São Paulo, terça-feira, 19 de junho de 2001

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CRISE DE ENERGIA

Alternativa sugerida pelo governo, as fluorescentes contêm mercúrio, metal que também causa danos à saúde

Lâmpadas do apagão têm risco ambiental

Moacyr Lopes Jr.:/Folha Imagem
Funcionário de fábrica faz teste de durabilidade em lâmpadas fluorescentes, que liberam vapor de mercúrio quando são quebradas


KARINE RODRIGUES
FREE-LANCE PARA A FOLHA

LEONARDO WERNER SILVA
DA REDAÇÃO

A recomendação do governo para substituir lâmpadas tradicionais (incandescentes) pelas fluorescentes, que consomem menos energia, está sendo seguida pelo consumidor. Mas falta informá-lo de que o manuseio e o descarte indevidos do produto podem causar danos à saúde e ao ambiente.
O alerta é feito por engenheiros preocupados com o "dia seguinte" da corrida às chamadas lâmpadas frias. Elas contêm mercúrio, metal pesado que, se absorvido pelo homem, pode causar problemas respiratórios, neurológicos, gastrointestinais e até matar.
"Quando essas lâmpadas estão funcionando, o mercúrio está dentro delas e não oferece risco, mas, se elas se romperem, no descarte ou na manipulação, liberam cerca de 20 a 30 miligramas sob a forma de vapor de mercúrio, que pode ser absorvido pelo organismo", explica o engenheiro ambiental Ricardo Lisboa da Cunha, 61, especialista em manipulação e transporte de produtos perigosos.
Por causa dos danos que as lâmpadas fluorescentes de mercúrio oferecem, diz Cunha, as embalagens deveriam ter recomendações e simbologia de resíduo perigoso. Ele destaca também a necessidade de se fazer um descarte seletivo do material, como acontece em outros países, como a Alemanha, por exemplo.
Naquele país, assim como nos Estados Unidos, as lâmpadas frias não podem ser jogadas no lixo comum. Empresas de limpeza pública coletam o material e o encaminham para a reciclagem, onde são obtidos subprodutos como fósforo, alumínio e o próprio mercúrio, que pode voltar para os fabricantes de lâmpadas.
"O governo parece desconhecer a periculosidade porque, por um lado, recomenda e, pelo outro, não exige a manipulação seletiva e o descarte adequado", disse Cunha. Ele ressalta que não é contrário ao uso das lâmpadas. "A questão não é não usar ou usar."
O engenheiro eletricista Joel Franco Sacilotti, 70, também chama a atenção para o risco. "É preciso que se faça um alerta. Não sou contra a lâmpada, mas o vapor de mercúrio pode contaminar a pessoa. E, depois de usadas, onde elas vão parar? Nos aterros sanitários. Vão poluir os rios."
Sobre o descarte do material, Cunha sugere que seja criada uma comissão no Ministério da Saúde para discutir o problema.
Roberto Pereira Araújo, diretor do Ilumina (Instituto do Desenvolvimento Estratégico do Setor Elétrico), defende uma prática semelhante à que foi adotada com as baterias de celular. "As lâmpadas têm que ser devolvidas para as lojas. Mas o governo não tem política de coleta seletiva desse produto", afirmou Araújo.
Ele chama a atenção para outro assunto. "Há uma diferença muito grande entre as marcas [de lâmpadas fluorescentes" oferecidas pelo mercado. Há marcas, como as chinesas, que queimam e quebram com facilidade."

Reciclagem
A reciclagem das lâmpadas, apontada como uma solução para o problema, esbarra no pequeno número de empresas que fazem esse tipo de serviço no país. São somente quatro -uma em São Paulo, duas em Santa Catarina e uma no Paraná.
Há seis anos, a USP (Universidade de São Paulo) em Ribeirão Preto envia suas lâmpadas fluorescentes queimadas para reciclagem na empresa Apliquim, em Paulínia (126 km de São Paulo).
Segundo a vice-coordenadora do projeto USP Recicla, engenheira Sandra Márcia de Castes, já foram enviadas à empresa aproximadamente 14 mil lâmpadas.
No entanto, Sandra considera o serviço caro (em média R$ 0,70 por lâmpada), o que dificultaria a "popularização" da reciclagem do material. "A USP paga caro para descontaminar um produto", diz.
O diretor da Apliquim, Cyro do Valle, diz que, em breve, o valor da reciclagem poderá chegar a R$ 0,50 por lâmpada. "Infelizmente, ainda não tenho condições de prestar o serviço gratuitamente. Existe um custo para se fazer a destruição das lâmpadas sem deixar que o mercúrio volte para o ambiente", afirma.
Wilson Santos Pereira, do Fórum Recicla São Paulo, diz que a dificuldade de encontrar empresas que façam a reciclagem das lâmpadas frias dificulta a criação de uma coleta específica para esse tipo de material.
"Não adianta você coletar se não houver quem faça [a reciclagem"", afirma ele. Estima-se que os aterros sejam o destino de 95% das cerca de 40 milhões de lâmpadas fluorescentes consumidas anualmente no país.

Controle
O Conama (Conselho Nacional do Meio Ambiente), ligado ao Ministério do Meio Ambiente, está estudando formas de controlar o descarte e a procedência das lâmpadas fluorescentes no país.
Segundo a assessoria do ministro José Sarney Filho, o Conama criou um grupo para analisar o tema um pouco antes de estourar a crise de energia. A Folha apurou que o ministro era contrário à redução de impostos dessas lâmpadas devido ao problema ambiental, mas acabou vencido pela crise.
Além de reduzir os impostos, o "ministério do apagão" já estuda como incentivar a fabricação no país, pois todas as fluorescentes compactas são importadas.
Uma das preocupações do Conama é com o controle de qualidade de alguns tipos de lâmpadas importadas.

Colaborou a SUCURSAL DE BRASÍLIA



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