São Paulo, terça-feira, 17 de outubro de 2006

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Bolsa Família segura criança na escola, mas não o jovem

Em todas as faixas etárias, índice de freqüência escolar é maior entre os que têm o benefício

Dados mostram que, mesmo com a ajuda da União, famílias têm dificuldade para manter os filhos a partir dos 13 anos na escola

ANTÔNIO GOIS
DA SUCURSAL DO RIO

Em todas as faixas etárias de 6 a 20 anos, crianças e jovens de famílias atendidas pelo Bolsa Família freqüentam mais a escola do que aquelas que não recebem nenhum benefício. No entanto, uma análise mais minuciosa desses dados mostra que, mesmo recebendo ajuda do governo federal, muitas famílias estão tendo problemas para manter os filhos a partir dos 13 anos na escola.
Essa é uma das conclusões de um estudo da pesquisadora Sônia Rocha, do Instituto de Estudos do Trabalho e Sociedade, que será apresentado hoje no seminário Educação, Pobreza e Desigualdade no Brasil, realizado pelo instituto no Rio.
Rocha comparou, a partir da Pesquisa Nacional por Amostra de Domicílios do IBGE de 2004, o percentual de crianças e jovens que não freqüentavam a escola em cada idade. Os dados mostram que, em famílias que recebem Bolsa Família ou Bolsa Escola, a proporção dos que não estudavam variava pouco de 7 a 13 anos.
Aos 14 e 15 anos, idades em que as famílias ainda têm que cumprir a condicionalidade de manter os filhos estudando, o percentual dobra mesmo entre os beneficiados, o que sugere que nessa idade o programa não é eficiente para um patamar significativo de adolescentes. Após os 15 anos, quando não fazem mais parte do programa, essas taxas aumentam em ritmo ainda mais acelerado.
Aos sete anos, o percentual de crianças fora da escola nas famílias beneficiadas é de apenas 3,9%. Esse percentual atinge seu menor patamar aos 11 anos (com apenas 1% de crianças fora da escola) e, aos 13, é ainda baixo (3%). O problema detectado por Rocha é que, a partir daí, as taxas crescem em ritmo acelerado. Aumentam para 7,1% aos 14 anos, passam para 12,7% aos 15, e continuam aumentando muito até chegar ao patamar de 78,6% aos 20.
No caso das famílias que não recebiam o benefício, o resultado é parecido (aumento principalmente a partir dos 13), mas em patamares ainda maiores.
Esses dados apontam uma dificuldade, reconhecida pelo Ministério do Desenvolvimento Social, de manter os jovens na escola a partir dos 13 anos, mesmo em famílias que recebem o benefício.
O Bolsa Família é destinado a famílias com renda mensal por pessoa de até R$ 120. Uma das condições para receber o benefício (no caso das famílias com renda por pessoa entre R$ 60 e R$ 120) é ter crianças ou adolescentes entre 0 a 15 anos. Muitos jovens de 16 a 20, no entanto, vêm de famílias que recebem o benefício porque têm irmãos em idade menor.
"A partir dos 13 anos, muitas crianças apresentam um atraso escolar muito grande, o que contribui para a evasão. Além disso, começam também a sair para o mercado de trabalho. A partir daí, uma contrapartida de R$ 15 ou mesmo de R$ 45 para a família passa a ser irrelevante para manter a criança na escola", diz Rocha.
A secretária interina do Bolsa Família, Lúcia Modesto, concorda que há uma dificuldade maior de manter a criança na escola após os 13 anos: "A partir dos 14, o custo para a criança de ficar na escola não compensa o que ela poderá ganhar no mercado de trabalho." Ela cita estudo feito pelo governo que mostra que a evasão entre os beneficiados está muito concentrada nessa faixa etária principalmente por causa do trabalho infantil e da gravidez precoce.
O sociólogo Simon Schwartzman, organizador do seminário e autor de estudos sobre o impacto dos programas de transferência de renda na freqüência à escola, defende, porém, que a razão para a evasão dos jovens está principalmente na escola.
"Se formos olhar quanto essas crianças ganham no mercado de trabalho, vamos perceber que não é significativo para aumentar a renda da família. Elas estão saindo da escola porque não estão aprendendo. Isso pode ser comprovado pelos resultados muito ruins que as crianças mais pobres têm em exames como o Saeb [que avalia a qualidade da educação]."


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