São Paulo, domingo, 21 de agosto de 2005

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LENDA URBANA

Desde 75, arquitetos propõem projetos para o local, mas idéias esbarram na falta de recursos e no impacto no trânsito

Sonho de demolir o Minhocão faz 30 anos

DA REPORTAGEM LOCAL

O prefeito havia sido empossado pouco tempo antes quando foi procurado por um arquiteto. Com uma série de argumentos, o profissional sugeriu ao político que demolisse o elevado Costa e Silva, popularmente conhecido como Minhocão e criticado como uma das obras mais feias de São Paulo. O prefeito, porém, nem sequer levou a idéia a sério. Pensando no custo político que a decisão lhe causaria, respondeu, brincando: "Você está querendo derrubar o Minhocão ou me derrubar?"
A anedota é real, e quem a conta é Roberto Mac Fadden, que ouviu o bem-humorado -mas direto- "não" do então prefeito Olavo Setúbal. A demolição do elevado, afirma ele, era necessária para a ampliação do metrô rumo à Barra Funda, zona oeste da cidade. "A linha precisou seguir um caminho tortuoso e mais caro devido ao Minhocão", diz o arquiteto. O elevado foi inaugurado por Paulo Maluf em 1971, e essa foi a primeira proposta feita à prefeitura para destruí-lo. O ano? 1975.
Nesses últimos 30 anos não faltaram outros pedidos, acompanhados de pesquisas e projetos, para que o viaduto fosse destruído ou, ao menos, passasse por um processo de requalificação. Na última semana, a discussão voltou à tona com a declaração do prefeito José Serra (PSDB) de que a demolição do elevado está sendo analisada por sua equipe técnica.
As idéias, porém, sempre esbarram nos mesmos problemas: custos e o impacto no trânsito.
Mais uma vez, Mac Fadden foi à prefeitura apresentar dados relacionados ao Minhocão. Na quarta-feira, ele se reuniu com a arquiteta Regina Monteiro, diretora da Emurb, que está montando um estudo sobre o viaduto.

Jardins da Babilônia
Há, porém, uma grande variedade de soluções elaboradas fora do governo. Uma delas é a do arquiteto Pitanga do Amparo, que prevê a transformação do elevado em um grande jardim suspenso.
Pelo projeto, o local teria duas faixas, destinadas a ônibus elétricos -o resto do espaço seria ocupado por jardins. O acesso aos pontos de ônibus seria por meio de plataformas entre o elevado e os prédios do entorno. "Fiz o projeto em 1986. O Jânio [Quadros, prefeito de São Paulo pela última vez entre 1986 e 1988] adorou."
Michel Gorski é outro arquiteto que também já levou sua proposta à prefeitura. De fato, ele tem levado sua proposta ao governo há pelo menos 12 anos. "A primeira vez foi na segunda gestão de Maluf [93-96]", diz Gorski. O projeto prevê a demolição do elevado. Não aborda, porém, veículos. "O trânsito tende a se acomodar."
Para não comprometer o fluxo de veículos, o engenheiro de tráfego José Tadeu Braz, da Brazhuman Engenharia e Consultoria, elaborou um estudo que remete às passagens feitas nos cruzamentos da Faria Lima com as avenidas Rebouças e Cidade Jardim (zona oeste). Segundo ele, se o Minhocão for demolido, a São João pode ter uma faixa para o fluxo mais rápido, que disporia de passagens subterrâneas nos cruzamentos.

Novo Minhocão
Embora considere a demolição a melhor alternativa, o arquiteto Ruy Ohtake pensou numa forma de harmonizar o elevado e o entorno. O novo Minhocão, diz, deveria atender a três aspectos.
O primeiro é a convivência com os moradores -para isso, ele deveria ser mais estreito e ter uma parede lateral alta, que diminuísse o incômodo do barulho e da fumaça. Outro aspecto é a relação da estrutura com quem passa sob ela. "A largura [do elevado] não pode ser maior do que a altura, ou a passagem sob ele fica sombria, desagradável." Por fim, diz o arquiteto, é preciso ter um desenho que contemple a questão estética.
Ohtake diz que estudou o Minhocão ao projetar o Fura-Fila, para evitar que o novo equipamento repetisse os mesmos erros. As obras do Fura-Fila, porém, estão paradas. No último mês, Serra foi a Brasília pedir cerca de R$ 200 milhões para concluir o projeto.

Moradores
A proposta de demolição divide os moradores dos edifícios que ficam ao lado do elevado.
Para a dona-de-casa Luzinete da Silva Leitão, 66, que mora na avenida São João desde que o Minhocão foi inaugurado, o trânsito se complicaria ainda mais com o fim do elevado.
Já a enfermeira Waldete Brás, 50, que mora há três anos na região, diz que seu apartamento chega a tremer com a passagem dos carros. Ela gostaria que a demolição fosse feita, mas teme o impacto na estrutura dos prédios.
Uma coisa, porém, é unanimidade entre os moradores ouvidos pela reportagem: todos pedem uma solução para os moradores de rua instalados sob o viaduto. A aposentada Irene Costa, 68, acha que o local é um reduto de mendigos. "O governo deveria se preocupar era em tirar eles de lá."


Colaborou RENATA BAPTISTA

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