São Paulo, domingo, 21 de março de 2010

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Feiras resistem com charme à restrição de horário em SP

Calor humano, produtos frescos e novos serviços explicam a sobrevivência do comércio de rua em tempos de hipermercados

Devido aos alagamentos, Prefeitura de SP reduziu em 1 hora o funcionamento das barracas; após dois meses, consumidores se adaptam

ROBERTO DE OLIVEIRA
ANA PAULA BONI
DA REVISTA DA FOLHA

Que atire um tomate quem nunca ouviu o clássico grito de feira: "Mulher bonita não paga nada, mas também não leva". Como diz a atriz Sandra Corveloni, 44, desde menininha acostumada a correr com a sacolinha nos braços pelas feiras paulistanas: "Está deprimida? Vai à feira que passa".
Talvez esteja aí um dos segredos que explicam o motivo de as barracas continuarem ainda de pé nas ruas dos mais diversos pontos da capital, numa época em que os supermercados abocanham, a cada dia, uma baita fatia desse mercado.
E, há dois meses, o feirante aprende a lidar com mais um "concorrente": diante dos dilúvios que assolaram a cidade por mais de 40 dias consecutivos, um decreto municipal reduziu em uma hora o funcionamento das feiras.
É certo que o movimento de "fregueses" vem diminuindo a cada ano. Mas, a julgar pela tradição das feiras e o convívio social que ela proporciona a muitos paulistanos, o fim deste tipo de comércio ao ar livre (ainda) está longe.
Os consumidores estão se adaptando ao novo horário e às novas comodidades oferecidas pelos feirantes, como o chef francês Erick Jacquin, que gosta de passear e comprar em feiras do Pacaembu e de Higienópolis (zona oeste) e de Moema (zona sul). "Aqui tem vida e alegria", defende ele, enquanto selecionava frutas para ser entregue no restaurante que leva o seu nome.
Honestidade e transparência, dizem os clientes, é a alma do negócio. "Se o produto não estiver bom, o feirante fala para você não levar. Aqui, a palavra vale muito", conta outra entusiasta do comércio ao ar livre, a pedagoga Edite Traiman, 55.
De pai para filho
Do lado de lá da barraca, o feirante vive a mesma experiência -de intimidade com produtos e clientes. Ainda mais se o comerciante cresceu dentro de uma barraca, como no caso de Armando Papucci, 52, que vem de uma verdadeira dinastia -os avós maternos, os pais e os três irmãos sobrevivem há três gerações da venda de alimentos ao ar livre.
Aos domingos, Armando monta 28 m na feira da rua Santo Amaro, no centro. Ao seu lado, a mulher, Adelaide, 52, que ele conheceu quase 30 anos atrás numa feira. "Era uma barraca de frente para a outra. A da minha família, de frutas; a da dela, de legumes", conta.
Virou uma banca só: de frutas, de onde eles tiram o sustento para as quatro filhas: uma é advogada, a outra, engenheira, uma estuda administração e a caçula está no colégio. No fim de semana, elas ajudam os pais. Para manter a tradição, o sobrinho de Armando namora a sobrinha de Adelaide -ambos com os dois pés na feira. A julgar pelos Papucci, o futuro nas feiras está garantido.


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