São Paulo, domingo, 17 de junho de 2007

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comentário

O poder é afrodisíaco e o sexo sobe à cabeça

Donos de clínicas de massagem da região de Congonhas descobriram antes que o orgasmo amacia o apagão aéreo

XICO SÁ
COLUNISTA DA FOLHA

Foram alguns donos de saunas e clínicas de massagens na região do aeroporto de Congonhas, e não a ministra Marta Suplicy (Turismo), que descobriram a novíssima função do orgasmo: a de amaciar o apagão aéreo que tanto enlouquece a estressada classe média brasileira.
Quando a ex-prefeita sacou da luxuosa nécessaire da inconveniência o velho conselho -livremente inspirado no psicanalista Wilhelm Reich (1987-1917)-, a indústria do sexo em São Paulo já estava cansada de recolher passageiros nos saguões e levá-los para o clássico "relax for man" das casas do ramo nos bairros do Brooklin e de Moema, zona sul da cidade, onde os aviões demasiadamente humanos e siliconados batem ponto conforme o relógio biológico do desejo masculino.
Reich, não custa lembrar para os mais jovens, esses moços, pobres moços, era um cara que só pensava naquilo, no orgasmo como remate de todos os males da humanidade, inclusive os de origem política. O rapaz do relaxa e goza anda fora de moda faz tempo na Stressolândia, como poderíamos rebatizar a paulicéia, por supuesto, sem se falar na geografia da fome de outros Brasis afora.
Algumas destas saunas, no auge da crise, mantinham serviços de vans e ofereciam o pacote "relaxe e goze" para os homens condenados à espera dos aviões. Só para os homens, vê que triste. Na oportunidade, foram desenvolvidos também programas especiais de milhagem que são mantidos até hoje -vide anúncios classificados dos jornais.

Afrodisíaco
O poder é mesmo afrodisíaco, como dizia o doutor Ulysses Guimarães (1916-92), todo-poderoso peemedebista que ocupou, sem fastio, todos os cargos da República. E quando relaxam no poder, o sexo e o dom de falarem como pessoas "normais" sobem mesmo à cabeça dos políticos.
Em uma década e meia de entrevistas com essa gente, como repórter da zoologia fantástica politiqueira, lembro da cena mais repetitiva. Sempre que os gravadores são desligados vem uma sacanagem radicalmente machista ou alguma frase sobre sexo. Relaxa e goza é fábula de Esopo diante do que ouvimos. Os repórteres morremos de rir sem desabrimentos nessa hora. Não publicamos nada.
A diferença é que alguns políticos, muitas vezes, não têm paciência para esperar esse instante "relax", o stop dos gravadores, caso da ministra-sexóloga, que falou exatamente o que estava acostumada a aconselhar no "TV Mulher" (Globo), quando era comentarista especializada, aliás era linda e incrível ao aconselhar o sexo anal para oprimidas donas-de-casa. Sempre com muito cuidado, é claro, além da pedagogia quase paulofreiriana.
Além muito além das várias Martas, a sexóloga e a ministra, o público e o privado, essa dupla caipira que faz confusão entre primeira e segunda voz nos inconscientes dos políticos e de nós todos, sempre apronta, não tem jeito.
Noves fora a chatice do já mofado politicamente correto, as frases dos machos políticos são impublicáveis, as frases das fêmeas soam normalmente como destempero, TPM, histerismo. É tanto que as fêmeas públicas não se arriscam à sessãozinha pornográfica que os machos têm com os repórteres depois das entrevistas.
Muitos repórteres ou colunistas que agora desforram do "relaxa e goza", muitos aliás que não fazem nem uma coisa nem a outra faz tempo, já ouviram calados ou nunca foram capazes de escrever uma frase de deputados porcos chauvinistas, mesmo que essas tivessem ligações diretas com a realidade pública. No mínimo, eram boas imagens, metáforas inconscientes, só para gastar aqui meus 15 minutos de psicanálise, sou uma espécie de novo-rico freudiano, se é que vocês me entendem.
E quando a sacanagem não é sexual, geralmente descamba para o preconceito ou o palpite infeliz de sempre. Tudo isso começou com o coronel Chico Heráclio (1920-1974), líder político de Limoeiro, Pernambuco, que um dia, no couro curtido do seu machismo, disse assim: "Mulher é feito espingarda, só presta se for guardada". A fêmea continua sendo uma arma quente!


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