São Paulo, terça-feira, 17 de outubro de 2000

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MARILENE FELINTO

Caça ao perigoso "bandido" do MST

O inimigo número 1 do país não é mais o juiz Nicolau dos Santos Neto, o ex-presidente Collor ou o prefeito de São Paulo, Celso Pitta. Parece mais perigoso -armado de coquetéis molotov até os dentes- e dizem estar infiltrado agora no movimento dos sem-terra. Ataques ao MST não são novidade, mas daí a querer impor à sociedade a imagem do movimento como de uma quadrilha de criminosos cujo objetivo não é senão o crime, a corrupção e a enganação, supera os limites do bom senso.
Dessa vez o ataque veio em bloco. É todo o poder econômico, o Executivo, o Judiciário, a Polícia Federal e a imprensa ocupados em contabilizar a "corrupção" e o "desvio de dinheiro público" praticado pelos sem-terra.
Ficam contando migalhas, chamam de "pedágio" os 2% que cada assentado que recebeu terra ou empréstimo (os tais "recursos federais") deve doar ao movimento ou os R$ 70 ou R$ 125 que o MST descontaria do pagamento efetuado a técnicos que prestam serviço ao movimento.
Chama-se a isso desvio de dinheiro público: a contribuição que o assentado daria voluntariamente -ou obrigado, como se quer provar-, por definição do estatuto dos sem-terra e o desconto no pagamento dos técnicos.
Se isso for mesmo desvio de dinheiro público, então há partido político praticando o mesmo crime. É público e sabido que mais de um partido político desconta uma porcentagem dos salários de seus parlamentares como contribuição.
Pode-se ainda argumentar que salário é salário, e empréstimo de banco (para fins de reforma agrária) é outra coisa. Não se pode deixar de lembrar, porém, que o empréstimo será pago pelo assentado e que -mais importante ainda- a contribuição que ele dá ao MST reverte em benefícios a ele próprio, assentado, e aos ainda não assentados. Ou seja: distribui renda, contribui para a reforma agrária.
A não ser que se prove que os dirigentes do MST estão enriquecendo à custa do tal "pedágio". Crime seria isso. Mas nada se diz sobre isso, nada se provou até agora. A idéia é fazer estardalhaço baseado em quase nada.
Por que a Polícia Federal, em vez de perseguir os pés-de-chinelo do MST, não se empenha em prender o juiz Nicolau? Somada, a contribuição de cada um dos assentados do MST ao movimento não chega nem ao cheiro das centenas de milhões que esse juiz roubou do dinheiro público para enriquecer seu patrimônio pessoal. Cadê o juiz?
A quantia que o MST recebe dos assentados, para investir neles próprios, também não deve chegar aos pés do R$ 1,2 bilhão que Paulo Maluf, o ex-prefeito de São Paulo, foi condenado a devolver aos cofres públicos da cidade.
Cadê os R$ 18 milhões que o governo FHC gastou com o estande do Brasil na Expo 2000 da Alemanha, uma feira para gringo ver? Por acaso isso não é desvio de dinheiro público?
Sou simpatizante declarada do MST, mas nem por isso deixo de ter críticas ao movimento. Crítica é uma coisa, perseguição desonesta é outra. A pior ditadura é a do poder econômico -é covarde, utiliza-se de meios escusos, confunde a opinião pública, suas armas são invisíveis, embora seus efeitos destruidores sejam para lá de evidentes.


E-mail - mfelinto@uol.com.br



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