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São Paulo, quinta-feira, 17 de julho de 2003

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"Pobres devem ter o direito de andar armados"

FERNANDO CANZIAN
DE WASHINGTON

No momento em que o Brasil discute o aumento do controle de armamentos, nos Estados Unidos faz sucesso o livro do economista John R. Lott, que defende as armas e do direito de usá-las.
Lott, um ex-professor das universidades de Stanford e Chicago, é autor do best-seller "More Guns, Less Crimes" (mais armas, menos crimes), que se tornou, a partir de 1998, uma espécie de bíblia dos defensores de leis pró-armas nos Estados Unidos.
Em entrevista à Folha, Lott defendeu que as pessoas mais pobres no Brasil ganhem o direito legal de andar armados.
"Tenho certeza de que muitos políticos e os ricos no Brasil andam com seguranças armados. Eles entendem os benefícios das armas, não? O que vocês fazem, no entanto, para proteger as pessoas que não tem dinheiro para pagar um segurança ou um carro blindado?", questiona.
Lott é um radical pró-armas. Ele faz parte do American Enterprise Institute (AEI), um conceituado e polêmico "think-tank" de Washington. Ligado ao Partido Republicano, o AEI reúne especialistas de várias áreas de interesse dos conservadores.
Seu novo livro, "The Bias Against Guns" (o preconceito contra as armas), investiga, a partir de pesquisas e estatísticas, o papel da mídia americana no que ele chama de "campanha sistemática contra o direito que as pessoas têm de se defender". Leia a seguir trechos da entrevista:

Folha - Não é natural que exista um preconceito na sociedade contra as armas de fogo?
John R. Lott -
As informações que as pessoas obtêm sobre armas vêm da mídia ou do governo. Nenhum dos dois está dando à sociedade uma perspectiva muito balanceada sobre os custos e benefícios das armas. Armas contribuem para para que muitas coisas ruins aconteçam, mas também fazem com que seja mais fácil às pessoas se defenderem.
A mídia constantemente destaca apenas as coisas ruins que acontecem quando há armas envolvidas. As estatísticas mostram, no entanto, que as pessoas usam até 4,5 vezes mais armas para se defender do que para cometer crimes que resultam em mortes.

Folha - Se existem mais armas em uma sociedade, é muito mais fácil às pessoas, com boas ou más intenções, acabarem conseguindo um revólver. Isso é obvio, não?
Lott -
Vamos imaginar o seguinte: amanhã todas as armas devem ser banidas nos Estados Unidos. Quem você acha que vai entregar suas armas para as autoridades? Só as pessoas mais honestas, não os criminosos. Tenho certeza de que haveria um aumento nos crimes violentos, pois os criminosos teriam, de um dia para o outro, menos com que se preocupar.

Folha - Países como o Reino Unido têm leis extremamente restritivas e pouquíssimos crimes relacionados a armas de fogo. Como o sr. explica isso?
Lott -
Os ingleses sempre tiveram uma taxa de crimes com armas de fogo muito baixa, mesmo antes do banimento no país. Atualmente, o Reino Unido tem uma taxa de assassinatos muito menor do que nos EUA, mas essa diferença vem diminuindo.

Folha - No Brasil, há uma grande polêmica entre os que defendem a proibição total das armas, o porte em alguns casos e a liberalização geral. Segundo dados da ONU, 89% dos assassinatos no país ocorrem pelo uso de armas de fogo.
Lott -
Tenho certeza de que muitos políticos e pessoas ricas no Brasil andam com seguranças armados. Eles entendem os benefícios das armas, não? O que vocês fazem, no entanto, para proteger as pessoas que não tem dinheiro para pagar um segurança armado ou um carro blindado?
Na minha opinião, as pessoas que mais se beneficiariam de uma liberalização seriam justamente as que vivem em áreas mais pobres nas grandes cidades e que não contam com a ajuda da polícia para se defender.
Eu já estive no Brasil. Estive em São Paulo e achei muito estranho o fato de vocês terem carros de polícia parados no meio da rua, em zonas ricas e movimentadas, com as luzes ligadas como se quisessem dizer: ""Ei, nós estamos aqui". Mas, não muito longe dali, crimes estão acontecendo, especialmente nas zonas mais pobres.
Parece-me óbvio que, especialmente em um país pobre como o Brasil, a polícia não tenha condições de lidar com todos os crimes. Por isso acredito que as pessoas deveriam poder se defender por elas mesmas.

Folha - O sr. tem uma arma? Já usou uma para se defender?
Lott -
Comprei uma há alguns anos. Não precisei usá-la até hoje.


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