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GUERRA URBANA
Responsáveis pelo combate à organização admitem que pertencer ao grupo virou um "bom negócio"
Polícia diz que SP errou com PCC e ajudou facção a crescer
FÁBIO ZANINI
LEONARDO SOUZA
DA SUCURSAL DE BRASÍLIA
Os dois delegados designados
pelo governo de São Paulo para
combater o PCC (Primeiro Comando da Capital) admitiram,
em depoimento à CPI do Tráfico
de Armas, que o Estado cometeu
erros ao lidar com a facção, contribuindo para que ela se espalhasse por todo o país. E reconheceram o seu poder: "A organização é muito séria mesmo, e a tendência é crescer", disse o delegado
Godofredo Bittencourt.
As declarações de Bittencourt e
do delegado Ruy Ferraz Fontes,
ambos do Deic (Departamento de
Investigações sobre o Crime Organizado), foram feitas em sessão
secreta da CPI no último dia 10.
O PCC acabou tendo acesso a
essas informações após dois advogados terem corrompido o responsável pela gravação, pagando
R$ 200 por cópias do áudio. A polícia suspeita que o vazamento da
gravação contribuiu para que fosse deflagrada a maior onda de violência da história do Estado.
Na sessão, os dois detalham o
funcionamento da facção: o PCC
envia armas pelos Correios, financia estudantes de Direito, arregimenta candidatos às eleições
e faz empréstimos cobrando juros. Para Bittencourt, tal estrutura
transformou o PCC numa "febre". "Ser do PCC é um bom negócio", afirmou o delegado.
"O governo do Estado [de São
Paulo] cometeu um erro. Pegou a
liderança do PCC e redistribuiu
pelo Brasil, entre Brasília, Rio
Grande do Sul, Rio, Mato Grosso
do Sul e Bahia", diz Bittencourt.
Fontes reforça, dizendo que foi
"plantada a sementinha" do PCC
em Mato Grosso do Sul em 2000,
quando um líder foi transferido
para lá. Na onda de ataques feita
pelo PCC nos últimos dias, presos
se rebelaram em Mato Grosso.
Ambos criticaram a Secretaria
da Administração Penitenciária
do Estado, por permitir a entrada
de celulares e atenderem reivindicações de presos. "Estamos cansados de ver a imprensa mostrar
bandidos fotografando -inclusive o sr. Marcola- com um celular", disse Bittencourt, em referência a Marcos Willians Herbas
Camacho, líder máximo do PCC.
Bittencourt diz que a secretaria
trocou a cor de uniformes, de laranja para cinza, por pressão dos
presos. "Vamos trocar os uniformes? Vamos trocar os uniformes.
[...] O PCC pleiteou e teve."
Procurado, o secretário da Administração Penitenciária, Nagashi Furukawa, disse que não comentaria as declarações.
Ontem, parte desse depoimento
foi publicado pelo site "Congresso
em Foco". A CPI confirmou o teor
do que foi publicado, mas o restante permanece sob sigilo. A CPI
vai pedir à PF que investigue o vazamento para o site.
Na parte dos depoimentos que
veio à tona, não há referência ao
plano de transferir líderes da facção, o que teria detonado a onda
de violência. Segundo parlamentares ouvidos pela Folha, o assunto foi mencionado no final.
O PCC, segundo os delegados,
tem uma receita de cerca de R$
750 mil por mês. "Associados"
que estão soltos pagam uma mensalidade de R$ 550, e os presos, de
R$ 50. Também arrecadam com
traficantes. "É uma organização
extremamente estruturada, que
faz a sua arrecadação com cinco
ou seis tesoureiros", diz Fontes.
Há um esquema de empréstimos, segundo ele relata. Se um
criminoso precisa de R$ 20 mil
para organizar um roubo, o PCC
empresta. O adiantamento é pago
depois, com juros.
Também em relação à contabilidade da facção, os delegados citam o papel de Cíntia, mulher de
Marcola. Segundo eles, ela -que
chegou a ser presa, mas está em liberdade- repassava ordens de
Marcola. A polícia rastreou R$ 90
mil transferidos à conta bancária
dela em seis meses.
Ele relata que a Polícia Civil trava "uma luta muito grande" com
as operadoras para tentar barrar o
acesso dos presos a celulares. E
acusou: "Temos envolvimento de
pessoas dentro da operadora."
Para distribuir armas, o PCC
utilizaria os Correios. No presídio
de Iaras (SP), teria sido entregue
por Sedex um carregamento de
armas. No de Avaré, 60 TVs.
A organização, que teria hoje 18
advogados, estaria se preparando
para o futuro, financiando estudantes de Direito. Estaria também
infiltrada na administração pública, manipulando concursos.
"Ele [Marcola] com certeza geriu a questão dos concursos públicos. Eles formam, pagam pela
formatura de pessoas nas escolas
de Direito", afirma Fontes.
Na política, a organização busca
um braço. "Estão investindo em
pessoas que têm interesse numa
carreira política", diz Fontes.
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