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Ex-interno vira professor de teatro e ajuda na ressocialização
DA REPORTAGEM LOCAL
Uns o xingam de "Febem". Outros o saúdam como "Dom Quixote". Assim Peterson Xavier, 21,
é recebido pelas ruas de Itaquera
(zona leste), bairro de baixa renda
de São Paulo onde cresceu e vive
com o pai e os irmãos.
As reações contrárias -ora de
preconceito, ora de admiração-
são explicadas pela trajetória de
Xavier, que, segundo ele próprio,
até lembra a do personagem do
cavaleiro errante. No bairro, Xavier vendia drogas desde os 15
anos. Foi preso por roubo e depois por tráfico -Itaquera ficou
na oitava colocação entre os bairros que tinham maior número de
internos por esse tipo de crime
em maio do ano passado.
Na última prisão, o jovem já era
"gerente" -abastecia vários pontos de venda- e foi flagrado pela
polícia com 18 quilos de maconha
em uma sacola. Na Febem, Xavier
teve contato com o personagem
Dom Quixote em aulas de teatro.
Ganhou o papel de protagonista
na peça "Num Lugar de la Mancha, Amores e Aventuras de Dom
Quixote", texto do espanhol Mario García-Guillén baseado em
"Dom Quixote de la Mancha", de
Miguel de Cervantes (1547-1616).
Quando deixou a fundação, no
final de 2000, Xavier virou ator e
professor de teatro e hoje monitora jovens em situação de risco e
outros ex-internos da Febem
atendidos em oficinas culturais
realizadas pelo Instituto Religare,
em São Paulo. Entre eles, outros
adolescentes da periferia que
também foram atraídos pelo tráfico -alguns da zona norte e até do
Jardim Brasil.
"De todos os crimes, o mais sedutor é o tráfico", definiu Xavier.
Foi nesse tipo de crime que o jovem resolveu apostar aos 15 anos,
quando perdeu o emprego de
aprendiz de eletricista. Os colegas
de futebol viraram comparsas.
Por causa de uma dívida de droga, Xavier pegou uma arma e foi
roubar uma empresa. O parceiro
foi preso na hora e Xavier, dias depois. Após quatro meses, saiu e
voltou a traficar. "Um pai de família leva um mês para ganhar o que
você ganha em uma noite. Mas o
dinheiro vinha e ia fácil", afirmou.
Seis meses depois, Xavier carregava 18 quilos de maconha dentro
de uma sacola quando foi abordado por policiais.
Com o teatro, o jovem diz que
aprendeu o significado do personagem e se identificou. "Ele [Dom
Quixote] teve a coragem de abandonar tudo que achava errado."
Os relatos de Xavier fazem parte
também do projeto de ressocialização de ex-internos por meio da
arte. "Aqui a reincidência é zero",
disse a presidente do Instituto Religare, Valéria di Pietro, de 53
anos de idade e 34 de teatro.
(GP)
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