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FÉ VERDE
Tentativa é evitar que alimentos e bebidas usados em cerimônias intoxiquem animais e poluam rios e cachoeiras
Tijuca terá área para rituais religiosos
SÉRGIO RANGEL
DA SUCURSAL DO RIO
O Rio iniciou a construção do
primeiro espaço eco-religioso do
país para combater a poluição
causada por oferendas e cultos.
Localizado dentro da floresta da
Tijuca, o espaço tem duas quedas
d'água, um rio e dezenas de árvores centenárias. Ganhará vigias 24
horas, será todo cercado e contará
com banheiros e uma lojinha.
As oferendas também terão um
tratamento especial. Quase tudo
será reciclado. A maior parte das
comidas será enterrada e virará
adubo. Já os vasos deverão ser trabalhados artisticamente pelas comunidades carentes próximas da
floresta e negociadas na loja. As
velas serão reaproveitadas.
Os cultos e as oferendas religiosas são algumas das principais
preocupações dos administradores do maior parque urbano do
mundo, o Parque Nacional da Tijuca. Além das comidas deixadas
pelos religiosos intoxicar diariamente os animais da floresta, as
velas acesas já causaram incêndios e quedas de árvores dentro
do parque. Os rios e as cachoeiras
também sofrem com a poluição
causada pelas celebrações.
A criação do espaço foi a solução encontrada pelo Ibama (Instituto Brasileiro do Meio Ambiente
e dos Recursos Naturais Renováveis) e pela Prefeitura do Rio para
tentar pôr fim as mais diversas
práticas religiosas dentro do Parque Nacional da Tijuca, área de
reserva ambiental. O Espaço Sagrado fica em terreno vizinho.
"Sofremos muito com a falta de
consciência dos religiosos. Por isso, criamos essa área, que servirá
como projeto-piloto e poderá ser
levada para outras localidades.
Além disso, vamos gerar renda
para os nossos vizinhos", disse
Ana Cristina Vieira, chefe substituta do Parque Nacional da Tijuca. Várias religiões e seitas são
parceiras do projeto, que deverá
ser inaugurado oficialmente em
fevereiro do próximo ano.
Segundo Ana Cristina, mais de
20 grupos religiosos e integrantes
de seitas realizam cerimônias no
parque. ""As religiões afro-brasileiras são as que mais freqüentam
a floresta. Fora eles, o parque abriga celebrações de bruxas, Santo
Daime, ciganos e várias outras."
A região escolhida para o início
do projeto foi o trecho de floresta
localizado próximo à curva do
""S" no Alto da Boa Vista, zona
norte da cidade, em área que pertence à Prefeitura do Rio.
O Espaço Sagrado, como é chamado oficialmente, é usado por
religiosos há mais de 50 anos, mas
está sendo preparado para receber oficialmente os cultos de maneira ecologicamente correta. Lixeiras, rampas para deficientes e
uma ponte de acesso ao outro lado do rio serão instaladas na área.
Sujeira
Até agora, mais de oito toneladas de lixo já foram retiradas de
lá. No início do ano, o cenário do
Espaço Sagrado era de muita sujeira. O rio e as quedas d'água estavam completamente imundos,
com restos de animais, garrafas
quebradas e pedaços de roupas.
Dezenas de árvores centenárias
já foram destruídas por velas. Elas
estão sendo recuperadas, e os participantes do projeto constroem
altares para protegê-las do fogo.
Desde o mês passado, um voluntário trabalha diariamente no espaço. Ele o limpa e realiza uma
pesquisa com os religiosos, que
irá mapear os grupos.
""Dou um caminho final para o
despacho, o que poderia ser feito
pelas próprias pessoas que os realizam. Deixam tudo aqui e prejudicam os animais e os rios. As pessoas têm de se conscientizar. O
dendê, o caruru e as bebidas alcoólicas não fazem parte da dieta
de um animal. Já tivemos inúmeros casos de animais mortos por
causa dessa alimentação", disse o
baiano Aderbal Moreira Costa,
pouco antes de um mico descer
da árvore para pegar um doce de
um dos despachos. Costa é sacerdote de um casa tradicional de
candomblé.
No Rio de Janeiro, já existem lugares para realizar cerimônias religiosas com privacidade, mas nenhum é público e tem essa preocupação com a ecologia.
""A intenção é garantir a liberdade religiosa deles, sem que a natureza sofra. A partir daí, poderemos também multar as pessoas
que fazem culto dentro do parque. A legislação já nos permite,
mas somos tolerantes com eles.
Com o Espaço Sagrado em funcionamento, vamos mudar a nossa postura", afirmou Ana Cristina, a chefe do parque.
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