São Paulo, quarta-feira, 18 de outubro de 2006

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Kassab lança empresa para driblar dívida

Projeto enviado à Câmara permitirá ao município criar companhia para captar recursos dando créditos a receber como garantia

Proposta é considerada uma brecha para contornar a LRF, que impede o município de se endividar além de sua capacidade de pagamento

LAURA CAPRIGLIONE
JOSÉ ERNESTO CREDENDIO
DA REPORTAGEM LOCAL

Já está na Câmara Municipal de São Paulo, enviado pelo prefeito Gilberto Kassab (PFL), projeto de lei que autoriza a criação da Companhia São Paulo de Desenvolvimento e Mobilização de Ativos, uma empresa que permitirá ao município obter empréstimos dando como garantia créditos que a prefeitura tem a receber.
O objetivo da empresa, diz Walter Aluisio Rodrigues, assessor econômico da Secretaria Municipal de Finanças, é "captar recursos no mercado para financiar investimentos nas áreas de saúde, educação, segurança e transportes". Mas já existe quem suspeite de que a constituição da Cia. presta-se principalmente a criar uma via legal para contornar a LRF (Lei de Responsabilidade Fiscal), assinada em 4 de maio de 2000 pelo então presidente Fernando Henrique Cardoso.
A LRF impede União, Estados e municípios de se endividar além de sua capacidade de pagamento. Como a Prefeitura de São Paulo já se encontra muito além dessa capacidade (para cada real arrecadado existiam no final do primeiro quadrimestre de 2006 R$ 2,06 em dívidas consolidadas), o município está impedido de lançar títulos no mercado para financiar novos investimentos.
Uma saída possível seria proporcionada com a criação da Companhia São Paulo. Ela lançaria debêntures (título de crédito) e captaria os recursos a serem usados pela prefeitura.
Segundo o advogado Márcio Tadeu Guimarães Nunes, do Veirano Advogados, a companhia de ativos a ser criada ficaria fora dos limites impostos pela LRF por se tratar de uma sociedade estatal independente, que não dependeria de recursos da prefeitura.
Na esfera federal, poderia ser comparada à Petrobras e ao Banco do Brasil, por exemplo, que geram caixa próprio.
Outro advogado, Fernando Albino, especialista na LRF, afirma que a nova empresa daria mais agilidade à captação de investimentos. ""Uma empresa tem condições de operar com mais liberdade."

Inspiração
O assessor da secretaria de Finanças diz que "a inspiração veio da Caixa de Administração da Dívida Pública Estadual S/A, a Cadip, criada em 1995 pelo governo do Rio Grande do Sul". Com um histórico de seis emissões de debêntures e uma operação de financiamento, a Cadip conseguiu R$ 800 milhões com a venda de títulos.
Em São Paulo, embora considere prematura uma estimativa de quanto a empresa conseguirá levantar, o assessor da secretaria diz que, "em uma primeira apreciação, é possível imaginar a captação no mercado de algo entre R$ 300 milhões e R$ 500 milhões" (leia texto nesta página).
Como lastro para a operação, entrariam os direitos originários do parcelamento de créditos tributários, como os decorrentes do Programa de Parcelamento Incentivado -PPI, que, já negociado, permitirá ao município arrecadar R$ 1,8 bilhão em 120 meses.
O presidente da Associação dos Procuradores do Município de São Paulo, Osvaldo Figueiredo Maugeri, diz que a empresa terá de remunerar os investidores a taxas maiores do que as praticadas pelo Tesouro, "exatamente em função da maior confiança gozada pelo Estado no tocante às suas dívidas". Com isso, "haverá um aumento do endividamento público, ainda que por intermédio de interposta pessoa", diz, referindo-se à empresa.
"Dificilmente, seria evitado o ajuizamento de ações civis públicas ou populares por atos lesivos ao erário", diz Maugeri.
A oposição a Kassab já levanta obstáculos: "A prefeitura tenta criar condições para novos investimentos com um instrumento de captação de recursos que gera ainda mais endividamento, contra o espírito da LRF", diz o vereador Paulo Fiorilo (PT), membro da Comissão de Finanças e Orçamento.


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