São Paulo, quarta-feira, 21 de março de 2007

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"Caí com meu Fusca 77 da ponte do Socorro; sobrevivi"

O auxiliar de farmácia contou que perdeu o controle do veículo ao ser fechado por um táxi; ele quebrou 2 dedos do pé

Armando dos Santos Brito Silva, 23, despencou na marginal Pinheiros no domingo

LAURA CAPRIGLIONE
DA REPORTAGEM LOCAL

O Fusca 77 branco era o orgulho da família Silva. Inteirão em seus 30 anos, valia algo entre R$ 3.200 e R$ 3.500. No último domingo, 7h, dia chuvoso, o carro invadiu de ré a calçada da ponte do Socorro, derrubou o gradil verde enferrujado, suposta proteção para veículos e transeuntes, e precipitou-se no ar (6,5 metros de altura), até chocar os seus 800 quilos com o asfalto da marginal Pinheiros, lá embaixo.
Um ônibus lotado passava pela via na hora exata do vôo do Fusca. Fretado, levava seus passageiros para passar o domingão em um clube da cidade.
O motorista viu quando um pedaço da grade verde da ponte começou a despencar. Jogou o ônibus de lado, a tempo de se desviar do Fusca, que vinha em improvável rota vertical. Não conseguiu, porém, evitar um outro meteoro -o jovem branco, 1,73 metro, 73 quilos, apelido no orkut "Buchechudinho", 23 anos, Armando dos Santos Brito Silva, auxiliar de farmácia, que acabou enfiado debaixo do veículo.
Armando era quem dirigia o Fusca. Enquanto despencava, o carro deve ter batido em algo. A porta do carona escancarou-se e o motorista foi arremessado para fora do veículo. Sorte. A cabine do carro foi tão amassada com o acidente que teria esmagado junto o corpo do rapaz, se ele estivesse dentro. Armando diz que estava usando cinto de segurança.
Os dois -carro e homem- atingiram o chão da marginal Pinheiros a uma velocidade aproximada de 41 km/hora.
Ontem, Armando falava baixinho, suspirando. Desse jeito, comemorava a nova vida que ganhou: "Primeiro, vou fazer de tudo para me recuperar; depois, quero que essa chance valha muito a pena para todos os que me cercam".
Ele bateu de costas no asfalto e sua coluna ficou intacta, apesar da luxação e da dor nos pulmões. Quase foi atropelado pelo ônibus, mas tudo o que lhe aconteceu foi quebrar dois dedos do pé esquerdo.
Quatro motoboys foram os primeiros a chegar para ajudar. Embaixo do ônibus, encaixado entre as rodas, Armando gritava por socorro, rezava, pedia aos gritos proteção de Deus, chorava de dor, o pé esquerdo preso na traseira do veículo.
"Eles [os motoboys] se enfiaram embaixo do ônibus e me deram muita força; pediram para eu não dormir; diziam que eu era um herói, um sobrevivente. Que eu tinha de ficar calmo. Que o resgate vinha vindo", lembra Armando. "Eu quero homenageá-los pela generosidade que mostraram."

Sem prestar socorro
O acidente com o Fusca aconteceu quando Armando fazia o caminho de volta para casa, depois de levar a namorada para o trabalho (os dois são empregados de um hospital na avenida Santo Amaro).
Morador no Grajaú (zona sul da cidade), o jovem passava pela ponte do acidente quando um táxi Siena deu uma fechada no seu Fusca, que ia a "uns 60 km/hora".
Para evitar o choque, Armando jogou o carro para o canteiro central, depois para a direita. Chovia, a pista estava molhada, e o Fusca se desgovernou. "Derrapou, dançou na pista, girou, caiu de ré", diz.
Segundo Armando, o motorista do Siena fugiu, sem prestar socorro. "Eu só me lembro do buraco no meu estômago quando o carro começou a cair. Do resto, não me lembro de nada. Nem da hora em que fui arremessado do meu Fusca", diz.
Apesar disso, na noite de anteontem, o jovem não conseguiu dormir. Flashes da queda, da aflição da queda, despertavam-no, aflito.
Ontem, a mãe de Armando, Josefa, dizia que "anjos salvaram" seu único filho (ela tem mais duas filhas, Rebeca, 13, e Amanda, 19).
A família não sabe quando o rapaz, que está internado no Hospital e Maternidade do Brás, receberá alta. "Ele ainda tem muita dor, e estava com água no pulmão, mas os médicos dizem que a evolução está muito boa", afirma Amanda.
Ao falar sobre o Fusca 77, que era o orgulho da família Silva, Armando começou a chorar: "Meu pai gostava muito daquele carro, mas não o dirigia. Eu aprendi a dirigir com ele. Agora, ficamos assim, sem ele. Como vamos ficar sem ele?"


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