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SP também tem clínicas semelhantes
Apesar de cenário ideal para descanso, unidade impõe rotina rígida aos internos, com horários determinados e "chamada"
Especialista afirma que
internação é apenas parte
do tratamento; índice de
sucesso no processo de
reabilitação é de 30%
DA REVISTA
A reportagem visitou uma
clínica em São Paulo para mostrar como é o tratamento. Da
casa da administração, na parte
alta do terreno, avistam-se a
piscina, uma massa verde de árvores pontuada pelo roxo das
flores das quaresmeiras e outras casas semelhantes, baixas
e cercadas por plantas. Não é
luxuoso, mas dá a idéia de um
bom lugar para descansar.
Nesse cenário de hotel-fazenda, os hóspedes não estão
de férias nem fizeram reserva
antecipada. O pacote que compraram foi outro: abuso de álcool e drogas, desenvolvimento
de dependência química, surtos causados pelo excesso de
droga ou pela falta dela, tentativas variadas de recuperação seguidas de recaídas.
Na unidade de Vargem Grande Paulista (Grande São Paulo)
do Centro Paulista de Recuperação, a população internada
para a chamada reabilitação é
variada. Jovens na faixa dos 20
anos viciados em crack e outras
drogas, dependentes de álcool
passados dos 50 anos. São universitários, empresários, profissionais liberais e funcionários públicos e de nível médio.
Todos, dos que acabaram de
ser internados aos que estão
completando os quatro meses
regulamentares de permanência nessa clínica, têm, em primeiro lugar, uma mesma expectativa: sair dali. Para alguns
é ir embora. Ponto. Para outros,
é sair para tentar reconstruir a
vida que tinham, ou queriam
ter, antes da desestruturação
psíquica, física e social causada
pela dependência.
A rotina é pré-determinada,
com horários rígidos e "chamada", para confirmar a presença
de cada interno. A participação
não é obrigatória, mas ausências e a não-realização de tarefas fazem com que o paciente
perca pontos -no Centro Paulista de Recuperação, os pacientes são avaliados com um
sistema de pontuação que determina a permissão para telefonemas, visitas e licenças.
A programação diária inclui
oficinas de arte-terapia, aulas
de educação física, palestras,
atendimento individual e grupos terapêuticos -estes desenvolvem, mais especificamente,
o programa dos 12 passos, mesmo método da Promises, em
Malibu, o que envolve a admissão pessoal do problema, realização de inventários de vida e
apoio social do grupo.
"No Brasil, 95% das clínicas e
comunidades terapêuticas seguem esse modelo. Pode haver
diferenças, mas, basicamente, a
internação é uma imersão nessa filosofia", diz Ronaldo Laranjeira, coordenador da Uniad
(Unidade de Pesquisa em Álcool e Drogas) da Faculdade de
Medicina da Unifesp (Universidade Federal de São Paulo).
No passo a passo da reabilitação, a internação é apenas uma
das variáveis. "É indicada em
alguns casos, mas não é a única
opção", diz o psiquiatra Arthur
Guerra, presidente do Centro
de Informações sobre Álcool.
"Se há um bom diagnóstico e
orientação médica, a desintoxicação pode ser feita em casa."
Guerra considera a internação uma pequena parte do processo de recuperação e diz que,
para ser efetiva, o paciente deve
aceitar a idéia de que vai precisar continuar em tratamento
depois que sair da clínica.
Outra questão importante é a
tendência de a família esperar
um milagre, diz Dartiu Xavier
da Silveira, coordenador do
Proad (Programa de Orientação e Assistência a Dependentes) e professor de psiquiatria
da Unifesp. "A internação não
tem essa eficácia."
Em geral, o índice de sucesso
na reabilitação fica em 30%. Se
o tratamento juntar medicamentos, psicoterapia e apoio
social, a chance de recuperação
sobe para 40%. Se utilizar só
um desses recursos, cai para
20%. "Com os medicamentos
de hoje, é possível se desintoxicar em cinco dias", diz Silveira.
Mais demorada é a etapa seguinte: reaprender a viver sem
a droga. "O processo pode levar
um ano. Para ajudar, podemos
usar medicamentos, psicoterapia intensiva, grupos de apoio."
Se parece mais fácil fazer tudo isso dentro de uma clínica,
há também as desvantagens da
internação. "É um ambiente artificial", diz Laranjeira. "Além
disso, a motivação pessoal conta muito. E a maioria das internações é feita à revelia do paciente."
(IARA BIDERMAN)
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