São Paulo, sábado, 18 de fevereiro de 2006

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URBANISMO

Prefeitura retirou barracos de área embaixo de viaduto; maioria preferiu dormir na calçada a ir para abrigo

Operação no Glicério deixa catadores de lixo desabrigados

DA REPORTAGEM LOCAL

A catadora de lixo Irene Farias dos Santos, 36, dormia ontem na calçada com os 14 filhos "da própria barriga" e dois "de criação", a cem metros do barraco de madeira onde ela morava desde 2001 e que foi colocado abaixo anteontem pela Prefeitura de São Paulo.
Assim como Irene, outros catadores foram retirados de um espaço debaixo da ligação Leste-Oeste, na baixada do Glicério, região central, que era utilizado para a triagem de material reciclável e também para muitos dormirem.
A ação fez parte da operação da Subprefeitura da Sé para revitalizar a região degradada. Mas a maioria dos quase 40 desalojados só se mudou para a calçada, do outro lado da rua. "A diferença é que ali eu tinha um "tetozinho" e era mais difícil para alguém roubar minhas coisas", afirmou Francisca Pedra Cardoso, 60, que perdeu armário e TV na operação. Ontem, ela teve de dormir com seu marido numa praça.
A proposta da prefeitura é que eles fossem para albergues, mas a maioria rejeitou, principalmente sob dois argumentos: os horários de entrada e saída são incompatíveis com a atividade de catar lixo; e eles não teriam como levar os seus móveis e eletrodomésticos.
Irene dava uma razão adicional -não queria se separar nem dos filhos mais velhos. A sugestão da prefeitura era que ela fosse para um albergue só com os 13 menores de 18 anos, enquanto os demais ficariam em outro endereço.
As famílias viviam na baixada do Glicério em situação precária, ao lado do material que é separado para reciclagem, junto com sujeira, baratas e ratos. Não havia rede de água e os barracos tinham ligações clandestinas de energia.
Ontem, a prefeitura decidiu que eles poderão voltar para lá provisoriamente, mas só para fazer a reciclagem. Para dormir, não.
Na madrugada, alguns queimaram na rua parte do material recolhido. Um jovem reclamou de agressão de GCMs, que negaram.
A retirada dos catadores foi tensa anteontem. No barraco de Irene, os agentes começaram a tirar as madeiras enquanto dez crianças estavam lá dentro. Antes que alguma ficasse ferida -havia gêmeos de apenas cinco meses-, a GCM (Guarda Civil Metropolitana) se negou a continuar ajudando a derrubada do barraco.
Segundo a subprefeitura, a mãe colocou os filhos dentro do barraco para evitar a derrubada. Só às 13h30, uma assistente social e uma psicóloga chegaram ao local. A Sé afirmou que a assistência social esteve na área para conversar com as famílias pela manhã e em dias anteriores à ação.
A prefeitura abordou 153 pessoas na região do dia 8 ao 10: 64 foram para albergues, 44 recusaram atendimento e 20 tinham residência. Foram derrubados dez barracos debaixo do viaduto.


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