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DANUZA LEÃO
Sem medo
Escrever: todo mundo devia
escrever uma ou duas páginas por dia, ou pelo menos todo
fim de semana, contando como
têm sido seus dias, falando sobre
sua vida, suas alegrias, tristezas,
decepções, felicidades. Para isso
não é preciso saber escrever; seria
uma espécie de diário, para ler
daqui a 20 ou 30 anos, e que um
dia será encontrado por um neto
ou bisneto que, sabendo mais de
suas origens, como foram seus
pais e avós, talvez compreendam
melhor por que são como são.
Para isso basta um caderno e
uma esferográfica -e uma gaveta com chave, pois essas confissões
só devem ser lidas pelos outros
com a permissão de quem escreveu, a não ser que já tenha morrido. E pense um pouco: você deve
ter passado por coisas que prefere
não lembrar, que estão lá dentro
contidas, reprimidas, e das quais
acha que já esqueceu, já que não
pensa nelas -quem não passou?
Não pensa mas elas estão lá, travando seus atos, impedindo que
você seja livre desses bloqueios e
possa ser, conseqüentemente,
mais feliz.
Escreva; escreva, pois escrever
faz bem. Falar, seja com a maior
amiga, um padre ou com o psicanalista, não é o suficiente. Falar
toda a verdade, sem nenhuma
censura, com sinceridade total, só
se consegue a nós mesmos, e isso
quando temos coragem.
Fácil não é. E se certos acontecimentos são difíceis de serem lembrados, mais difícil ainda é de serem colocados no papel. Mas isso
é só no início; depois dos primeiros dias vai se tornar um hábito,
como se estivesse conversando
com você mesma, porque
ninguém com mais capacidade
para entender por que fez certas
coisas, praticou atos que foram
censurados pelos amigos e pela
família, do que você. Só você, e
mais ninguém.
À medida que os acontecimentos mais difíceis vão sendo escritos, mais coragem você vai ter para continuar escrevendo, e pouco
a pouco vai perceber que está mudando. Os fatos mais dolorosos,
nos quais não conseguia nem
pensar, vão ficando mais leves;
conseqüentemente, você vai ficando mais leve. E vai perceber
que, sem o peso que carregou durante tanto tempo lá no fundo de
você mesma, é como se tivesse se
libertado. Não vai se esquecer das
tristezas pelas quais passou, mas
vai conseguir vê-las de frente, pois
não há esforço maior do que o de
não querer pensar numa coisa,
achando que assim vai evitar o
sofrimento. Escreva para você,
sem esconder nada, sem nenhum
pudor de confessar os vexames
pelos quais passou, as tristezas, e
até os momentos de glória, que
também não são fáceis de contar,
até porque desses ninguém está
interessado em ouvir.
Vá por mim: escrevendo, você
vai mudar. Quando não houver
mais áreas obscuras na sua vida,
aquelas que você nem sabia que
eram tão pesadas e te impediam
de usufruir de todos os momentos
como eles merecem ser vividos,
vai se sentir mais leve.
Vá, escreva. Não tenha medo de
não conhecer bem o português, ou
porque não sabe botar as crases
no lugar certo; nada disso tem a
menor importância.
Acredite: isso aconteceu comigo,
e a vida hoje me parece muito,
mas muito melhor do que era.
Eu me libertei não das minhas
lembranças, mas dos meus fantasmas, e tenho a consciência de
ser uma nova pessoa; uma pessoa
que tem muito mais prazer em viver do que tinha antes de escrever.
E não é isso que todos queremos?
E-mail - danuza.leao@uol.com.br
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