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Fui enganada sobre Congonhas, diz juíza
Cecília Marcondes, do TRF, disse que recebeu de Denise Abreu, diretora da Anac, documento com falsas medidas de segurança
Documento foi usado para convencer a Justiça a liberar as operações no aeroporto, que estavam restritas para alguns tipos de aviões
ROGÉRIO PAGNAN
DA REPORTAGEM LOCAL
LEILA SUWWAN
DA SUCURSAL DE BRASÍLIA
A juíza do TRF (Tribunal Regional Federal) Cecília Marcondes disse ontem que recebeu das mãos da própria diretora da Anac (Agência Nacional
de Aviação Civil) Denise Abreu
o documento com as falsas medidas de segurança para pousos
de aviões em pista molhada no
aeroporto de Congonhas, em
São Paulo.
O documento foi utilizado
para convencer a Justiça a liberar, no início do ano, as operações no aeroporto, que estavam
restritas para alguns tipos de
aviões. O problema é que a tal
norma em questão, a IS-RBHA
121-189, não estava em vigor.
A "norma" que constava do
recurso ao TRF (3ª Região) vedava às empresas o uso de
aviões com um reverso inoperante em pistas molhadas.
Se estivesse sendo aplicada, o
acidente com o vôo 3054 da
TAM (199 mortes) teria sido
evitado -naquele dia, a aeronave estava com o reversor direito
inoperante, e a pista, molhada.
Na última quinta-feira, em
depoimento na CPI do Apagão
Aéreo do Senado, Denise disse
que o documento não tem valor
legal por se tratar de um "estudo interno", publicado no site
de internet da agência por "falha da área de informática".
"Ela [Denise] estava presente, tinha ciência absoluta da
existência daquele documento
que estava sendo apresentado
para mim. Até porque todos falavam a respeito dele", disse
ontem a juíza. "Ou mentiram
na CPI ou agiram com improbidade pelo fato de não terem
aplicado as regras estabelecidas por aquele documento."
Segundo a juíza, o documento foi entregue por Denise no
dia 22 de fevereiro.
A juíza disse que a diretora da
Anac foi auxiliada por dois técnicos que explicaram detalhadamente que as normas publicadas pela agência, contidas no
documento, garantiriam a segurança dos vôos. Convencida
pela comitiva, composta por
mais duas pessoas, a juíza suspendeu a restrição.
A diretora da Anac, ainda segundo Cecília, demonstrava
muita pressa na liberação do
aeroporto para todos os tipos
de avião. A decisão da Justiça
foi assinada horas depois.
A juíza afirmou que recebeu
a declarações de Denise com
"espanto muito grande" e "revolta". "Não é só a pessoa da juíza que está sendo enganada.
Está sendo enganada uma instituição, está sendo enganado
um Poder do Estado e por um
órgão que está também inserido dentro do Poder do Estado.
Isso é o mais grave de tudo."
E continuou: "Se nós não podemos confiar nas agências que
fiscalizam, não temos em quem
confiar. É uma situação muito
desagradável. É uma coisa extremamente séria, estamos
mexendo com vidas. Parece
uma brincadeira isso aqui".
A juíza disse que, mesmo
com a alegação da Anac, da não-validade do documento, a direção da agência não está isenta
de responsabilidade porque,
para a Justiça, a norma está em
vigor. "Por isso que deixei claro
que caberia responsabilidade
criminal e administrativa para
aqueles que não cumprissem
aquilo que estava escrito lá.
Deixei ressaltado para evitar
esquecimentos."
Investigação
O Ministério Público Federal
de São Paulo irá pedir que a
Anac seja investigada por improbidade administrativa e falsidade ideológica.
Para a Procuradoria-Geral da
Anac, subordinada à AGU (Advocacia-Geral da União), a sindicância aberta ontem deve investigar o grupo de técnicos
que subsidiou a estratégia de
defesa e "quem mandou".
"É preciso investigar se não
houve crime de falsidade ideológica e de improbidade administrativa", disse a procuradora
federal Fernanda Taubemblatt,
que moveu a ação inicial pedindo o fechamento da pista.
Dentro da Anac, o procurador-geral João Ilídio de Lima
Filho considera que os procuradores de São Paulo são responsáveis pela parte jurídica do
processo, não pelos anexos técnicos. "A peça jurídica está primorosa. No mérito, está perfeita. Agora, se alguém anexa um
documento para subsidiar a tese da defesa, então tem que ser
apurado o motivo, por que os
técnicos utilizaram o estudo e
por ordem de quem", disse.
As CPIs do Apagão Aéreo
também irão examinar o caso.
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