São Paulo, sexta-feira, 20 de setembro de 2002

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CASO TIM LOPES

Traficante é o principal acusado de torturar e matar jornalista da TV Globo; operação mobilizou cerca de mil policiais

Elias Maluco é preso após três dias de cerco

TALITA FIGUEIREDO
FERNANDA DA ESCÓSSIA
DA SUCURSAL DO RIO

Três meses e 17 dias depois do assassinato do jornalista Tim Lopes, da TV Globo, a Polícia Civil prendeu, às 8h45 de ontem, o principal acusado de sua morte: o traficante Elias Pereira da Silva, o Elias Maluco, 36.
A prisão resultou de uma ocupação iniciada na terça-feira no complexo do Alemão (zona norte), a área onde Lopes foi morto. O traficante mais procurado do Rio foi preso desarmado, numa casa em um beco de acesso à favela da Grota, que fica no complexo do Alemão.
Maluco é o principal acusado pela morte de Lopes, ocorrida na noite de 2 de junho. Dos nove indiciados no processo, era o último em liberdade. Seis estão presos, um morreu em confronto com a polícia e o último teria se matado. Em depoimento ontem ao Tribunal de Justiça, ele negou a participação no crime.
Maluco ficará preso no Batalhão de Choque da Polícia Militar até a reforma da penitenciária Bangu 1, parcialmente destruída pela rebelião da semana passada.
O secretário estadual de Segurança Pública, Roberto Aguiar, disse que Maluco não terá contato com outros presos no local, como o traficante Fernandinho Beira-Mar, do CV (Comando Vermelho), líder do motim em Bangu 1.
A operação de cerco a Maluco mobilizava mil policiais, em regime de revezamento, para manter sempre 250 homens no complexo. A casa onde o criminoso foi preso estava a cerca de 500 m da central montada pela Polícia Civil.
Segundo a Secretaria de Segurança, por volta das 8h30, policiais da Divisão de Capturas tomavam café numa padaria, aguardando a equipe que os substituiria, quando um morador informou que o traficante estaria em uma casa do beco.
Cerca de dez policiais cercaram o local, um sobrado de alvenaria. A dona da casa, Joacyra de Jesus, abriu a porta e permitiu a entrada. No segundo andar, atrás de uma porta, estava o traficante, segundo a secretaria.
"Perdi, chefe. Só não "esculacha" não", teria dito Elias Maluco ao inspetor que o prendeu, João Carlos Pereira Couto, 45. Não houve resistência do traficante. A euforia tomou conta dos policiais, que desceram o beco gritando: "Prendemos, prendemos".
Os participantes da operação se juntaram e, em comboio, Maluco foi levado à chefia de polícia, no centro. No trajeto, policiais militares, guardas municipais, pedestres e motoristas comemoravam com buzinas e acenos.
Na tumultuada apresentação do traficante a jornalistas, Maluco foi exibido na frente de um cartaz com a seguinte mensagem: "Aqui está Elias Maluco. Polícia Civil".
O secretário de Segurança Pública afirmou que não existe poder paralelo no Rio. "Este Estado tem poder legítimo, democraticamente eleito."
Ao final da apresentação, depois que as autoridades tinham saído, jornalistas xingaram Maluco, insistindo que ele levantasse a cabeça. Um policial apertou as nádegas do traficante, que reagiu a chutes. Ele não conseguiu acertar o policial.
A prisão de Maluco ocorre num momento de crise do governo de Benedita da Silva (PT), por causa da rebelião na semana passada em Bangu 1. Com a prisão, o governo espera reverter a imagem de que não tem força diante da ação do tráfico.

Monitoramento
Para prender Maluco, a polícia monitorou o sinal de seu telefone celular e interceptou suas conversas. Com isso, conseguiu acompanhar a movimentação no complexo. Não conseguiu, porém, interceptar as conversas do traficante pelo aparelho Nextel, uma espécie de rádio.
Teixeira disse que, desde a morte de Lopes, o traficante ficou quase todo o tempo, no complexo. "Pelo que sabemos, esteve no centro e em Vigário Geral. Mas, com a operação que fizemos, ficou acuado, indo de uma residência para outra."
A prisão de dois rapazes anteontem foi fundamental para que a polícia tivesse certeza de que Maluco ainda estava na região. Eles estavam em uma casa que servia de esconderijo do traficante. Segundo a polícia, eles confirmaram que davam informações e comida ao traficante.
Com os dois rapazes foram encontradas roupas, um celular, um aparelho Nextel, um carregador de Nextel, R$ 990 e documentos falsos. Também foi detido, e depois liberado, o filho dos donos da casa em que Maluco foi preso.
O chefe da Polícia Civil dedicou a prisão do traficante à família de Tim Lopes, que não quis comentar a ação. "A prisão de Elias Maluco é só o começo", disse o advogado André Martins, concunhado do jornalista.
A Fenaj (Federação Nacional dos Jornalistas) e a Comissão Tim Lopes (criada após a morte do jornalista, para acompanhar as investigações) elogiaram a prisão, mas cobraram ações sociais nos complexos do Alemão e da Penha, onde o repórter foi capturado e morto.
A governadora Benedita da Silva (PT) anunciou que o local no alto da favela da Grota onde o corpo do jornalista foi encontrado será transformado no Parque Tim Lopes, com lazer e projetos sociais para a população da região.
"Queremos agora uma invasão social de toda a região", afirmou o jornalista Marcelo Auler, da Comissão Tim Lopes. Ele acompanhou a apresentação de Elias Maluco e puxou uma salva de palmas dos jornalistas para os policiais.
"Mesmo entendendo que a prisão demorou a acontecer, a gene viu que foi uma ação eficaz e inteligente, embora esse não seja o usual da polícia", afirmou a presidente da Fenaj, Beth Costa.


Colaborou RAFAEL CARIELLO, da Sucursal do Rio

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