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Corte da OEA condena Brasil por morte
Maus-tratos que vitimaram paciente com problemas mentais em 1999 resultaram na 1ª sentença do tribunal contra o país
Para entidade, Estado brasileiro é co-responsável pela morte de Damião Ximenes Lopes em clínica psiquiátrica no Ceará
EDUARDO DE OLIVEIRA
DA AGÊNCIA FOLHA
Pela primeira vez, o Brasil foi
condenado na Corte Interamericana de Direitos Humanos da
OEA (Organização dos Estados
Americanos) por violações dos
direitos humanos. A decisão foi
anunciada anteontem à noite
em San José, na Costa Rica.
Por sete votos a zero, os juízes concluíram que o Estado
brasileiro foi co-responsável
pela morte por maus-tratos do
portador de transtorno mental
Damião Ximenes Lopes, então
com 30 anos, ocorrida em outubro de 1999 numa clínica psiquiátrica de Sobral (CE). E
também por falhas e lentidão
na investigação judicial.
Foi estabelecida indenização
de US$ 146 mil (R$ 312 mil),
que deve ser paga à família dele
em um ano. O governo também
deve mandar publicar, em seis
meses, trechos da decisão no
"Diário Oficial" da União e num
jornal de grande circulação.
O Brasil ainda foi instado a
acelerar o trâmite das ações na
Justiça referentes ao caso e os
processos de melhoria das condições gerais da rede de atendimento psiquiátrico no país.
A corte condenou o Estado
com base na Convenção Americana sobre os Direitos Humanos, nos artigos que tratam da
garantia à integridade física, à
vida e de garantias e proteção
judicial dos seus cidadãos.
O caso de Lopes foi o primeiro brasileiro a chegar à corte,
segundo a ONG Justiça Global.
Há outros em tramitação no
tribunal, além de denúncias e
condenações contra o país na
Comissão Interamericana de
Direitos Humanos, instância
da OEA que analisa denúncias,
propõe medidas e medeia acordos antes de enviá-las à corte.
Irene Ximenes Lopes Miranda, 40, irmã de Lopes, procurou
a comissão em novembro de
1999, diante do que considerava falta de interesse das autoridades. Em 2003, a Justiça Global passou a prestar assistência
jurídica à família, e o caso foi
enviado à corte em outubro de
2004, após a comissão considerar que o Estado não adotara
medidas para solucioná-lo.
Na esfera criminal, desde
2000 corre um processo na 3ª
Vara Criminal de Sobral contra
funcionários da clínica, sem
condenações. Há um processo
cível por reparação de dano, em
que a família pede indenização
de R$ 150 mil. E corre em sigilo
no Conselho Regional de Medicina do Ceará um processo administrativo contra o diretor
clínico à época da morte.
"É um caso muito simbólico
e inédito para a corte, porque
envolve uma condenação relacionada a uma pessoa com
transtornos mentais", afirmou
Sandra Carvalho, diretora-executiva da Justiça Global.
"A tristeza não passou. Nós
estamos felizes com essa vitória, mas, em meio a toda felicidade, a nossa alma tem tristeza
ainda, porque o Damião não está presente, é uma ausência
eterna, uma perda irreparável",
disse Irene ontem à Folha.
"Ainda não conseguimos nos
encontrar [os seis irmãos], para
nos abraçarmos e comemorar."
Ela disse que resolveu recorrer à OEA porque não queria
que o caso do seu irmão fosse
"mais um".
Irene pretende usar parte da
indenização para fundar em
Fortaleza o Instituto Damião
Ximenes, para prestar assistência em casos parecidos.
Lopes foi internado na Casa
de Repouso Guararapes, instituição privada, em 4 de outubro de 1999, uma sexta-feira.
Espancado, Lopes morreu na
segunda. Em 2000, o governo
federal decretou intervenção
na clínica, que foi fechada.
Colaborou RUBENS VALENTE, da Reportagem Local
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