São Paulo, domingo, 19 de novembro de 2006

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DANUZA LEÃO

A moda que mata


O Brasil poderia começar a pensar em exigir peso e idade mínimos para quem quer encarar a passarela

É MUITO TRISTE saber que uma menina que tinha como sonho ser modelo internacional morre aos 21 anos de anorexia, que podemos quase apostar que surgiu da necessidade de estar de acordo com os padrões que a profissão exige.
Já pensei muito sobre essas garotas que correm atrás do sucesso para serem famosas e milionárias aos 18 anos -já que nessa profissão, aos 22, 23, elas já acabaram. Algumas ganham fortunas num curto espaço de tempo, mas essas são poucas.
Sempre me impressionei com certas características dessa profissão. Existem profissionais dedicados especialmente a descobrir meninas com potencial -altas, magras, bonitas-, que são buscadas até mesmo em portas de colégios, com a sedução de poderem ser as novas Giseles Bündchens. E que garota não se sentiria atraída por essa possibilidade?
Aí começam os concursos para eleger a Top Model do ano, e muitas concorrem com 13, 14 anos. Se têm a chance de se destacarem por algum traço especial, passam uma fase morando num pequeno apartamento com mais três ou quatro também pretendentes a modelos, dormindo em beliches e andando de ônibus, esperando que a carreira deslanche.
O máximo para qualquer uma delas, sobretudo quando se trata de uma menina vinda do interior, é ir para Milão ou Tóquio. Vamos reconhecer: é preciso ter a cabeça feita -e com 13 anos isso é raro- para preferir estudar geografia e matemática a ser modelo internacional. Elas vão, muitas vezes sozinhas, e se têm uma dúvida, um problema, com quem se aconselham? Com seus agentes, é claro. Estarão sempre sendo convidadas para todas as festas, rodeadas pelos mais sedutores playboys, aqueles, que passam a vida esperando pela safra do ano.
Há alguns anos houve um juiz de menores no Rio, Siro Darlan, que proibiu menores de 18 anos de desfilar. Foi um escândalo; o juiz foi acusado de querer publicidade, o tempo passou e não se falou mais nisso.
Mas vamos ter a coragem de ser caretas, por uma vez na vida: é possível jogar uma menina de 13 anos num mundo cheio de seduções e esperar que ela tenha uma cabeça privilegiada para saber o que deve ou não fazer? Uma minoria se dá bem, mas a maior parte delas, da qual nem ouvimos falar, acaba mal. E algumas, como essas duas pobres garotas que morreram nesta semana, não tem noção de até onde devem ir, para obedecer às regras do mercado. Porque para ser uma modelo de sucesso, a primeira, primeiríssima condição, é a magreza absoluta.
Para isso, qualquer sacrifício é válido: desde tomar comprimidos para tirar a fome até se habituar a não comer e ficar anoréxica. Gostei muito quando soube que na Espanha as modelos que tivessem medidas abaixo de um certo padrão estavam proibidas de desfilar.
Eles estão certos: medir 1,75m e pesar 50 quilos é loucura, é doença, mas uma doença que o mundo aplaude como digna de louvor.
Umas pessoas gostam das magras, outras preferem as gordinhas, e há lugar para tudo neste mundo, desde que sem exageros.
O Brasil poderia bem copiar a Espanha e exigir um peso mínimo para quem pretende encarar a passarela.
E começar a pensar também em determinar uma idade mínima para começar a profissão. Quem tem 13 anos, mesmo no mundo de hoje, é ainda uma menina.
Estaríamos quase sós nessas duas campanhas, mas com a certeza de estar fazendo o certo. Mesmo contra a opinião do mundo em geral e das agências de modelos em particular.

danuza.leao@uol.com.br


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