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RETRATO DE SP
Regiões com os indicadores sociais mais precários são as que têm o maior percentual de moradores com até 15 anos
Jovens se concentram nas piores áreas de SP
MARIANA VIVEIROS
FERNANDA MENA
CÍNTIA CARDOSO
DA REPORTAGEM LOCAL
"Aqui parece que tem uma nuvem preta em cima. Nada vai pra
frente." É assim que Maxwell
Gonçalves Maia, 19, se refere ao
seu bairro: Cidade Tiradentes, no
extremo da zona leste de São Paulo. "Se a coisa continuar como está, só consigo ver dois destinos
para os jovens daqui: a morte ou a
cadeia. Isso é o fim do mundo."
A desesperança tem uma explicação. A periferia paulistana, onde se verificam os piores indicadores socioeconômicos, os maiores índices de exclusão e violência
e os recordes em crescimento populacional da cidade, concentra
também as regiões com maior
percentual de crianças e jovens
menores de 15 anos, cujo futuro,
diante da realidade em que vivem,
lhes parece nada promissor.
O retrato da falta de perspectiva
está nas informações do banco de
dados Município de São Paulo,
elaborado pela Fundação Seade
(Fundação Sistema Estadual de
Análise de Dados) e disponível
desde ontem em seu site na internet (www.seade.gov.br).
Pela primeira vez, as estatísticas
(de anos diferentes, no período
entre 2000 e 2004), foram destrinchadas por subprefeitura, de forma a fornecer um raio-X da capital que possa ajudar na efetiva implementação de programas e políticas públicas, diz Cecília Comegno, coordenadora do trabalho.
A conjugação de mais jovens e
piores expectativas é, segundo especialistas, um grande fator de
risco. "A falta de um projeto de vida está muito relacionada à opção
pelo imediatismo da violência e
da criminalidade", resume Luciana Guimarães, diretora de projetos do Instituto Sou da Paz.
Não é à toa que Maxwell Maia
afirma: "O único cara que eu conheço que se deu bem na vida
conseguiu isso roubando".
Limites
Parelheiros (extremo sul), Cidade Tiradentes, Guaianazes (extremo leste), Perus (extremo norte) e
Itaim Paulista (extremo leste) são,
em ordem decrescente, as subprefeituras que mais têm crianças e
jovens na cidade: 33,4%, 32,6%,
31,7%, 30,9% e 30,4% da população residente respectivamente.
Juntas, elas reúnem uma população jovem que é o dobro da encontrada nas cinco subprefeituras
que têm as menores frações de
crianças e jovens, mas estão no topo do ranking em qualidade de
vida, como Pinheiros (zona oeste)
e Vila Mariana (zona sul). Estão
todas também acima da média
municipal -24,4% dos paulistanos têm menos de 15 anos.
A concentração de crianças e jovens nas periferias pode ser explicada pelas maiores taxas de fecundidade e maior percentagem
de mães com menos de 20 anos
nesses locais, dizem especialistas.
E, se tomados como base os dados de hoje, quem vive nas cinco
subprefeituras "mais jovens" tem
poucas perspectivas de sucesso
no mercado de trabalho. Nessas
regiões, a média de anos de estudo não chega a sete (menos que o
ensino fundamental completo), e
os empregados formais não chegam a 1% do total da cidade.
Sem estudo suficiente, cultura e
lazer seriam instrumentos valiosos de instrução e ocupação.
Acontece que essas subprefeituras estão entre as que têm menos
de dez equipamentos culturais,
sendo que em Parelheiros e Cidade Tiradentes, até 2002, nem sequer havia um cinema, um centro
cultural ou uma biblioteca (o segundo bairro agora sedia, ao menos, um Centro Educacional Unificado, da prefeitura).
Tudo isso ajuda a explicar por
que os jovens da periferia também têm chances reduzidas de
encontrar um emprego. As estatísticas de mercado de trabalho
para o extremo leste, por exemplo, mostram uma taxa de desemprego de 23,5%, praticamente o
dobro da taxa para o centro, que
ficou em 12,4% em 2003.
O quadro se agrava ainda mais
com a explosão de violência que
acomete esses bairros. O risco de
um jovem morador da subprefeitura de M'Boi Mirim morrer assassinado é 19 vezes maior do que
para os que vivem em Pinheiros.
Sem futuro
Maia é um exemplo típico do jovem desses bairros desassistidos:
parou de estudar na sexta série do
ensino fundamental e já cansou
de contar os amigos que sucumbiram ao crime ou que morreram
assassinados. Está desempregado
e não encontra atividades de cultura e lazer na sua região para
ocupar o tempo e aprender algo.
"Fico aí à toa, parado nessa praça
cheia de lixo o dia inteiro."
Leandro Sampaio, 22, que também vive na região, afirma que ser
jovem em Cidade Tiradentes é
"difícil e desafiante, especialmente na busca de emprego". Além da
falta de oportunidades de desenvolvimento, esses jovens ainda
têm de lidar com a discriminação
geográfica de seus bairros.
"Já aprendi que tenho de colocar no meu currículo um endereço de Guaianazes. Se digo que
moro aqui, já sou descartado de
cara. A desculpa é que o bairro é
muito longe de tudo e a condução
ficaria cara", conta o rapaz.
A Subprefeitura de Parelheiros
realmente não tem nenhuma biblioteca nem equipamento cultural. O CEU (Centro Educacional
Unificado) previsto ainda não foi
construído. Há só seis equipes do
Programa de Saúde da Família.
Embora tenha a única área de
proteção ambiental municipal da
cidade, a região costuma ganhar
as páginas dos jornais pela desova
de cadáveres ou localização de cativeiros. Mas já foi pior, diz Carlos
Henrique Pereira, o subprefeito.
"Há muito o que fazer, mas ninguém fez tanto." Em 18 meses de
gestão, ele afirma ter duplicado o
número de crianças e jovens nas
escolas municipais (de 6.000 para
13 mil) e colocado 1.200 postes em
um distrito da região. Planeja ter
investido até o fim do ano R$ 82
milhões e inaugurado a primeira
casa de cultura da região (ainda
que fossem previstas três).
Pereira diz que a subprefeitura
foi esquecida pelo poder público
por muito tempo, em parte pela
distância do centro. "Nossas prioridades são educação, entretenimento, cultura e saúde."
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