São Paulo, segunda-feira, 21 de julho de 2003 |
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MOACYR SCLIAR Sexo insólito
1. Melhor do que orgasmo
A relação entre os dois vinha deteriorando-se há algum tempo, mas ela só começou a se preocupar quando o marido
deixou de procurá-la para fazer
sexo. Interrogou-o a respeito; ele
disse que não havia nada demais,
andava cansado, só isso, trabalhando muito, tanto que várias
vezes voltava para casa tarde da
noite. Mas ela tinha certeza de
que alguma coisa estava acontecendo. A luz se fez quando descobriu o recorte da Folha de S.Paulo com a manchete: "Isso é melhor
do que orgasmo". Ex-jogador, o
marido certamente se sentira excitado pela afirmação.
Decidiu segui-lo. Descobriu que
ele estava saindo do trabalho à
hora habitual. Mas, em vez de ir
para casa, ele se dirigia a um ginásio ali perto para jogar vôlei,
naturalmente. Escondida, ela observou-o jogar. Não estava mais
em forma, afinal, era um quarentão, mas nenhum dos jogadores
mostrava mais entusiasmo do
que ele: cada cortada era um berro. Seu prazer era evidente. Para
ele, sem dúvida, vôlei era melhor
do que orgasmo.
Mulher inteligente, ela optou
por não criar um caso. Em vez
disso, está treinando vôlei em outro ginásio. Quando se sentir
pronta, aparecerá, de surpresa,
para jogar com ele. Os dois se enfrentarão na cancha. O que, ela
disso tem certeza, representará o
caminho para a volta ao orgasmo.
"Ai, papai, que erro o senhor cometeu, papai, que
erro. Eu sei que o senhor estava
bem-intencionado, eu sei que o
senhor só queria me ajudar, mas
mesmo assim foi um erro. O senhor sempre me disse que masturbação fazia mal à saúde; que
os masturbadores criavam cabelo
na palma da mão, que ficavam
cegos ou loucos. Era só eu fazer algum barulho na cama para o senhor invadir o meu quarto, perguntando se aquilo não era masturbação. Moacyr Scliar escreve às segundas-feiras, nesta coluna, um texto de ficção baseado em matérias publicadas no jornal. Texto Anterior: Outro lado: Secretário diz que vai rever repasse; ex culpa a inflação Próximo Texto: Há 50 anos Índice |
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