|
Texto Anterior | Próximo Texto | Índice
BARBARA GANCIA
Uma Heloísa Helena de verdade
Com sua cara de brasileirinha barrada no baile, Marina Silva é a bandeira que o mundo quer ver o Brasil hastear
|
A SEMANA avançou e Dilma foi
ficando pelo meio do caminho. Seu prestígio, que já tinha levado um belo tombo, tomou o
rumo da porta dos fundos quando os
senadores governistas resolveram
aceitar a versão "light" dos fatos, de
que a ex-chefona da Receita, Lina
Vieira, estivera, sim, com a ministra,
mas que ela não havia pedido privilégios especiais à família Sarney. E
acabou indo para o espaço sideral
quando o presidente Lula brecou a
divulgação de nota preparada pela
ministra-chefe da Casa Civil, em que
ela daria sua versão sobre o affair envolvendo Lina Vieira.
Não é só o fato de que Dilma agora
ficou marcada como mentirosa, de
que não tenha jogo de cintura ou
nem mesmo carisma. Não. O que ela
não parece ter é paixão, é vontade do
fundo do âmago do ser íntimo de ser
candidata. A impressão que dá é que
ela está lá apenas desempenhando o
seu papel de forma burocrática porque o presidente pediu, porque o PT
não tem outra opção.
Mas veja como o mundo é redondo. Justo quando Dilma é pega numa mentira grave (aliás, duas, se
contarmos a lorota do diploma),
exatamente na semana em que o
abscesso do PT é lancetado no julgamento de um aliado tão improvável
quanto José Sarney, jorrando o pus
do clientelismo para todo lado e deixando claro que o processo infeccioso chegou a níveis insuportáveis -o
senador Arns que o diga-, surge a figura beatificada de Marina Silva para resgatar uma utopia que já foi monopólio do partido.
O ex-ministro dos Transportes,
Mário Andreazza, costumava dizer
que nunca se deve trabalhar com
idealistas porque com eles não há
acordo possível. Faz sentido que ele
dissesse isso, não? Pois o PT se deteriorou por conta de suas próprias
contradições, e das cinzas surgiu essa figura impoluta, sem posses, sem
um escândalo que lhe marque a trajetória, sem fome de poder, com
vontade apenas de expor seus ideais,
professora e humanista que não cede ao populismo.
Com sua cara de brasileirinha barrada no baile, do ponto de vista pedagógico Marina Silva representa a
bandeira que o mundo quer ver o
Brasil hastear. Alfabetizada no Mobral, contaminada por metais pesados, vítima das doenças da floresta,
alguém que percorreu uma estrada
muito similar à de Lula, só que sem a
mácula do sindicalismo, o que ela
pensa sobre sustentabilidade e o
ambiente faz todo o sentido em um
país que possui 60% do que resta de
hectares "plantáveis" no mundo.
Que se dane se santa Marina não
tem um nome para o Banco Central,
ideias claras (ou qualquer ideia) sobre a economia e que seja adepta do
criacionismo, que nega as teorias de
Darwin, não é mesmo?
E, para os eleitores que andam
aderindo a essa maldição da pregação purista, que está dando à lei antifumo de Serra perto de 80% de aprovação, ou para o cara-pintada dormente que não faz parte da vendida
UNE e que está cheio de ficar gritando "Fora, Sarney" na internet para
ninguém ouvir, Marina Silva é uma
Heloísa Helena de verdade, um Cacareco não avacalhado, o voto de
protesto que dignifica.
Definitivamente, não foi a melhor
semana da vida da ministra Dilma
ou do PT.
barbara@uol.com.br
www.barbaragancia.com.br
Twitter: @barbaragancia
Texto Anterior: Foco: São Paulo planeja acabar com estacionamento dos dois lados da rua Próximo Texto: Qualidade das praias Índice
|