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Paulistano abandona "pesadelo" de usar carro
Trânsito, poluição e gastos com automóvel levam 3 pessoas a optar por alternativas de transporte, como bicicleta e metrô
Para se locomover em SP, 45% dos paulistanos usam carro; classe média ainda não migrou para transporte coletivo, segundo urbanista
GUSTAVO FIORATTI
DA REVISTA DA FOLHA
Com 240 mil veículos a mais
nas ruas de São Paulo nos últimos seis meses, que se uniram
a uma frota de seis milhões, o
carro é cada vez mais um pesadelo no qual os paulistanos se
vêem imersos diariamente.
Parado nos congestionamentos -o recorde foi de 266 km
em maio- ou na disputa inglória por uma vaga livre para estacionar, o automóvel virou um
trambolho que coloca em xeque a própria sobrevivência
da metrópole.
Para se locomover na cidade,
45% dos paulistanos preferem
o carro e outros 55% usam
meios de transporte coletivos.
O grupo que usa metrô, ônibus
e trem cresceu nos últimos cinco anos -eram 52,3% em 2002.
Mas os fatores que levaram a
esse fenômeno foram o aumento na renda das classes C e D e
programas da como o Bilhete
Único, que permitiram a inclusão de novos usuários.
"A classe média não migrou
para o transporte coletivo. Para
isso, falta uma política de integração de transportes e mais
conforto nos ônibus e no metrô", diz a urbanista Raquel
Rolnik. A rede de metrô de SP
dispõe apenas de 60 km. A de
Nova York tem 369 km, e a de
Londres, 400 km. São exemplos de metrópoles em que o
carro não é a melhor opção.
Abdicar do carro em São Paulo é uma decisão corajosa. Mas,
para um grupo de moradores,
essa foi uma saída. Eles aboliram ou restringiram ao máximo o uso do carro próprio. A
Folha apresenta as razões de
três deles, que sintetizam o nó
que é depender de um automóvel em São Paulo.
Gastos levaram à bicicleta
O produtor Alberth Murta,
26, acumulou R$ 1.200 só de
multas no último ano. O IPVA
de seu Fiat Strada foi de quase
R$ 800. Fora gasolina, licenciamento e outros gastos. "Fiz as
contas e, somando tudo, é um
dinheiro que posso investir em
um curso, por exemplo", diz.
Alberth decidiu vender o carro, que já tem comprador. Além
dos gastos, a decisão de se desfazer do veículo tem outros fatores. "Estou fazendo isso também por causa de toda a loucura que gira em torno do automóvel em São Paulo", diz. "A vida social urbana, por aqui, simplesmente não existe. As pessoas mal se olham na cara."
Para substituir o carro, o produtor passará a usar, de agora
em diante, bicicleta e táxis, intercalados. De bicicleta, ele vai
contribuir com as 345 mil viagens sobre duas rodas realizadas diariamente na capital.
Andando a pé
O diretor de planejamento
Alex Vendrametto, 42, nunca
gostou de dirigir. Mas a falta de
vagas livres nas ruas e o preço
dos estacionamentos -os valores chegam a R$ 15 por hora- o
fizeram decidir caminhar a pé
até o trabalho.
"Eu só uso [o carro] em situações específicas, como viajar ou
sair à noite", conta ele.
O trajeto de Moema ao Jardim Europa, passando por ruas
mais tranqüilas do bairro onde
mora, rouba cerca de 50 minutos do empresário apenas para
a ida. Não é tanto para quem já
chegou a fazer o mesmo caminho em mais de duas horas,
dentro de um automóvel.
"Depois de um tempo, isso se
torna um vício. Você passa a
gostar de andar a pé e a prestar
atenção em coisas que não são
possíveis de notar do carro."
Mais cidadania
Abdicar do carro pode ser
uma opção ideológica. "Eu sinto que exerço melhor minha cidadania", resume a atriz e professora Luciana Canton, 36,
quando questionada sobre sua
decisão de vender o carro. "Antes disso, eu era uma patricinha
que andava pela cidade com os
vidros sempre fechados", diz.
A decisão foi tomada depois
de três anos vivendo em Nova
York, onde é preciso gastar em
média US$ 40 diários (cerca de
R$ 75) para estacionar. "Foi lá
que eu "desbitolei" [do carro]",
brinca. "Hoje, estou acostumada a pegar ônibus e metrô."
Sobre a possibilidade de violência, Luciana argumenta que
"a única vez em que fui assaltada, eu estava de carro".
Também pesaram para a decisão dela as questões ecológicas. Na cidade de São paulo,
80% das fontes poluidoras são
compostas por automóveis.
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