São Paulo, sábado, 21 de abril de 2007

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ExcelAire acusa Embraer por falha em jato

Empresa dona do Legacy que se chocou com o Boeing da Gol também culpa o controle aéreo e a fabricante do Transponder

Em relatório à PF, a ExcelAire alega que a Embraer, fabricante do Legacy, não notificou problemas anteriores em componentes

ELIANE CANTANHÊDE
COLUNISTA DA FOLHA

Além de acusar diretamente as falhas do controle de tráfego aéreo do Brasil, a empresa norte-americana ExcelAire, dona do jato Legacy que se chocou com o Boeing da Gol em 2006, acusa também a brasileira Embraer, fabricante do avião, e a norte-americana Honeywell, fabricante do transponder.
É a primeira vez que os fabricantes são acusados por um dos grandes mistérios do acidente: por que o transponder, equipamento que transmite dados do avião para outras aeronaves e para os centros em terra, parou de funcionar antes do choque.
Em relatório de 134 páginas à Polícia Federal, os advogados da ExcelAire dizem que um dos componentes onde são instalados o transponder e parte do sistema de rádio já tinha apresentado defeito antes, numa aeronave agora fora de linha. Foi devolvido pela Embraer à Honeywell, voltou ao Brasil e foi instalado no Legacy.
Além disso, uma das unidades de gerenciamento de rádio do Legacy também foi devolvida à Honeywell por problemas em outro avião. Apesar dos problemas e de já terem sido usados em outros aviões, os equipamentos foram instalados no Legacy, que era novo e fazia seu primeiro vôo no dia do acidente, 29 de setembro, sem conhecimento dos compradores.
"A Embraer nunca revelou à ExcelAire que os referidos componentes não eram novos, nem tampouco informou que já haviam sido devolvidos à Honeywell para reparo", dizem no texto os advogados José Carlos Dias e Theo Dias.
Pelo relato deles, dois dias antes do acidente, os pilotos de teste da Embraer notaram num vôo de aceitação do Legacy que as imagens do sistema de gerenciamento de vôo "estavam piscando e trêmulas".
No texto, dizem que inspeção posterior da própria Embraer "revelou que os sistemas estavam conectados incorretamente, o que motivou suspeita de que outros sistemas poderiam apresentar, da mesma maneira, conexões defeituosas".
Nas primeiras investigações após o acidente, a Aeronáutica já trabalhava com a possibilidade de "mau contato" do transponder com a aeronave.
Ao longo das investigações, a Folha publicou que a Honeywell havia convocado "recall" de transponders, porque eles entravam em "stand by" indevido justamente por um problema de contato na unidade de rádio do avião. O Legacy estava no recall, mas a Honeywell sustentou que o que estava instalado no avião acidentado não era um dos problemáticos.
A Comissão de Investigação da Aeronáutica também concluiu que o transponder, em si, não tinha nenhum defeito. Entretanto, avisou que outras análises estavam sendo feitas e que não estavam descartadas as hipóteses nem de falha de instalação nem de operação. Não há resultado oficial ainda.
Segundo os advogados, no texto à PF, "adicionalmente, vários problemas de manutenção foram registrados nos registros de vôo do Legacy vendido à ExcelAire, evidenciando defeitos na aeronave que poderiam ter contribuído ou explicado a falha no transponder".
Eles citaram exemplos. Um deles: painéis inoperantes foram identificados pela Embraer durante um vôo de produção em 12 de julho de 2006, pouco mais de dois meses antes da colisão, que foi o maior acidente da aviação brasileira e resultou na morte de todos as 154 pessoas a bordo do Boeing.
Outro exemplo foi que o radar meteorológico não passou em teste de vôo e, mesmo após correção, voltou a falhar. O texto foi encaminhado em 10 de abril ao delegado Renato Sayão, que investiga o acidente.
Um terceiro exemplo foi num teste do avião em 11 de setembro, quando a tripulação foi avisada pelo sistema geral de alarme do avião sobre um possível superaquecimento no procedimento de aterrissagem. Sete dias depois, as unidades do painel tiveram de ser ajustadas.
Um dos sistemas que não funcionou devido à desativação do transponder foi o TCAS, o dispositivo anticolisão que poderia ter evitado o acidente.
A ExcelAire afirma que, em testes posteriores e ainda inconclusos na Honeywell, constatou-se que o TCAS recebeu um sinal indicando que o avião tinha "peso nas rodas" quando voava estabilizado a 37 mil pés (11 mil metros). Ou seja: pode não ter funcionado por "entender" que o avião estava em solo. O TCAS não funciona em terra.
O texto também indica problemas na montagem dos equipamentos, como "quantidade excessiva de silicone não-condutor dentro dos conectores da antena do transponder".
No relatório, há referência ainda a "problemas significativos" com o Legacy, antes do vôo inicial. Os advogados citam falhas nos painéis do FMS (sistemas de gerenciamento de vôo), um tendo apresentado problemas de navegação e outro deixando de indicar freqüências durante o vôo-teste.
Uma das várias possíveis causas do acidente foi justamente a falta de comunicação por rádio entre o Cindacta-1 (o centro de controle de tráfego aéreo com sede em Brasília) e o avião. Foram mais de 20 tentativas, sem sucesso, antes da colisão com o Boeing.


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