São Paulo, quinta-feira, 20 de abril de 2006

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ARTE E FÉ

A obra "Desenhando em Terços", da artista plástica Márcia X., foi retirada da exposição no CCBB, no Rio, após críticas

Banco proíbe "terço erótico" em exposição

Reprodução
Obra "Desenhando em Terços", que foi censurada da exposição "Erotica", no Rio


TALITA FIGUEIREDO
DA SUCURSAL DO RIO

A direção do Banco do Brasil em Brasília retirou do CCBB (Centro Cultural Banco do Brasil) do Rio a obra "Desenhando em Terços", da artista plástica Márcia X (1959-2005), que integra a exposição "Erotica - Os Sentidos na Arte". A justificativa para a censura foi a centena de reclamações que o banco diz ter recebido contra a foto de dois terços que desenham um pênis cada e que se encontram formando uma cruz.
Censura para artistas e produtores da exposição, a decisão, segundo a assessoria do banco, "não observou só questões de imagem e aspectos empresariais, mas o ambiente onde atua, já que o banco acredita firmemente na liberdade de expressão".
A exposição foi vista por cerca de 56 mil pessoas em São Paulo (entre 12 de outubro do ano passado e 8 de janeiro deste ano) sem que houvesse registro de manifestação contrária a nenhuma obra.
"Foi com surpresa que recebemos a notícia. Nosso sentimento é de perplexidade, porque a retirada de uma obra de qualquer exposição é de pertinência apenas do curador", reclamou a produtora de "Erotica", Maria Ignez Mantovani Franco.
No Rio desde 20 de fevereiro, "Erotica" já foi vista por mais de 70 mil pessoas, com público diário estimado em 1.400. Na mostra há 110 obras, incluindo desenhos, fotos, gravuras, pinturas e instalações de mais de 50 artistas, entre os quais Pablo Picasso, Auguste Rodin, Anita Malfatti, Lygia Pape, Tunga e Alfredo Nicolaiewsky.
"É muito sério censurar um trabalho. É a volta da censura. Causar polêmica é válido, leva ao debate, mas retirar o quadro é muito ruim", criticou Nicolaiewsky.
A exposição deve ir para Brasília no próximo dia 15, mas, segundo a direção do banco, ainda não foi decidido se "Desenhando em Terços" fará parte da mostra.
O ex-deputado Carlos Dias (PTB) registrou notícia-crime na 1ª DP, no centro, por considerar a obra uma "afronta à fé católica". "Não foi algo fortuito, não é que eu não tenha gostado do quadro em termos artísticos, até porque para mim isso nem é arte. Mas esse quadro é uma agressão à Igreja Católica. Achei um absurdo."
O ex-deputado afirmou ainda que ficou "chocado" com a presença de crianças de escolas públicas em visitas guiadas na exposição. Ele, que é pré-candidato ao governo do Estado pelo PTB, foi o autor da lei que institui o ensino religioso nas escolas do Estado. Segundo a assessoria do banco, os critérios de acessibilidade à exposição foram feitos em concordância com a Justiça de Infância e Adolescência: a exposição é proibida para menores de 12 anos e permitida para jovens entre 12 e 18 na companhia de responsáveis.
Os estudantes que freqüentam a exposição têm obrigatoriamente a autorização dos pais, dentro do programa educativo do CCBB. No Rio, 16 escolas levaram 680 alunos para a exposição.
Professora de artes da Escola Municipal Henrique Magalhães, Simone Fernandes de Figueiredo, levou 34 alunos da 8ª série à exposição. "Trabalhar a sexualidade do aluno está nos parâmetros curriculares nacionais. Fui à exposição antes, vi se era interessante levá-los e ali falamos sobre a sexualidade, sobre o amor, o erotismo. Não é pornografia. Eles viram o quadro [de Márcia X] e ninguém se ofendeu, ninguém se chocou. Isso desmistifica a questão do sexo e faz parte da educação sexual. Tirar o quadro é retroceder."


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