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Influência religiosa deturpa Estado de Direito, diz jurista
Segundo Dalmo Dallari, o uso de cartas psicografadas nos tribunais é "claramente ilegal'
Teórico do direito, professor
Marcelo Neves afirma que
posições religiosas diversas
não podem ser usadas para
influenciar decisão judicial
VINÍCIUS QUEIROZ GALVÃO
DA REPORTAGEM LOCAL
Juristas e teóricos do direito
consultados pela Folha dizem
ver uma "deturpação" do Estado democrático de Direito na
medida em que decisões judiciais são fundamentadas ou
contaminadas por valores ou
critérios religiosos.
Para Dalmo de Abreu Dallari,
professor aposentado da Faculdade de Direito da USP, e
autor dos livros "O Poder dos
Juízes" e "O Futuro do Estado", "o uso de psicografia é claramente ilegal".
"Não há o reconhecimento
disso no sistema jurídico brasileiro. Se isso for a prova, o julgamento é nulo. Não pode", diz.
Um dos maiores teóricos do
direito brasileiro, Marcelo Neves, professor de teoria do Estado da USP e de teoria do direito do doutorado da PUC, diz
haver uma "descaracterização
dos princípios do Estado constitucional moderno" na aplicação de valores espíritas no dia-a-dia do Poder Judiciário.
Estado laico
"Não se podem definir posições sobre casos jurídicos a
partir de uma percepção religiosa do mundo. A partir do
momento em que esses magistrados não conseguem se desvincular é um problema gravíssimo para o Estado de Direito, que parte do princípio de ser
um Estado laico e que posições
religiosas diversas não podem
ser determinantes no processo
de decisão jurisdicional", afirma Marcelo Neves.
Para Dallari, a associação de
juízes espíritas é "exercício de
cidadania". "Os juízes têm plena liberdade religiosa como todos os demais cidadãos, como
têm o direito de associação."
Mas, segundo o jurista, "se isso interferir no desempenho da
função jurisdicional, aí, sim, se
torna ilegal e ofende a laicidade". "Nunca tive notícia de juízes espíritas."
Segundo Neves, o uso de psicografia nos tribunais "é um
perigo" e só tem significado nos
campos religioso e pessoal.
"Isso não pode passar para o
plano jurídico porque realmente é uma interferência destrutiva da consistência do Estado
democrático de Direito."
"Não existe amparo legal na
utilização do sobrenatural",
completa Dallari.
Vontade funcional
Para Walter Nunes da Silva
Júnior, presidente da Ajufe
(Associação dos Juízes Federais do Brasil), os juízes, como
Estado, "manifestam não uma
vontade pessoal, mas uma vontade funcional".
"Escorar uma decisão com
base numa prova psicografada
não tem ressonância no mundo
jurídico. É indevida uma decisão que se embasa na psicografia, que cientificamente não é
comprovada", diz .
"A constituição do Estado
democrático de Direito fica totalmente prejudicada, principalmente pela pluralidade religiosa. Num mundo de pluralidade religiosa cada vez maior
hoje é que tem que haver maior
distância do Estado constitucional em relação aos particularismos religiosos", diz Neves.
Livros como "A Filosofia Penal dos Espíritas", "Pena de
Morte e Crimes Hediondos à
Luz do Espiritismo" e "A Psicografia ante os Tribunais" já foram lançados no mercado jurídico-espírita.
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