São Paulo, quarta-feira, 19 de janeiro de 2005

Texto Anterior | Próximo Texto | Índice

CRIMES INVISÍVEIS

Saulo nega irregularidades em boletins de ocorrência; Ministério Público quer analisar dados

Secretário promete retificar estatística de crime com morte

GILMAR PENTEADO
ALEXANDRE HISAYASU
DA REPORTAGEM LOCAL

Apesar de negar a existência de distorções nas estatísticas criminais, o secretário da Segurança Pública de São Paulo, Saulo de Castro Abreu Filho, afirmou ontem que vai modificar as regras para a organização dos dados de crimes com morte.
Anteontem, a Folha publicou 14 boletins de ocorrência registrados como morte a esclarecer e encontro de cadáver que apresentavam indícios claros de homicídio doloso (com intenção), segundo análise de especialistas e da Ouvidoria da Polícia. Com isso, esses casos ficam de fora das estatísticas oficiais de homicídios. No mesmo dia, o procurador-geral de Justiça de São Paulo, Rodrigo Cesar Rebello Pinho, determinou que dois grupos do Ministério Público investiguem o caso.
O secretário disse que a mudança na metodologia, que hoje usa o boletim de ocorrência como base para estatísticas finais, vai vigorar a partir de agora. Segundo ele, a intenção é comparar a natureza registrada inicialmente no boletim com o resultado do inquérito policial (quando a investigação da polícia já foi encerrada).
Se houver uma mudança -uma morte a esclarecer cujo inquérito apurou que era homicídio doloso, por exemplo-, uma retificação será incluída nas estatísticas criminais.
"Teremos um levantamento trimestral, depois semestral e, por fim, um anuário, que vamos publicar em anexo. Lá constará que tantos casos de morte a esclarecer se transformaram em latrocínio, em lesão corporal seguida de morte, em suicídio e em homicídio", afirmou o secretário.
Abreu negou que homicídios dolosos estejam sendo registrados como morte a esclarecer ou encontro de cadáver. "Os casos de morte a esclarecer estão estáveis desde 2002, com média de 4.200 por ano", afirmou. Nos primeiros nove meses de 2004, o Estado registrou 6.855 homicídios intencionais, o menor índice do período em pelo menos dez anos.
Mesmo não admitindo que os casos apontados pela Folha apresentem erros, Abreu Filho disse que a mudança vai tornar as estatísticas mais reais. "É um erro para nós mesmos a polícia não retificar as estatísticas. Porque eu fico com duas situações de crime, uma morte a esclarecer e um homicídio esclarecido (que partiu do boletim de morte a esclarecer), onde o acusado está até cumprindo pena. Fico com o homicídio e com a morte, o que é um erro", disse.
Em seguida, o secretário minimizou a conseqüência desse erro. "Quanto é esse erro? De 3% a 4%. Estatisticamente é um número desprezível para o trabalho da polícia. Não é desprezível quando se pega um caso concreto."
Em 2001, quando denúncias também apontaram para problemas no preenchimento de boletins de ocorrência, a Secretaria da Segurança Pública de São Paulo -então sob a chefia de Marco Vinicio Petrelluzzi- negou irregularidades e prometeu uma medida burocrática para aumentar a credibilidade de suas estatísticas.
Uma resolução publicada pela secretaria criou um conselho de acompanhamento das estatísticas criminais, formado por entidades de pesquisa. Só que, segundo as próprias entidades, o conselho não saiu do papel porque o governo não colocou a idéia em prática nos meses seguintes. Segundo o governo, foi o próprio conselho que se desarticulou.
Ontem, o Gecep (Grupo de Atuação Especial e Controle Externo da Atividade Policial) -que investiga o caso, assim como a Promotoria da Cidadania - decidiu que vai pedir à secretaria os boletins de morte a esclarecer e encontro de cadáver registrados em 2004. O objetivo é apurar se há outros casos que apresentem erros nos registros que resultam em distorções nas estatísticas de homicídio. "Somente a análise de todos os casos dirá se os BOs foram lavrados erroneamente. A partir desses dados, vamos investigar se as falhas foram ocasionais ou se houve intenção de maquiar as estatísticas de homicídio", disse o promotor Fábio Bueno.


Texto Anterior: Mortes
Próximo Texto: Administração: Serra congela 31,5% do Orçamento e põe limite para despesas
Índice



Copyright Empresa Folha da Manhã S/A. Todos os direitos reservados. É proibida a reprodução do conteúdo desta página em qualquer meio de comunicação, eletrônico ou impresso, sem autorização escrita da Folhapress.