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Prefeitura incentivou ocupação no Jd. Pantanal
Gestão Kassab construiu CEU e postos médicos e diz que área valorizou até 187%
Moradores da rua Capachós, alagada há nove dias, dizem que as inundações no local cresceram após "melhorias" feitas pelo poder público
EVANDRO SPINELLI
LAURA CAPRIGLIONE
DA REPORTAGEM LOCAL
A rua Capachós, na zona leste, tornou-se símbolo da ocupação desordenada da várzea do
rio Tietê. Desde as enchentes
de terça-feira da semana passada, está intransitável, coberta
por um caldo espesso de esgoto
misturado a águas de chuva e
de rio. Aparece em telejornais.
O prefeito Gilberto Kassab
(DEM) dá entrevistas dizendo
que ali não se pode viver.
O problema é que o próprio
poder público achava coisas
bem diferentes disso até duas
semanas atrás. A rua Capachós
valorizou até 187% na planta
genérica de valores que a prefeitura usará como base para o
cálculo do IPTU de 2010 -a
planta genérica estabelece o valor de mercado de imóveis.
A mesma rua Capachós -o
leitor pode ter um relato de como anda a vida por lá na página
quatro deste caderno- foi asfaltada recentemente. Recebeu
um CEU (Centro Educacional
Unificado) no ano passado,
além de um conjunto habitacional novinho, financiado pela
Caixa Econômica Federal.
Os moradores dizem que as
inundações no local aumentaram desde as "melhorias" feitas
pelo poder público. Havia campos de futebol onde foram
construídos o CEU e o conjunto habitacional -hoje há cimento e impermeabilização.
A atualização da planta genérica de valores, que inclui a valorização da rua Capachós, foi
enviada por Kassab à Câmara
em novembro e aprovada pelos
vereadores no início deste mês.
Em 2001, o metro quadrado
na rua custava, de acordo com a
prefeitura, R$ 33,26. Para o cálculo do IPTU de 2009, o valor
base foi de R$ 49,54. Para 2010,
a prefeitura estabeleceu valores entre R$ 110 e R$ 142.
A valorização de até 187%
não será cobrada de quem mora na rua até porque imóveis
atingidos por enchentes estarão isentos, conforme anunciaram integrantes da prefeitura.
Mas demonstra que políticas
contraditórias estão em disputa bem ali, na beira do rio. Segundo o subprefeito de São Miguel Paulista, Milton Persoli, a
valorização do metro quadrado
se deve ao fato de a região ter
recebido investimentos públicos, como uma estação da
Companhia Paulista de Trens
Metropolitanos, quatro unidades básicas de saúde, três de assistência médica ambulatorial
(AMAs), além do CEU já citado.
No rastro desses investimentos do poder público, um condomínio particular está sendo
construído na mesma rua, ao
lado do conjunto habitacional
da Caixa. Até parece que a lógica é a de povoar a várzea.
Mas, de acordo com o subprefeito, nada menos do que
60% de todas as famílias que vivem na várzea do Tietê estão irregulares. Moram em loteamentos clandestinos, não têm
habite-se. "Serão todos removidos", garante. "7.500 famílias
pelos menos terão de sair."
O CEU, segundo ele, vai ficar.
"Está inundado hoje, mas a desocupação da várzea evitará
que enchentes como essa voltem a ocorrer", afirma.
Até ontem, Persoli, nove dias
passados da primeira enchente
de dezembro, ainda não tinha a
menor ideia de para onde deverão começar a ser levadas as famílias removidas. "Ainda não
fui informado", disse. À Folha,
a Secretaria Municipal da Habitação disse que só hoje poderá falar sobre a disponibilidade
de vagas em conjuntos residenciais voltados à moradia popular. Ou sobre planos para a
construção de novas unidades.
Tudo o que a prefeitura tinha
até ontem para oferecer aos
flagelados era uma bolsa-aluguel, de R$ 300 por mês, a serem pagos durante seis meses,
renováveis por igual período.
No primeiro dia do cadastramento de famílias que topavam
sair de suas casas alagadas em
troca da bolsa, apenas 15 se inscreveram. Faltam 7.485.
"Não existe quem cobre um
aluguel nesse valor, ainda mais
sem uma garantia de que, depois de seis meses, continuará
a receber", disse Ronaldo Delfino, 46, líder comunitário do
Jardim Pantanal. "Ninguém
largará suas casas, ainda que
precárias, sem garantia de que
receberá moradia digna."
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