São Paulo, sábado, 18 de fevereiro de 2006

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Desembargadores criticam juíza

FERNANDA BASSETTE
DA REPORTAGEM LOCAL

RICARDO GALLO
DA REDAÇÃO

Dois desembargadores do Tribunal de Justiça de São Paulo que votaram pela absolvição do coronel Ubiratan Guimarães decidiram cobrar explicações à juíza Maria Cristina Cotrofe Biasi, que afirmou à Folha, anteontem, que a medida foi "política", "injustificável" e vergonhosa. Um deles, inclusive, vai representá-la no TJ e estuda processar a magistrada por danos morais.
Os desembargadores integram o Órgão Especial do TJ, que absolveu, por 20 votos a 2, o coronel da reserva. A decisão reformou a condenação dada a Ubiratan em 2001, pelo 2º Tribunal do Júri, presidido por Biasi. Na ocasião, o coronel foi condenado a 632 anos de prisão pelo episódio conhecido como massacre do Carandiru. Ubiratan chefiou a invasão da Polícia Militar à Casa de Detenção em 2 de outubro de 1992, que resultou na morte de 111 presos.
"Ela não pode falar que é a decisão foi uma vergonha. Isso será objeto de representação no Conselho Superior da Magistratura. Ela se excedeu", afirmou o desembargador Ruy Camilo, 65, há nove anos no Órgão Especial. Segundo ele, a declaração da juíza à Folha põe em dúvida a idoneidade dos desembargadores que absolveram o coronel Ubiratan. "Quem age vergonhosamente age com má-fé, ou com motivos não-nobres. Ela [juíza] vai ter que explicar. Cabe [até um] processo por dano moral."
Outro desembargador ouvido pela reportagem, Laerte Nordi, 68, disse que vai colocar a questão em debate no Órgão Especial do TJ. Ele criticou a juíza pela acidez das críticas, mas não adiantou se pretende processá-la. "É uma pena, porque sou da geração em que se podia até divergir das posições, mas sempre se tinha muito respeito por elas. Ela precisará explicar essas palavras [da entrevista à Folha]. Pretendo ao menos suscitar a questão no Órgão Especial."
Os dois desembargados disseram que a decisão de absolver Ubiratan foi técnica. Camilo chegou a dizer que o TJ foi "corajoso" ao contrariar a opinião pública. "Era muito mais fácil deixar condenar [o coronel], mas tivemos a coragem de julgar tecnicamente", disse. De acordo com ele, Maria Cristina Cotrofe Biasi, em 2001, errou ao perguntar se houve excesso na ação da PM na Casa de Detenção, após os jurados terem votado que a entrada no Carandiru ocorrera no "estrito cumprimento do dever". O desembargador Laerte Nordi não quis comentar a decisão da juíza.

Equívoco
Já o desembargador Roberto Vallim Bellocchi, 65, um dos dois juízes que votou pela manutenção da pena de 632 anos, disse ontem que houve um "equívoco técnico" no julgamento do TJ.
Na opinião de Bellocchi, a juíza Maria Cristina Cotrofe Biasi, 50, que presidiu o júri em 2001, agiu corretamente elaborando o quesito sobre o excesso.
"É um dever dela, o artigo 23 do Código Penal prevê a análise do excesso. Me pareceu um equívoco dos meus colegas interpretarem o que os jurados queriam afirmar. Se acharam que era contraditório, deveriam anular o julgamento", afirmou Bellocchi.
O desembargador criticou a reinterpretação da votação dos jurados. "Reinterpretar para dar uma decisão que o jurado não queria, com todo respeito, eu acho que passou além da atividade de julgamento do recurso. Infelizmente, os que morreram não podem fazer mais nada."


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