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No divórcio, igreja mais perdoa que condena
Na Arquidiocese de São Paulo, 90% dos interessados conseguem obter a declaração de que seu casamento nunca foi válido
"Alguns, apesar da aparência, não são casamentos de
fato. Quando ocorre esta situação é que a igreja declara a nulidade", diz padre
LEANDRO BEGUOCI
DA REPORTAGEM LOCAL
MAURÍCIO SIMIONATO
DA AGÊNCIA FOLHA, EM JUNDIAÍ
A Igreja Católica condena o
pecado, mas não o pecador. Está é a máxima usada por padres
e bispos para explicar por que o
catolicismo se opõe ao divórcio
e ao segundo casamento, mas
não expulsa as pessoas nestas
condições dos templos.
Uma carta do papa João Paulo 2º em 1981, ainda em vigor,
afirma que a igreja se opõe à separação, mas não pode discriminar os divorciados e deve arrumar meios de acolhê-los. Ao
menos desde 1917 é possível pedir a declaração de que a união
anterior não foi válida, segundo
os preceitos da religião.
Na Arquidiocese de São Paulo, cerca de 300 pessoas pedem,
por ano, que seu casamento anterior seja declarado nulo. Em
média, 90% dos interessados
conseguem. É como se seu time
fosse vice-campeão de um torneio e, algum tempo depois, o
campeão fosse declarado inexistente porque violou as regras do jogo. Na igreja, o princípio é o mesmo. Não existem dados consolidados sobre declaração de anulação de uniões católicas em todo o Brasil.
A procura, contudo, é pequena. Em 2005, cerca de 10,6 mil
pessoas se divorciaram na Justiça apenas na capital paulista.
"O casamento é e sempre foi
considerado pela igreja como
uno e indissolúvel", afirma o
padre Antônio Gonçalves, juiz
do Tribunal Eclesiástico de São
Paulo, que julga se os casamentos podem ou não ser declarados nulos. "Mas sabemos que
alguns não dão certo. Alguns,
apesar de toda aparência, não
são casamentos de fato. Quando ocorre esta situação é que a
igreja declara a nulidade."
Apesar do respeito, há restrições. Alguns divorciados não
podem receber a comunhão
nem se confessar. O motivo: a
igreja considera uma segunda
união sem declaração de nulidade uma traição ao primeiro
cônjuge, o que é pecado. Só pode receber a comunhão quem
está livre de pecado. Só pode se
confessar quem se arrependeu.
O rigor se explica, segundo d.
Rafael Cifuentes, presidente da
Comissão Episcopal Pastoral
para a Vida e a Família, da
CNBB (Conferência Nacional
dos Bispos do Brasil): "O casamento é um vínculo indissolúvel de amor feito por Deus entre homem e mulher. A ninguém é dado o direito de romper este vínculo, nem à igreja".
Casal pioneiro
O promotor de Justiça aposentado João Bosco Oliveira,
69, é fundador da primeira pastoral de casais em segunda
união do país (1993) -hoje são
21 mil casais em centenas delas
no Brasil e na América Latina-
e é católico militante, mas, ao se
casar pela segunda vez após se
divorciar, teve de deixar de comungar na missa.
Hoje, não consegue se conter
de emoção ao falar de seu neto,
Jean Luca, 9, que irá comungar
pela primeira vez em maio.
Unido com a advogada Aparecida de Fátima Fonseca Oliveira, 49, há 20 anos, Oliveira se
casou na igreja em 2001, após a
morte da primeira mulher, com
quem viveu 20 anos e teve três
filhos. "Interpreto tudo isso como uma grande responsabilidade que se coloca sob nossos
ombros, no sentido de sermos
um instrumento da igreja para
a preparação de todos os casais
nessas situação", disse.
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