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Planos têm acesso a dado sigiloso de paciente
Pelo novo sistema da Agência Nacional de Saúde, todas as guias de consultas e de exames poderão conter o tipo de doença
Entidades médicas temem que as operadoras criem listas com pacientes que geram mais gastos, vetando alguns procedimentos
CLÁUDIA COLLUCCI
DA REPORTAGEM LOCAL
Um novo sistema implantado pela ANS (Agência Nacional
de Saúde Suplementar) permite que planos de saúde acessem
dados sigilosos do paciente. Ao
menos 40 milhões de brasileiros usam o sistema privado.
A mudança colocou em pé de
guerra entidades médicas e
operadoras. A principal polêmica do modelo Tiss (Troca de
Informações de Saúde Suplementar) é o fato de que, desde
1º de junho, todas as guias de
consultas e de exames poderão
conter o tipo de doença do paciente -traduzida por um código chamado de CID (Classificação Internacional de Doenças).
Antes, não havia essa padronização, já que uma resolução
do CFM (Conselho Federal de
Medicina) proíbe a prática por
considerar que ela fere o sigilo
entre o médico e o paciente.
Segundo a ANS, o sistema foi
criado para nortear o intercâmbio de dados entre os planos e os prestadores de serviço,
melhorar a qualidade de gestão
e coletar informações epidemiológicas, necessárias para o
planejamento de políticas de
saúde. Algumas operadoras já
fazem essa exigência ao médico, apesar da resolução.
Entidades como o CFM, a
AMB (Associação Médica Brasileira) e o Idec (defesa do consumidor) temem que, com esses dados, as operadoras criem
listas com pacientes que geram
mais gastos (como os crônicos), vetando procedimentos e
impondo sanções a médicos
(como o descredenciamento).
Em maio, já sabendo da mudança, o CFM editou uma resolução em que proíbe os médicos de pôr o CID ou o tempo de
doença do paciente nas guias
da Tiss de consulta e de solicitação de exames de seguradoras. Cita, entre outros, artigos
do Constituição, do Código Penal e do Código Civil, que garantem o direito à intimidade.
A ANS alega que, nesse momento, o preenchimento da
CID no formulário de papel por
médicos não é obrigatório, precisando ainda da anuência do
paciente. Mas, quando as guias
forem eletrônicas -o prazo final é novembro de 2008-, o
diagnóstico deverá ser posto.
As entidades médicas defendem que, na forma atual, não
há garantia de que a revelação
não vá prejudicar o paciente ou
o médico, que pode ser processado por quebra de sigilo.
"A decisão de divulgar ou não
a doença é uma questão de foro
íntimo", afirma Florisval Meinão, da AMB.
Para Aloísio Tibiriçá Miranda, conselheiro do CFM, a ANS
se omite. "A ANS deixou o campo aberto para que as operadoras exijam dos médicos a revelação da doença. Um dos pilares da relação médico e paciente é o sigilo profissional."
O conselho apóia a iniciativa
da ANS de promover estudos
epidemiológicos do sistema,
mas defende que, antes de tudo, é preciso proteger o paciente do uso indevido de seus dados médicos. "Se a idéia é ter
informações epidemiológicas,
não precisa relacionar o nome
do paciente ao atendimento.
Basta notificar a doença", sugere Geraldo Luiz Moreira Guedes, outro conselheiro do CFM.
Em nota, a ANS informa que
a questão da privacidade "não
tem razão de ser". "O preenchimento do campo referente à
CID permanece opcional nas
guias de consulta e só pode ser
efetuado com autorização do
beneficiário."
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