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AMBIENTE
Após três anos de conflito com o Ministério Público e a sociedade, empresa terá de fechar poço em São Lourenço
Nestlé é proibida de explorar água em MG
THIAGO GUIMARÃES
DA AGÊNCIA FOLHA, EM SÃO LOURENÇO (MG)
Após três anos de conflito com o
Ministério Público e entidades da
sociedade civil, a multinacional
Nestlé foi proibida de explorar
um poço de água mineral em São
Lourenço (interior de Minas Gerais), por problemas jurídicos.
O DNPM (Departamento Nacional de Produção Mineral) determinou a paralisação a partir de
24 de abril, e a Secretaria de Meio
Ambiente de Minas deu prazo até
31 de outubro para a empresa.
A Nestlé afirma que vai cumprir
o prazo dado pela secretaria, mas
não terá como fechar o poço até
24 de abril. Alega que a determinação do DNPM foi uma "grande
surpresa" e "carece de fundamento legal". O órgão federal, que autoriza e fiscaliza a exploração mineral no país, diz, por sua vez, que
é "insustentável", do ponto de vista jurídico, esperar até outubro.
A água do poço Primavera, como é chamado, é usada na produção da Nestlé Pure Life, fabricada
pela companhia suíça também
em outros países. O produto é obtido por meio de um processo de
purificação -por isso pode ser
fabricado até com água da rede de
abastecimento-, seguido pela
adição de sais minerais de uso
permitido, como cálcio, magnésio, potássio e sódio.
A Nestlé é dona do Parque das
Águas de São Lourenço desde
1992, quando assumiu o controle
do grupo francês Perrier Vittel.
Com isso, obteve também o direito de exploração das águas minerais existentes. Um muro separa a
fábrica da Nestlé do parque, onde
há várias fontes minerais e cobrança de ingresso para visitação.
Em 1996, a Nestlé perfurou o
poço Primavera, considerado pela empresa "uma das fontes mais
mineralizadas do Brasil".
No ano seguinte, tentou obter
no DNPM autorização para retirar o excesso de ferro da água,
sem sucesso. Na época, a autarquia federal alegou que a legislação brasileira não permite a alteração das águas minerais.
Em setembro de 1999, o DNPM
passou a competência no caso para a Anvisa (Agência Nacional de
Vigilância Sanitária), após publicação de resolução da agência que
define "água purificada adicionada de sais" como "águas preparadas artificialmente a partir de
qualquer captação". A comercialização foi então liberada.
Mobilização
Para ambientalistas e o Ministério Público, a exploração industrial das águas de São Lourenço
está alterando a composição química e a vazão das demais fontes.
Citam o exemplo da fonte magnesiana, que secou, e supostas alterações no sabor das águas.
Em abril de 2001, depois de receber representação com 1.700 assinaturas -a maioria de moradores da cidade-, o Ministério
Público do Estado instaurou inquérito para apurar o caso.
Em dezembro daquele ano, o
inquérito se transformou em ação
do Ministério Público contra a
Nestlé, pedindo o fim da extração
no poço Primavera.
"A partir da abertura do poço
Primavera é que os problemas são
percebidos", afirma o promotor
Pedro Paulo Aina. Ele questiona a
resolução da Anvisa que deu cobertura jurídica à Nestlé. "Aparentemente, uma resolução foi
feita sob encomenda para um caso específico", afirma.
No campo técnico, a disputa se
dá, principalmente, em torno de
dois grupos de relatórios.
O primeiro, citado com freqüência pelo Ministério Público e
ambientalistas, é de 1999. São testes da CPRM (Companhia de Pesquisas de Recursos Minerais, empresa federal) que não concluem
sobre a possível influência do poço Primavera nas demais fontes,
mas atribuem mudanças na qualidade e quantidade das águas à
"superexploração do aqüífero".
A Nestlé, por sua vez, cita estudos do DNPM de 2002 e 2003 que
não comprovaram interferências
entre os dois poços explorados
pela empresa -Oriente e Primavera- e os outros. De acordo
com esses relatórios, a impermeabilização do solo causada pela expansão urbana afeta a zona de recarga das fontes e tem causado
seu comprometimento.
Prazos
Em janeiro deste ano, a Nestlé
acertou com a Secretaria de Meio
Ambiente de Minas Gerais a
transferência da Pure Life para
outro local, até 31 de outubro. O
acordo foi divulgado pela secretaria como "histórico" e resultado
de "pesada reunião de seis horas".
Mesmo com o acordo, o DNPM
determinou a paralisação das atividades no poço até 24 de abril.
"A Nestlé não pode fazer a desmineralização total de uma água
mineral", justifica o diretor-geral
adjunto do DNPM, João César Pinheiro. A respeito da mudança de
posição do órgão, que voltou a
reivindicar competência no caso,
Pinheiro diz: "Se houve interpretações de procuradores passados
[do DNPM], isso é problema da
gestão passada".
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