São Paulo, quarta-feira, 21 de maio de 2008 |
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GILBERTO DIMENSTEIN Pronto-socorro poético Atriz e cantora, Elisa criou, no Rio, uma escola para ensinar a declamar -e foi então que sentiu o poder de uma poesia
A ATRIZ ELISA LUCINDA criou o
que batizou de "pronto-socorro poético", ao receitar (e,
às vezes, recitar) poemas para amigos e desconhecidos que passam por
crises emocionais. Para cada problema, da separação conjugal à morte
de um parente, ela encontra o poema que talvez ajude a pessoa a compreender melhor a sua dor ou, pelo
menos, aquele cuja leitura a faça
sentir que não está só. "Acredito no
poder de encantamento da palavra."
Quando tinha 11 anos e ainda morava em Vitória (ES), Elisa Lucinda, estudante de uma escola de freiras, teve aulas particulares de declamação. Um de seus primeiros textos, intitulado "Mão Boba", foi inspirado nas confissões ao padre. "O prazer da poesia entrou na minha vida e não saiu nunca mais." Outra poesia nasceu de uma conversa com uma freira da escola, que assim justificava o celibato para a aluna que descobria a sexualidade: "Sou noiva de Cristo". A menina retrucou: "E se não existir vida depois da morte?" A freira, surpresa, deixou escapar: "Nem me fale uma coisa dessas!". Demorou muito tempo até suspeitar que estava ali seu futuro profissional. Por gostar de se expressar, tentou várias atividades, entre as quais o jornalismo de televisão. Ao mesmo tempo em que trabalhava como atriz e cantora, Elisa criou, no Rio, uma escola para ensinar a declamar -e foi então que sentiu o poder de uma poesia. Em oficinas pelo Brasil, acabou se deparando com as dores de professores, obrigados a se expressar, mas frustrados, cansados e acuados. "Muitos deles pareciam nem saber ler direito. Falavam olhando para o chão." Elisa queria mostrar-lhes que a poesia estava em tudo e em qualquer lugar. Até na fumaça de um café com leite. Dependia apenas, dizia ela, do olhar. Em um caso, Elisa viu que seu ensinamento foi às últimas conseqüências com uma professora, que, algum tempo depois de terminado o curso, mandou-lhe uma carta. Contou que aprendera a ver poesias nas mínimas coisas. Num pingo de água da chuva se suicidando no vidro. No riso dos filhos. No cheiro do café da manhã. Só não conseguiu, por mais que tentasse, ver poesia no marido -a carta era para agradecer a ajuda que teve para tocá-lo para fora de sua vida. PS - Muito tempo depois, Elisa encontrou a freira que tinha noivado com Cristo. Estava de maiô na praia -talvez tivesse se deixado influenciar pela menina que desconfiava da vida depois da morte. gdimen@uol.com.br Texto Anterior: Frase Próximo Texto: A cidade é sua: Leitor reclama de duas falhas sucessivas ocorridas no metrô Índice |
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