São Paulo, segunda-feira, 20 de abril de 2009

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Concessionária pinta asfalto da Fernão com tinta escorregadia

Tintura preta utilizada pela OHL para cobrir sinalização antiga na rodovia é invisível à noite e potencializa riscos de acidente

Motociclistas contam que já sofreram quedas por causa da tinta; concessionária diz que prática para camuflar pista é "habitual" no país

Carol Guedes - 8.abr.09/Folha Imagem
Pavimento da Fernão Dias em que tinta preta foi usada para camuflar a sinalização antiga

ALENCAR IZIDORO
DA REPORTAGEM LOCAL

A concessionária OHL, responsável por rodovias como Fernão Dias e Régis Bittencourt, tem adotado um tipo de pintura no asfalto que desrespeita as normas técnicas e aumenta os riscos de acidente.
Desde que assumiu, há pouco mais de um ano, estradas concedidas pelo governo federal, a empresa usa uma tinta preta para camuflar a sinalização antiga do pavimento -em vez de removê-la, como seria correto.
Os veículos, assim, passam em alta velocidade sobre uma superfície lisa (porque a tinta retira a rugosidade do asfalto) e pouco perceptível durante a noite (porque ela é escura) em diversos trechos rodoviários.
Especialistas dizem que, devido à baixa aderência e à baixa visibilidade do material, fica comprometida principalmente a estabilidade das motos.
Na Fernão Dias, próximo da divisa entre Minas Gerais e São Paulo, dois motociclistas que se acidentaram em dezembro registraram a ocorrência atribuindo a queda à faixa escorregadia e preta pintada no asfalto.
"Eu caí de repente, em plena reta. Só não me machuquei tanto porque consegui pular da moto", diz Luiz Artur Cane, 51, usuário da estrada, condutor de motos há mais de 30 anos.
"Com chuva ou à noite, é impossível ver a tinta no chão. Em cima dela, qualquer movimento pode ser fatal", afirma Fábio Rocha de Souza, 33, industrial cuja Suzuki teve perda total.
Nos últimos seis meses, a média foi de dois acidentes com motos por dia na Fernão Dias, onde esse tipo de veículo também paga pedágio (meia tarifa).

Sem autorização
A pintura adotada pela OHL fere as recomendações da ABNT (Associação Brasileira de Normas Técnicas). O problema não está na tinta, mas na finalidade com que é usada.
O Denatran (Departamento Nacional de Trânsito) também diz que a prática da concessionária não é autorizada pelas regras de sinalização e que, além de afetar a aderência, tem como "agravante" a possibilidade de confundir os condutores.
A ANTT (agência responsável por fiscalizar concessões federais) não se manifestou.
A OHL afirma que a prática de usar tinta preta para camuflar a sinalização antiga é "habitual" em rodovias do país.
"Isso tinha de ser banido. É completamente arriscado, uma gambiarra", avalia Alexandre Zum Winkel, engenheiro, técnico em sinalização de trânsito e formado perito do IC (Instituto de Criminalística).
"A superfície lisa é um ponto vulnerável na hora da frenagem", explica outro especialista, Frederico Rodrigues.
Pelas normas técnicas, a sinalização do asfalto pode ser removida usando métodos diversos, como fresagem (retirando camada do pavimento).
Às vezes esses procedimentos são ignorados, segundo os técnicos, porque é mais barato improvisar a tinta da cor do asfalto sobre a pintura antiga.
O manual do DER-SP (Departamento de Estradas de Rodagem, responsável por rodovias estaduais) é enfático ao reprovar a prática: "a sinalização horizontal a ser apagada, provisória ou definitiva, não deve, em qualquer circunstância, ser coberta com tinta preta".
A pintura da cor do pavimento é admitida apenas para fazer contraste (por exemplo, como borda de uma tinta branca sobre de concreto) ou, segundo uma norma da ABNT de 2005, "em vias locais ou onde não haja circulação de veículos sobre a demarcação recoberta".
O coordenador do comitê de tráfego da ABNT, Hélio Moreira, diz que "não precisa ser especialista" para verificar que a aplicação de tinta deixa o asfalto liso não é perceptível à noite.
"Como técnico, não posso concordar com esse uso [da tinta], embora, como fabricante, para mim, seja excelente", diz Moreira, que também é diretor da indústria Indutil.


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