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SAÚDE
Aos 50 anos, instituto sofre reforma, aumenta número de leitos de 104 para 210 e flexibiliza circulação de pacientes
Psiquiatria do HC muda cara e métodos
DA REPORTAGEM LOCAL
O Instituto de Psiquiatria do
Hospital das Clínicas de São Paulo
está completando 50 anos com
uma ampla renovação nos seus
edifícios e nas suas práticas.
As atuais enfermarias escuras e
trancadas com chave, onde as camas de metal são parafusadas no
chão, estão sendo derrubadas. No
lugar, serão construídas enfermarias menores, especializadas, com
cores e iluminação estudadas. O
projeto foi inspirado em hospitais
psiquiátricos de referência na Europa e nos Estados Unidos.
No novo instituto, os pacientes
circularão pelas áreas comuns e
receberão seus familiares em ambientes que pouco lembram hospitais. Enfermarias especializadas
evitarão, por exemplo, que alguém deprimido divida o espaço
com um psicótico. E que uma
criança fique no meio de adultos.
A reformulação do Instituto de
Psiquiatria, que aumentará seu
número de leitos de 104 para 210,
vem alimentar o debate sobre os
rumos da saúde mental no país. O
instituto representa a defesa de
hospitais psiquiátricos modernos, enquanto o Ministério da
Saúde prega a redução de leitos e
o aumento dos serviços extra-hospitalares. No país, mais de 4
milhões de pacientes psiquiátricos vivem sem assistência.
Segregação
O prédio de quatro andares do
Instituto de Psiquiatria, encravado no meio do HC e projetado nos
anos 40, foi inaugurado em 1952.
Na época, não havia psicofármacos e o manicômio tinha a função
de "proteger" o paciente dele e da
sociedade, isolando um do outro.
A falta de medicação justificava
a estrutura opressiva e a segregação. Meio século depois, as enfermarias do instituto ainda mantêm algumas dessas práticas, com
pacientes em uniformes que lembram presidiários, enfiados em
cobertores boa parte do tempo.
O instituto introduziu no país as
enfermarias especializadas e os
serviços específicos. Inova agora
ao abrir essas enfermarias. "O paciente vai ser atendido num espaço compatível com o seu problema, seja um quarto ou uma área
de convivência, mas sem segregação", afirma Valentim Gentil Filho, 55, diretor do instituto. "A
enfermagem será treinada para
atender pacientes específicos, diminuindo o estresse."
Por ser um hospital universitário, o instituto está sendo pensado
como um centro de tratamento,
ensino e pesquisa. "Trata-se de
uma mudança do conceito de
hospital psiquiátrico", diz Wagner Gattaz, 51, professor titular e
diretor do laboratório de neurociência do instituto.
A reforma física teve início em
outubro do ano passado e deve
terminar em 2004. Consumirá R$
16 milhões já garantidos pelo governo do Estado. Outros R$ 10
milhões serão gastos com mobiliário e equipamentos. Os recursos estão sendo buscados junto à
iniciativa privada.
Com a reformulação, além de
dobrar o número de leitos, o instituto ampliará também o atendimento ambulatorial de 70 mil
consultas por ano para 100 mil.
Custo polêmico
"Um serviço de referência de
diagnóstico não precisa de tantos
leitos e de tanto investimento",
diz Ana Pitta, coordenadora de
Saúde Mental da Secretaria de Estado da Saúde de São Paulo.
"Com R$ 52 milhões anuais, estão
sendo mantidos todos os serviços
não-hospitalares no país, 57 deles
só no Estado de São Paulo."
O objetivo do professor Valentim Gentil é que o instituto se torne modelo para outros hospitais
psiquiátricos do país. Cumpriria,
assim, uma das funções da universidade pública -pesquisar,
testar e fornecer modelos para o
resto da comunidade.
"Gostaríamos de ver a universidade participando da elaboração
das políticas públicas de saúde,
capacitando recursos humanos e
propondo correções na produção
dos serviços comunitários, mas
não é isso que vem acontecendo",
afirma Ana Pitta.
Pedro Gabriel Delgado, que
coordena a saúde mental no Ministério da Saúde, diz que "a produção de conhecimentos é importante, mas precisa estar articulada com a rede pública de saúde
mental". A segmentação por
diagnóstico defendida pelo instituto, segundo Delgado, "não é
utilizável no modelo de atenção
comunitária". "Não é o que propomos nem o que a Organização
Mundial da Saúde propõe."
(AURELIANO BIANCARELLI)
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