São Paulo, quarta-feira, 19 de janeiro de 2011

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Família vê tragédia se repetir nove anos depois

Moradores da região serrana do Rio revivem cenário de tragédia de 2001

Na ocasião, eles perderam suas casas após deslizamentos; sem ter para onde ir, voltaram para o local

SÉRGIO RANGEL
ENVIADO ESPECIAL A TERESÓPOLIS

Em menos de dez anos, o aposentado cearense Francisco Romão, 74, perdeu duas casas que construiu na região serrana do Rio, ambas destruídas por inundações.
O barraco dele de dois cômodos no Caleme, um dos locais mais castigados de Teresópolis, não caiu, mas foi condenado pela Defesa Civil.
Na véspera do Réveillon de 2002, ele havia perdido uma casa no morro do Perpétuo. Naquela data, dois grandes deslizamentos de terra no morro mataram 12 pessoas.
Sem ter para onde ir, Romão voltou para o lugar onde perdeu sua primeira casa: desde sábado, ele se abriga na casa de um conterrâneo.
No mesmo dia em que Romão teve sua primeira casa destruída, a diarista Irene Cristina Silva e Souza, então com 10 anos, viu o barraco onde vivia ser arrastado por uma avalanche formada por pedras e por lama.
Perdeu a casa, as roupas, a pasta que levava para a escola e as três únicas bonecas.
Nove anos depois, grávida de oito meses e mãe de um menino de pouco mais de um ano, ela e Romão voltam a se encontrar no morro do Perpétuo. Depois que perdeu tudo, Irene, a mãe e uma irmã mais nova tentaram reconstruir a vida em outras áreas.
Mas não conseguiram e tiveram que voltar para lá.
Desde a enxurrada da semana passada, ela percorre as vielas do morro em busca de algum funcionário da prefeitura que possa vistoriar seu barraco. Quer mostrar o barranco que desmoronou e parou a poucos centímetros de seu banheiro para perguntar se é seguro entrar e pegar as roupas dos filhos.
Assim como Romão, ela está morando de favor na casa de uma amiga, com a irmã de 15 anos e o filho -como não buscaram ajuda dos poderes públicos, os quatro não entram na estatística oficial de desabrigados.
"Acho que não existo para os poderosos. Se vier uma chuva forte, vou perder tudo novamente e vão me deixar na rua mais uma vez", desabafa a diarista.

ANTIGAS VÍTIMAS
A história de Irene e de Romão é parecida com a de dezenas de moradores do alto do Morro do Perpétuo.
Quase todos que agora correm sério risco foram vítimas da antiga tragédia.
A diarista e cabeleireira Claudinei da Silva Andrade, 36, mostra o bebê de seis dias de idade e diz que a criança nasceu prematura -ela estava com oito meses de gravidez- por causa de seu nervosismo com o temporal.
Na última quarta-feira à tarde, assustada com as chuvas, ela entrou em trabalho de parto. Conseguiu chegar em tempo a um hospital. Três dias depois estava de volta ao morro do Perpétuo.
"Fico sempre abalada quando chove. Moro aqui há dez anos e já passei muitos apertos. Um prefeito me prometeu casa, mas nada aconteceu", lamenta.
Em 2002, relembra, passou "horas de horror" tentando resgatar a filha mais velha dos escombros. "Sinto uma imensa agonia no peito", diz, mostrando uma casa que desabou a menos de 20 metros de onde mora.
Sem receber ajuda do governo, voltou para o morro. Alugou um barraco -paga R$ 160 por mês- e vive sozinha com os três filhos.
As noites tem sido passadas em claro.
"Como vou dormir nessa situação? À noite fico andando pela rua com as crianças."
No final do ano, a Prefeitura de Teresópolis fez nova promessa para os moradores. No seu site, o município disse ter conseguido cerca de R$ 14 milhões da União para investir em obras em sete comunidades, entre elas o Perpétuo.


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