São Paulo, sábado, 20 de junho de 2009

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Pelo projeto, policial infiltrado não pode torturar nem matar

Proposta impõe limites aos crimes cometidos pelo agente; o texto será levado ao Senado assim que for finalizado

Atualmente, a infiltração está prevista em duas leis, mas sem regras claras, o que faz com que a prática seja pouco usada ou feita sem controle


ITALO NOGUEIRA
DA SUCURSAL DO RIO

Força-tarefa do Ministério da Justiça para combater a lavagem de dinheiro e a corrupção quer incluir na lei a possibilidade de policiais infiltrados em quadrilhas cometerem crimes durante investigações.
Para o grupo, não é possível utilizar esse método de apuração sem participar de atividades ilegais.
Pela proposta discutida na Enccla (Estratégia Nacional de Combate à Corrupção e à Lavagem de Dinheiro) -grupo formado por policiais, promotores e juízes-, o infiltrado não poderia torturar nem cometer crime sexual ou contra a vida.
Hoje, a infiltração está prevista em duas leis, mas sem regras claras. Elas apenas autorizam o método de investigação, sem definir prazo ou como eventuais crimes praticados pelo policial serão analisados.
De acordo com juízes e policiais, a falta de regulamentação faz com que a prática seja pouco usada ou feita sem controle. Quando têm autorização judicial, são pouco profundas.
Para a juíza federal Ana Paula Vieira da Costa, o infiltrado deve, em algumas ocasiões, cometer crimes para "conquistar a confiança dos membros da organização criminosa".
O grupo defende que o juiz defina os crimes que poderão ser cometidos na infiltração, desde que "proporcionais" ao delito investigado.
A proposta, a ser finalizada, será levada ao Senado para discussão do projeto de lei 150/ 2006, para combate o crime organizado, da senadora Serys Slhessarenko (PT).
A intenção inicial da petista, porém, era excluir o infiltrado da lei. Ela afirmou ser "inconcebível" que agentes públicos cometam crimes "sob o pretexto da formação da prova". Para ela, melhor seria acabar com a quadrilha identificada.
Emenda do senador Desmóstenes Torres (DEM) inseriu a possibilidade de infiltração no projeto. Para ele, é um "instrumento investigatório de reconhecida eficácia, amplamente utilizado em quase todos os países".
A pesquisadora Mariângela Lopes, da USP, que analisou a prática em sete países, diz que a -tática "é eficiente no combate ao crime organizado, mas fere garantias constitucionais", como a privacidade e a moralidade na administração pública.
Favorável à prática, o juiz federal Sérgio Moro disse ser contra a proibição expressa a homicídios, como propõe a Enccla. Ele disse que dificilmente seria aceitável o assassinato cometido por infiltrado, mas a regra pode deixar o agente receoso e deixá-lo "longe do núcleo da organização".
Para o delegado federal Ricardo Saadi, esta é uma "situação extrema". "Muitas vezes o cara é testado: ter que matar determinada pessoa que já ia morrer de qualquer forma".
O único país identificado por Lopes a proibir expressamente o cometimento de determinados crimes é a Argentina. A maioria deixa como critério único a "proporcionalidade" com o crime investigado.
O projeto da Enccla diz também que a infiltração só poderá ser usada quando outros meios de investigação não forem aplicáveis. Para o chefe da inteligência da Secretaria de Segurança da Bahia, Maurício Telles, em "99% dos casos" os métodos tradicionais bastam.
"É muito mais fácil recrutar um informante [membro da quadrilha que dá informações extraoficiais à polícia] do que infiltrar um agente."
O projeto estabelece seis meses como prazo de infiltração. O policial teria a identidade alterada e, ao final, entraria em programa semelhante ao de proteção a testemunhas.


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