São Paulo, segunda-feira, 19 de setembro de 2011

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BICHOS

JAIME SPITZCOVSKY
jaimespitz@uol.com.br

Ração com caviar


Produtos às pencas proporcionam mais saúde e mais qualidade de vida aos bichos de estimação


Um amigo, companheiro frequente de viagens, conta a história à exaustão. Não perde a oportunidade de repeti-la como forma de me escrachar. E eu aceito, silencioso, com um sorriso timidamente irônico.
"Tu não vais acreditar", entoa o gaúcho. "Fomos eu e ele a uma conferência sobre política internacional em Miami e, nos intervalos, ele me acompanhava com cara de enfado pelos shoppings da cidade. Mas quando avistou um pet shop, me largou e ficou lá por duas horas!"
Não tenho muita paciência para comprar roupa, perfume ou relógio. No entanto, me largar numa loja recheada de artigos para animais é uma temeridade. Um risco para a minha conta bancária.
Nas frequentes viagens a trabalho, procuro reservar espaço para essas compras. Já vasculhei pet shops em Miami, Nova York, Moscou, Frankfurt e Jerusalém, à procura de novidades e presentes para minha matilha.
Aqui, sou um ávido frequentador dos mega pet shops que proliferaram em São Paulo nos últimos anos. Lá, mergulho num universo de consumo que, da minha infância nos idos de 1970, lembro-me de oferecer ração a granel, um ou dois modelos de guias e, como grande conquista tecnológica, a coleira antipulgas. Mais: esse comércio se espremia para conquistar parcas prateleiras nas chamadas avícolas, onde as vitrines eram geralmente gaiolas mal-ajambradas, nas quais galinhas disputavam espaços minguados. Às vezes apareciam patos.
Guardo também a lembrança de, em feiras livres, tartarugas tigre d´água à venda e se debatendo em bacias de alumínio rasas e apoiadas em caixotes de frutas vazios. Aquários redondos abrigavam kinguios ou, pelo menos, peixinhos que se pareciam com eles. Tive um que batizei de "Zoiudo".
Esse comércio, como o capitalismo costuma impor, se sofisticou de maneira aguda. Felizmente, há controle para a venda de diversas espécies, um avanço inegável, ainda que incapaz de eliminar o tráfico. Produtos às pencas proporcionam mais saúde e mais qualidade de vida aos bichos de estimação.
Mas exageros consumistas também brotam. Tente hoje comprar um shampoo para o seu cachorro. Quer de chocolate? Pode optar ainda entre as versões guaraná, açaí, coco, melancia ou morango.
No site de um mega pet shop de São Paulo, encontrei à venda 1.043 artigos para cães, divididos em 14 categorias. A mais robusta delas: higiene e beleza, com 108 itens. Não são as prateleiras às quais costumo dedicar mais tempo nas minhas frequentes incursões ao mundo do consumo animal.
Prefiro a área de petiscos, para recompensar bons comportamentos, e itens que ofereçam distração e estímulo aos cães. Outro dia, fiquei paralisado diante das prateleiras que empilhavam infindáveis ofertas de bifinhos. Demorava a escolher. A variedade de marcas era impressionante, assim como as variações arquitetadas para seduzir o dono-comprador.
Bifinho com ervas finas ou com maçã e cenoura? Sabor calabresa ou fígado? Achatado ou cilíndrico? Fiquei, por alguns segundos, com saudades das velhas avícolas e de sua espartana oferta de produtos.


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