|
Texto Anterior | Próximo Texto | Índice
Limpar Tietê leva 10 anos, diz especialista
Para José Galizia Tundisi, um dos maiores especialistas em recursos hídricos do país, recuperar o rio custa pelo menos mais R$ 2 bi
Valor é semelhante ao
custo da primeira etapa da
linha 4-amarela do metrô,
que contempla seis das
11 estações do projeto
AFRA BALAZINA
DA REPORTAGEM LOCAL
São necessários R$ 2 bilhões
e pelo menos mais dez anos de
trabalho "firme" para recuperar o rio Tietê. A avaliação é de
José Galizia Tundisi, presidente honorário do Instituto Internacional de Ecologia e um dos
maiores especialistas em recursos hídricos do país.
O valor é semelhante ao custo da primeira etapa da linha 4-amarela do metrô, que contempla seis das 11 estações do projeto. Para Tundisi, que foi professor da Universidade Federal
de São Carlos e da USP, o dinheiro já investido na despoluição do rio não foi "desperdiçado". A seguir, trechos da entrevista concedida à Folha.
FOLHA - O Tietê é um caso perdido?
JOSÉ GALIZIA TUNDISI - Não. Mas
recuperá-lo é algo muito complexo. Tem solução, mas dinheiro só não resolve, tecnologia só também não resolve. [...]
O Brasil tem tecnologia, tem
muita gente preparada. Mas
uma coisa que me preocupa é
que existe uma distância entre
a questão técnica e a aplicação.
Ou seja, nós não estamos conseguindo transformar o nosso
conhecimento técnico, das
nossas tecnologias e as nossas
informações, em ações políticas. É fundamental que se
avance nessa direção.
FOLHA - Foram investidos US$ 1,1
bilhão na primeira fase do Projeto
Tietê e mais US$ 400 milhões na segunda, em andamento. Sem esse dinheiro, a situação seria pior?
TUNDISI - Certamente. Porque
na verdade nós estamos sempre atrás do processo, nosso
passivo ambiental é muito
grande. Evidente que se isso
não tivesse sido feito a situação
estaria muito pior. Melhorou
relativamente porque houve
crescimento da população nesse período, há muita ocupação
irregular dos mananciais, o que
conseqüentemente agrava a
qualidade da água do rio.
FOLHA - A verba foi aplicada da
melhor forma? Houve desperdício?
TUNDISI - Não acho que tenha
havido desperdício. A gente
tem acompanhado e vê o trabalho dos técnicos. É que o problema é muito sério e as quantidades de todos esses poluentes
são muito elevadas e o passivo
vem de muitos e muitos anos.
Veja bem, depois que resolver o
problema das bacias do Tietê
você vai ter que resolver o problema interno, porque o rio
tem uma carga interna grande.
FOLHA - Como assim?
TUNDISI - Tem muitos metais,
muito nitrogênio, muito fósforo dentro do sedimento do rio.
Então, por mais que se reduza a
carga externa [esgotos], tem
uma carga interna que vai continuar influenciando o rio. O
rio recebe tudo o que acontece
na bacia hidrográfica e aí isso se
acumula. A história toda do rio
está no sedimento. São anos e
anos e anos de acumulação de
matéria orgânica, inorgânica,
metais, partículas, muitas vezes substâncias tóxicas. Então,
tem que investir muito.
FOLHA - Quanto dinheiro mais precisaria para resolver a questão?
TUNDISI - No mínimo mais US$
1 bilhão, ou R$ 2 bilhões, para
que se pudesse ter um avanço.
Isso incluiria a contenção das
fontes difusas de poluição, preparação de gestores, elaboração
de mapas acurados do uso do
solo para que com isso se pudesse ter uma visão mais clara
dessas fontes não pontuais, tratamento dos afluentes, tratamento de esgotos das cidades
[...], educação da população.
FOLHA - É possível comparar a situação do Tietê com a do Tâmisa?
TUNDISI - Até certo ponto. O
primeiro ato para despoluir o
rio Tâmisa [Londres] foi em
1873. Depois, houve 20 anos de
estudo e avaliação de processos
para despoluir e um tratamento rigoroso para os esgotos. Os
grandes lagos norte-americanos -muito maiores que o Tietê- tinham enormes problemas de contaminação especialmente por nitrogênio e fósforo,
por causa de esgoto também.
Levou 20 anos para despoluir e
se gastou US$ 20 bilhões. É o
caso do lago Superior, lago Ontario, lago Michigan.
FOLHA - Quantos anos levaria para
recuperar o rio Tietê?
TUNDISI - Na melhor das hipóteses, dez anos.
Texto Anterior: Revitalização: Parte da verba de U$ 100 milhões do BID está parada Próximo Texto: É preciso definir regra sobre bingos, afirma Lula Índice
|