|
Texto Anterior | Próximo Texto | Índice
Reeleito, presidente da Bienal é investigado
Pires da Costa contratou revista da qual é dono para publicar textos da fundação; ele diz que preço é inferior aos de mercado
Ministério Público investiga caso; durante a eleição, escolhido disse que já usou dinheiro próprio para cobrir rombos da instituição
MARIO CESAR CARVALHO
FABIO CYPRIANO
DA REPORTAGEM LOCAL
O empresário Manoel Pires
da Costa foi reeleito anteontem
presidente da Fundação Bienal
pela terceira vez em uma situação inédita. Ele está sob investigação do Ministério Público
pelo fato de a Bienal ter contratado uma empresa dele, o que
levanta suspeitas de desvios, e o
conselho de administração da
instituição não chegou a um
consenso para aprovar as contas do ano passado.
Como as contas haviam sido
reprovadas pelo conselho fiscal, que analisa as finanças da
fundação, decidiu-se que uma
comissão de ex-presidentes da
Bienal julgará a lisura dos gastos de 2006. Numa espécie de
compensação simbólica pelas
contas colocadas sob suspeição, o conselho de administração aprovou um voto de confiança no presidente.
A vitória folgada de Pires da
Costa (39 votos a favor, 7 contra e uma abstenção) não traduz com precisão o clima tenso
da reunião, que durou cinco horas e meia.
O presidente chegou a dizer
que as restrições do conselho
fiscal atingiam sua honra. Afirmou que jamais tirou proveito
financeiro da Bienal. Em tom
de desabafo, disse que já usou
dinheiro próprio para cobrir
rombos da Bienal. O balanço da
fundação aponta um déficit de
R$ 1,03 milhão no ano passado.
O presidente da Bienal ficou
contrariado porque o conselho
fiscal fez três tipos de crítica à
sua gestão:
1. Considerou parte das práticas de governança da Bienal
"inconveniente pelos padrões
normalmente exigidos a pessoas jurídicas";
2. Apontou que Pires da Costa contratou uma empresa, a
TPT Comunicações e Editora,
da qual é dono, para editar a revista "Bien'art". A TPT recebe
cerca de R$ 125 mil por mês da
Bienal por textos sobre eventos
ligados à fundação (cada página
custa R$ 25 mil). A Bienal paga
mais R$ 15 mil por mês à TPT
por serviços de assessoria de
imprensa;
3. Avaliou que a contratação
da TPT fere o artigo 6º do estatuto da fundação, que proíbe
presidentes ou diretores de fazerem negócios com empresas
das quais são sócios.
Essas desobediências "por si
só originam uma situação de
impedimento de aprovação das
contas e da conduta da diretoria executiva", diz o relatório do
conselho fiscal, integrado pelo
médico Sebastião de Almeida
Prado Sampaio, o advogado
Manoel Whitaker Salles, o promotor aposentado Carlos
Francisco Bandeira Lins e o
empresário Julio Landmann.
Whitaker Salles diz que não
faz sentido a revista receber recursos da Bienal, sem aprovação do conselho, enquanto os
catálogos da última exposição
não foram publicados. Desde
1951, quando foi realizada a primeira mostra, é a primeira vez
que a Bienal termina sem ter
catálogos.
"Como o presidente da Bienal pode fazer um contrato
consigo próprio?", disse ele antes da eleição.
O primeiro questionamento
sobre a revista "Bien'art" foi
feito em setembro pelo conselheiro e colecionador Adolfo
Leirner. A ata registra o seguinte: "Sr. Pires da Costa informa
que foi contratada uma empresa especializada através de uma
concorrência (...). Informa que
para maiores esclarecimentos
sobre esse assunto marcará
uma reunião para apresentar
todos os detalhes de como funciona a revista "Bien'art"".
Em nenhum momento, o
presidente da Bienal informou
o mais importante, segundo o
conselho fiscal: que ele era o
dono da revista.
Há 20 dias, quando reconheceu que era o dono da revista,
Pires da Costa recebeu a recomendação de um conselheiro, o
advogado Arnoldo Wald Filho,
de fazer uma autodenúncia
junto ao Ministério Público.
Anteontem, na reunião que
reelegeu o presidente, dois promotores da Curadoria de Fundações, órgão do Ministério
Público que fiscaliza fundações, apresentaram a primeira
auditoria feita na Bienal.
Segundo assessores de Pires
da Costa, o promotor disse que,
numa primeira análise, não encontrara provas de que a revista
trazia prejuízos à fundação.
Procurado por dois dias seguidos pela Folha, o promotor
Ayrton Grazzioli não foi encontrado para confirmar o teor
da auditoria. Ainda de acordo
com assessores de Pires da
Costa, os promotores vão analisar agora se os preços pagos
pela Bienal à revista seguem os
padrões de mercado.
A investigação do Ministério
Público corre sob sigilo por envolver as finanças de uma empresa privada.
Texto Anterior: Irregularidades: Diretor visita superpresídio de Catanduvas Próximo Texto: "Não há desvios nem prejuízo para fundação" Índice
|