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GILBERTO DIMENSTEIN
Já ganhou
Pesquisa Datafolha divulgada hoje reafirma o favoritismo de José Serra, mas ainda falta
muito tempo até o fim do segundo turno e Marta Suplicy dispõe
de condições de tentar virar o jogo. Já existe, porém, um vitorioso,
independentemente do resultado
final: o eleitor paulistano.
A eleição revela tendências que
vieram para ficar: a sociedade está mais exigente, articulada e
bem informada, os truques de
marketing vêm sendo amenizados pelos argumentos racionais,
os candidatos foram obrigados a
se preparar melhor para não se
emparelharem com os "nanicos",
donos de legendas de aluguel.
Isso é apenas conseqüência da
maior vivência democrática, do
aumento da escolaridade da população e da evolução da mídia
na cobertura de temas locais.
Na semana passada, concluíram-se as sabatinas feitas pelos
jornais, entre os quais a Folha,
com os candidatos à Prefeitura
de São Paulo. Pelo menos de um
quesito não podemos reclamar:
eles se dispuseram, sem restrições, ao bombardeio de perguntas.
A leitura das sabatinas mostra,
com clareza, a inconsistência de
algumas propostas, a desconexão
entre o que se propõe e o que os
números indicam como viável.
Serra promete bilhete único estendido ao metrô sem saber o
custo; Marta diz nem mesmo saber quanto já está pagando pelo
bilhete único.
Mas não há registro de uma
eleição paulistana em que o debate sobre os problemas da cidade e suas possíveis soluções se tenha alastrado tanto, transformado em conversa empolgada do
mais simples botequim da zona
leste aos bares dos Jardins. Fala-se do acerto e de erros de projetos
educacionais, de saúde ou de
transporte. Só não se vai mais
longe e com mais profundidade
porque grande parte do eleitorado, vítima de deficiência escolar,
tem dificuldade em entender o
que está sendo transmitido -é a
conseqüência do chamado analfabetismo funcional.
Evidentemente, não deixaram
de existir as propostas demagógicas, irreais, nem mesmo as mentiras e as baixarias dos ataques
ou manipulações. Mas já não está tão fácil apostar tanto -pelo
menos na cidade de São Paulo-
na ignorância do eleitorado. Afinal, 46% da população empregada tem diploma de ensino médio
ou superior.
A escolaridade dos habitantes
de São Paulo não pára de crescer
pelo simples fato de que o mercado de trabalho começa a recusar,
até para empregos simples, trabalhadores apenas com o ensino
fundamental completo.
Com o aumento da escolaridade, os eleitores começam a cobrar
dos candidatos a prefeito coisas
que está ao alcance deles fazer.
Basta ver que, nessa disputa, fala-se mais de saúde e educação,
responsabilidades de prefeitos,
do que de emprego ou segurança,
temas em que o governador e o
presidente têm mais chance de
ação.
Os exageros de marketing se
voltam contra os próprios candidatos. Na eleição presidencial
passada, José Serra pagou o preço
de, apesar de ser um candidato
oficial, ter tentado se afastar do
governo e assumido tons oposicionistas. Não colou. Acuada na
área da saúde, Marta Suplicy
apresentou a maquete de um
projeto. O CEU Saúde soou, para
boa parte da população, como pirotecnia eleitoral. Coincidência
ou não, depois disso ela perdeu
pontos, como demonstra o Datafolha, entre os chamados formadores de opinião, as pessoas com
maior escolaridade.
A desconfiança dos artifícios do
marketing está fundada no
aprendizado. Vimos Collor e seus
marajás, bem como um prefeito
(Celso Pitta) que se elegeu com a
promessa de implantar um sistema de transporte (Fura-Fila)
que, até agora, não passa de um
esqueleto. Lula, por sua vez, ganhou a eleição prometendo a redenção social. Vimos também os
cinco dedos de FHC, símbolo de
sua campanha presidencial, com
suas promessas sociais, das quais
uma era o emprego. O Primeiro
Emprego, de Lula, destinado a
jovens, não empregou ninguém
até agora. O Fome Zero é mais
um slogan do que um programa
de governo. Mesmo programas
inspirados pelo PT, como o Bolsa-Escola, tiveram retrocesso:
deixaram de fiscalizar se as crianças estão indo para a escola.
É, afinal, votando que se aprende.
Não significa que o país não esteja mudando do ponto de vista
social. Está e para melhor. Significa que a mudança é muito mais
lenta do que é sugerido nas campanhas eleitorais. Ainda por cima, faltam mecanismos de avaliação e monitoramento para medir a eficiência das ações.
O eleitor paulistano já ganhou
por um só motivo: os prefeitos
passam e os cidadãos ficam. E o
único meio de fazê-los trabalhar
melhor e com mais seriedade é a
articulação comunitária. É o que
estamos vendo, embora ainda engatinhando, na disputa pela Prefeitura de São Paulo.
PS - Concordo com a prefeita de
que chamá-la de "dona", como
vem sendo feito pelo PSDB no horário eleitoral, assume um tom
depreciativo. Não condiz com a
imagem que José Serra quer passar quando fala de seus programas, no Ministério da Saúde, sobre a mulher. Mas também concordo com a indignação de Serra,
acusado por Marta de ser o responsável pelo aumento do número de casos de diabetes, como se
fosse uma doença transmissível
-isso fere um conhecimento elementar sobre o corpo humano, especialmente grave para quem se
especializou em temas de sexualidade, e ajuda a confundir a opinião pública sobre o que é diabetes. Aumento de registro não significa aumento da doença.
E-mail - gdimen@uol.com.br
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