São Paulo, domingo, 19 de novembro de 2006

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Internada, doente ainda tenta emagrecer

Enfermeira do Hospital das Clínicas conta que pacientes com anorexia têm estratégias para evitar recuperar peso

De acordo com pesquisas, prevalência da doença em pessoas ligadas ao mundo da moda chega a ser o dobro que na população em geral

DA REPORTAGEM LOCAL

Até internadas elas tentam fazer exercícios durante a madrugada. Quando não podem andar, se contraem sentadas para queimar calorias. Quando caminham, saltitam e dão pulinhos para alcançar a porta. Tudo para gastar mais energia.
As pacientes com anorexia têm diversas estratégias para evitar comida e não engordar, mesmo no hospital. "Podem vomitar no ralo do banheiro, na pia, no vaso sanitário, no meio de uma revista, de um jornal e até de roupa", diz a enfermeira do Instituto de Psiquiatria do Hospital das Clínicas Lucia Helena Grando.
Quando há bulímicas (pessoas que ingerem grande quantidade de comida e depois provocam vômito) por perto, elas tentam dar os alimentos para elas. Para evitar essas atitudes, pacientes costumam ser observadas constantemente por uma enfermeira.
O curioso é que, apesar de não comerem, muitas doentes de anorexia colecionam receitas. "Elas falam sobre comida o tempo inteiro, cozinham para os outros, chegam a fazer verdadeiros banquetes", diz Lucia.
Segundo o psiquiatra Alexandre Azevedo, do Ambulim (ambulatório de transtornos alimentares do Hospital das Clínicas), 90% das pessoas atendidas são mulheres.
"Elas são meninas bastante rígidas, perfeccionistas, boas alunas. É até em razão dessa rigidez que conseguem ficar tanto tempo sem comer."
Em somente cerca de 30% dos casos tratados os pacientes se recuperam. "É uma doença grave que não possui medicação específica. Precisamos trabalhar na terapia com a distorção de imagem da pessoa, que mesmo magra se enxerga e se sente gorda", diz.

Profissões de risco
A anorexia atinge de fato mais pessoas ligadas ao mundo da moda -a prevalência, em relação à população em geral, chega a ser o dobro, segundo pesquisas internacionais.
Lucia conta ter tratado várias modelos. "Mas atendemos, por exemplo, duas irmãs que moravam num sítio no interior. Tivemos estudantes de medicina, de enfermagem e de direito."
Ginastas, bailarinos, jóqueis e boxeadores também têm chances de desenvolver a doença, segundo o psiquiatra Fábio Salzano, do Ambulim. Nssas profissões existe uma grande pressão para se manter o peso e muitos fazem dietas para isso.
"Cerca de 90% das anorexias nervosas têm gatilho com a dieta restritiva. A partir daí, a pessoa não pára mais", diz Fábio.
Apesar da pequena taxa de recuperação nos casos de anorexia e de ser necessário um longo processo para a cura, há esperança. "Hoje [na sexta] dei alta para uma paciente. Fizemos um tratamento de três anos", conta o psiquiatra Azevedo. A paciente tinha a doença desde os 14 anos -atualmente, está com 24.
"Tratamos com terapia e nutrição. Mesmo sem ter mais os sintomas, continuamos o acompanhamento por um período. A medicação vai sendo retirada e consultas passam a ser menos constantes." (AB)


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