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GUERRA URBANA /ANÁLISE
Para Michael Berkow, do Departamento de Polícia de Los Angeles, é preciso pacto com população
"Polícia deve ter salário decente para ser cobrada"
Ayrton Vignola/Folha Imagem
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Policiais militares, armados, durante revista a moradores na região central de São Paulo; polícia já matou 93 suspeitos após ações do PCC |
FERNANDO CANZIAN
DA REPORTAGEM LOCAL
Michael Berkow é chefe-adjunto da LAPD, o controvertido Departamento de Polícia de Los Angeles, famoso tanto pelas séries de
TV que protagoniza quanto por
casos de corrupção e brutalidade.
O mais famoso ocorreu em
1991, quando policiais foram filmados espancando violentamente o negro Rodney King. A absolvição dos policiais, um ano depois, provocou três dias de violentas manifestações em Los Angeles
que deixaram 40 mortos e prejuízos de mais de US$ 1 bilhão.
Advogado e pós-graduado em
administração, Berkow vem
acompanhando a "situação de
guerra" em São Paulo desde Los
Angeles, onde lida há anos com líderes de várias gangues. Juntas,
elas têm quase 40 mil membros.
Em entrevista à Folha, ele defende a classe policial. "A polícia
deve ter salários e benefícios decentes para poder ser cobrada". E
relata como o país com o sistema
prisional mais rigoroso do mundo também sofre com a infiltração de celulares nas cadeias. "Isso
também acontece por aqui."
Folha - Como o sr. avalia a crise de
segurança em São Paulo provocada
pelo PCC nos últimos dias?
Michael Berkow - O que detonou a
situação foi a remoção de alguns
presos influentes e perigosos na
tentativa de isolá-los. Aqui, também reconhecemos claramente a
necessidade desse isolamento. Fazemos isso há 20 anos na Califórnia, onde sempre houve a tentativa de líderes de gangues presos de
controlar as ruas.
O exemplo mais conhecido em
Los Angeles é o da MM, a Máfia
Mexicana. No final dos anos 90,
membros da MM chegaram a ordenar de dentro da prisão uma
trégua na guerra de gangues na cidade. Basicamente, disseram às
outras gangues: ou vocês param
ou nós acabamos com vocês aqui
quando forem presos. Pararam.
Prisões e instituições específicas
vêm sendo construídas com o objetivo de isolar completamente esses indivíduos. Temos conseguido isso em prisões de segurança
máxima em Pelican Bay (Califórnia) e no Colorado, onde tudo é
tão controlado que a comunicação é virtualmente impossível.
Mas passei alguns meses do ano
passado trabalhando em conjunto com a Polícia Metropolitana de
Londres. Lá, celulares em mãos de
criminosos são hoje mais importantes e valiosos do que drogas.
Em todos os lugares vemos um
esforço enorme das autoridades
em tentar impedir a entrada de telefones celulares nas cadeias.
Folha - O uso de aparelhos por criminosos também é recorrente nas
prisões norte-americanas?
Berkow - Chega a acontecer, mas
é muito raro em prisões de segurança máxima. Não creio que
aconteça no mesmo nível que em
São Paulo, mas acontece. Sei que
no Reino Unido isso também é
um grande problema.
Há um julgamento em andamento na Califórnia envolvendo a
gangue Irmandade Ariana. É uma
das mais violentas do sistema prisional americano e as pessoas em
julgamento já estão condenadas a
sentenças de prisão perpétua.
Mesmo assim, elas vêm ordenando assassinatos e controlando o
contrabando dentro do sistema
prisional. Eles foram investigados
durante dois anos por autoridades federais e pelo FBI. Agora, devem ser novamente julgados para
ser enviados a prisões no Colorado, onde devem ser totalmente
isolados.
Folha - Depois dos ataques do
PCC, a polícia paulista agiu com
violência, com quase uma centena
de suspeitos mortos e pouca divulgação sobre as circunstâncias dessas mortes. A imagem da polícia,
que já não é boa, não tende a piorar em um episódio como esse?
Berkow - É compreensível. Vocês
têm aí uma enorme população e
uma força policial também muito
grande e mal paga [o salário médio da PM paulista é de R$ 1.200].
É preciso ter mecanismos eficazes para investigar e punir policiais corruptos. Mas lembre-se
que um dos princípios básicos para a polícia funcionar é a necessidade de haver uma barganha, um
acordo entre a força policial e a
população. O trabalho da polícia
deve ser o de manter todos seguros e fazer com que todos sigam as
leis. O da outra parte é apoiá-la.
Portanto, é preciso descobrir a
causa desse acordo ter sido quebrado. Talvez vocês descubram
que ele foi rompido pelos próprios governantes e pela população ao não estarem dando o apoio
material e solidário que a polícia
merece. Só quando esse apoio estiver muito claro é que se pode
exigir da polícia o tipo de comportamento que seria o ideal.
Aqui, dependendo do nível de
escolaridade, os salários anuais
variam entre US$ 55.000 e US$
65.000 (R$ 10.000 a R$ 12.000 ao
mês) e há uma série de benefícios.
Já fizemos a conta. Em média, um
policial em Los Angeles vai receber ao todo US$ 3 milhões (R$ 6,6
milhões) ao longo de sua carreira,
entre salários, benefícios e pensão
na aposentaria.
Folha - Mesmo assim, são famosos alguns casos de corrupção na
polícia de Los Angeles, não?
Berkow - Estamos debaixo de
um microscópio gigantesco. Vivemos na capital mundial da mídia, para onde todas as atenções
estão voltadas. No final dos anos
80 e início dos 90 houve alguns
poucos casos de corrupção, mas
eles fizeram um estrago incrível à
imagem da polícia. Temos 9.300
policiais em Los Angeles. Houve
menos de 50 deles envolvidos e as
condenações criminais não passaram de 10. Tenho 350 detetives
investigando diariamente corrupção policial e má conduta, e posso
garantir que temos hoje uma polícia bastante limpa por aqui.
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