. Porque na verdade nós estamos sempre atrás do processo, nosso passivo ambiental é muito grande. Evidente que se isso não tivesse sido feito a situação estaria muito pior. Melhorou relativamente porque houve crescimento da população nesse período, há muita ocupação irregular dos mananciais, o que conseqüentemente agrava a qualidade da água do rio.

FOLHA - A verba foi aplicada da melhor forma? Houve desperdício?
TUNDISI -
Não acho que tenha havido desperdício. A gente tem acompanhado e vê o trabalho dos técnicos. É que o problema é muito sério e as quantidades de todos esses poluentes são muito elevadas e o passivo vem de muitos e muitos anos. Veja bem, depois que resolver o problema das bacias do Tietê você vai ter que resolver o problema interno, porque o rio tem uma carga interna grande.

FOLHA - Como assim?
TUNDISI -
Tem muitos metais, muito nitrogênio, muito fósforo dentro do sedimento do rio. Então, por mais que se reduza a carga externa [esgotos], tem uma carga interna que vai continuar influenciando o rio. O rio recebe tudo o que acontece na bacia hidrográfica e aí isso se acumula. A história toda do rio está no sedimento. São anos e anos e anos de acumulação de matéria orgânica, inorgânica, metais, partículas, muitas vezes substâncias tóxicas. Então, tem que investir muito.

FOLHA - Quanto dinheiro mais precisaria para resolver a questão?
TUNDISI -
No mínimo mais US$ 1 bilhão, ou R$ 2 bilhões, para que se pudesse ter um avanço. Isso incluiria a contenção das fontes difusas de poluição, preparação de gestores, elaboração de mapas acurados do uso do solo para que com isso se pudesse ter uma visão mais clara dessas fontes não pontuais, tratamento dos afluentes, tratamento de esgotos das cidades [...], educação da população.

FOLHA - É possível comparar a situação do Tietê com a do Tâmisa?
TUNDISI -
Até certo ponto. O primeiro ato para despoluir o rio Tâmisa [Londres] foi em 1873. Depois, houve 20 anos de estudo e avaliação de processos para despoluir e um tratamento rigoroso para os esgotos. Os grandes lagos norte-americanos -muito maiores que o Tietê- tinham enormes problemas de contaminação especialmente por nitrogênio e fósforo, por causa de esgoto também. Levou 20 anos para despoluir e se gastou US$ 20 bilhões. É o caso do lago Superior, lago Ontario, lago Michigan.

FOLHA - Quantos anos levaria para recuperar o rio Tietê?
TUNDISI -
Na melhor das hipóteses, dez anos.


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