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MOACYR SCLIAR
O Banco do Amor
Dinheiro compra mais felicidade,
não mais sexo, tenta provar estudo.
Dois economistas, David G. Blanchflower, da Faculdade de Dartmouth
(USA), e Andrew J. Oswald (Reino
Unido) compararam os níveis de felicidade produzidos por uma vida sexual vigorosa com outras atividades
cujos valores tinham sido calculados
em pesquisa anterior. Estimaram
que aumentar a freqüência sexual de
uma vez por mês para ao menos uma
vez por semana produz tanta felicidade quanto pôr US$ 50 mil no banco. Mundo, 12.jul.2004
Os dois estavam casados
há muito tempo. Os dois, pobres, trabalhavam muito, ele como operário numa fábrica de tubulações, ela como faxineira. E ou
por estarem casados há tempo, ou
por trabalharem muito e estarem
sempre exaustos, o certo é que
praticavam pouco sexo. Restringiam-se a um dia por mês -o dia
16, em que se tinham conhecido
anos antes.
Foi então que ela leu a notícia
sobre a pesquisa dos economistas.
Mostrou-a ao marido e os dois
concordaram: talvez valesse a pena esforçar-se um pouco e aumentar a freqüência das relações
sexuais. Tinham um estímulo para isso: os US$ 50 mil, ainda que
imaginários. E de fato, já no primeiro mês, a coisa funcionou: faziam amor semanalmente. E,
sempre naquele clima alegre,
brincalhão, resolveram depositar
o dinheiro num banco imaginário, o Banco do Amor.
Nos três meses seguintes a coisa
foi ainda melhor; cada vez se sentiam mais felizes. O depósito deles
no Banco do Amor agora atingia
a apreciável quantia de US$ 200
mil dólares.
- O que vamos fazer com tanta
grana? -indagou ela.
O tom era de gozação, mas, por
algum motivo, o marido levou a
pergunta a sério. Eu poderia abrir
minha própria indústria, disse
ele, e assim deixaria de ser empregado:
- Ninguém mais mandaria em
mim, ninguém.
Uma reivindicação aparentemente justa com a qual ela, no entanto, não concordou. Mostrou
uma manchete de jornal, segundo
a qual aplicações em produção,
no Brasil, rendem quatro vez menos que aplicações financeiras.
Achava, portanto, que deveria
pôr aquela grana num fundo, ou,
quem sabe em ações. Discutiram
asperamente, tão asperamente
que acabaram indo para a cama
brigados. Era o dia 16, mas eles
não fizeram sexo. Nem nos dias
seguintes, nem nas semanas seguintes. Na verdade, mal se falam
e estão pensando em se separar.
O depósito imaginário terminou há muito tempo. Por assim
dizer, estão no vermelho, com saldo negativo no Banco do Amor.
Sabem que pagarão juros pesados
por isso, mas se conformam: mesmo o Banco do Amor tem de se
submeter às regras do mercado.
Moacyr Scliar escreve nesta coluna, às
segundas-feiras, um texto de ficção baseado em matérias publicadas no jornal.
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