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EDUCAÇÃO
Para Paulo Renato, atual modelo de financiamento das universidades deverá se esgotar em cinco ou seis anos
Ministro não vê sobrevida do ensino gratuito
VALDO CRUZ
DIRETOR-EXECUTIVO DA SUCURSAL DE BRASÍLIA
MARTA SALOMON
SECRETÁRIA DE REDAÇÃO DA SUCURSAL DE BRASÍLIA
O atual modelo de financiamento do ensino superior se esgotará
em cinco ou seis anos, e o país terá
de enfrentar logo uma polêmica
evitada nos quase sete anos de governo Fernando Henrique -a
sobrevivência do ensino gratuito
nas universidades.
A previsão é do ministro Paulo
Renato Souza (Educação), que
aponta os motivos: as matrículas
nas universidades cresceram 62%
sob FHC e a tendência é crescer
ainda mais. A maioria dos novos
universitários (67%) foi para as
escolas privadas.
"Os recursos são finitos, e a demanda é crescente. A sociedade
brasileira vai ter de decidir como é
que ela vai querer financiar o sistema no futuro. Manter o financiamento atual, por instituição,
ou partir para um financiamento
por pessoa, dependendo do nível
de renda", resume.
Para o ministro, obstinado com
a idéia de ser presidente, trata-se
de um tema tão indigesto quanto
a greve de funcionários e professores das universidades.
É na Andes (sindicato que representa docentes do ensino superior), que o professor Paulo Renato ajudou a fundar, que o ministro Paulo Renato põe a culpa
pelo impasse na negociação. Na
última quarta-feira, ele levou a
FHC o diagnóstico de que o movimento se radicalizara, não queria
negociar, mas apenas impor um
desgaste político ao governo.
Seus planos são isolar a Andes e
dividir o movimento com a promessa de pagar salários mediante
a garantia de reposição das aulas e
a realização dos vestibulares. Diz
que as vaias não abalaram seus
planos políticos.
A seguir, a entrevista concedida
à Folha na última quinta-feira.
Folha - Qual é a base do diagnóstico do governo de que os grevistas
não querem negociar, querem radicalizar?
Paulo Renato Souza - Há uma diferença clara entre servidores e
docentes. E a diferença está na liderança. Eu sou professor universitário, eu sei o que eles pensam.
No caso dos servidores, nós suspendemos o pagamento, mas
continuamos conversando. A
proposta que está sendo aprovada
é muito diferente da minha proposta original e diferente da original deles. Eu acho pessoalmente
uma solução ruim, mas é uma solução que eu respeito.
Folha - Por que ruim?
Paulo Renato - É uma incorporação que dá mais aumento para
quem ganha mais e para quem já
é aposentado. Já a direção da Andes... Em primeiro lugar, essa direção se elegeu com muito pouca
representatividade, com uma
proporção de professores que votaram inferior a 5% da categoria.
Se elegeu com um pouquinho acima da outra chapa, que era do PT
e mais razoável, pessoas que tinham uma visão de universidade.
Na proposta da chapa que venceu, que é do PSTU, um dos pontos era nunca ser recebido pelo
ministro, eles não queriam conversa. Eles aproveitaram a carona
da greve dos funcionários e entraram em greve, sem nunca ter sentado para negociar.
Folha - Se eles são tão pouco representativos, como é que conseguiram parar?
Paulo Renato - A adesão foi muito grande porque a universidade
já estava parada por causa dos
funcionários. Além disso, o mecanismo de assembléia favorece
quem tem militância. Eu me reuni
neste período com dirigentes de
associações de docentes ligados a
partidos de oposição, ao PT, ao
PC do B. Eles me disseram: ""Ministro, queremos negociar, mas o
mecanismo que eles montaram
nas assembléias não permite, nós
perdemos todas as votações".
Folha - Se a Andes não quer negociar, como a greve vai acabar?
Paulo Renato - A greve dos servidores deve acabar nos próximos
dias [a proposta do governo será
votada pelos servidores na próxima quarta-feira". Vamos comunicar aos reitores que, se aquela universidade decidir sair da greve, fixar um dia para iniciar as aulas e
se comprometer a repor o semestre e a fazer o vestibular, eu pago
imediatamente os docentes daquela universidade. Com o compromisso assinado pelo reitor.
Folha - O que o sr. acha que a Andes está fazendo na greve?
Paulo Renato - Política, para desgastar o governo FHC. O presidente da Andes [Roberto Leher"
declarou no rádio, um dia desses,
que o objetivo dele é fazer a maior
greve da história da América Latina. Se formos aceitar todas as propostas deles, custa cerca de R$ 1
bilhão. Com R$ 1 bilhão eu faço
outras coisas muito mais importantes para a educação.
Folha - Por exemplo?
Paulo Renato - Dá para aumentar em 50% o Bolsa-Escola.
Folha - O sr. acha a universidade
federal brasileira muito cara?
Paulo Renato - Melhorou muito,
mas ainda tem muito desperdício
de dinheiro público. O que nós fizemos nestes anos foi manter a
qualidade, melhorar a qualidade e
exigir mais em termos de prestação de serviços à sociedade.
Folha - Algum tipo de cobrança
dos alunos pode prosperar?
Paulo Renato - É um tema extremamente polêmico. Nunca esteve
nas nossas propostas cobrar do
ensino superior público. Mas é
um assunto que vai ter de ser discutido. Obviamente, os recursos
são finitos e nós temos uma demanda crescente. O número de
alunos das universidades nos últimos seis anos cresceu 62%. Vai
aumentar mais ainda, porque o
ensino médio cresceu 70% e sua
conclusão cresceu 100%. Então a
tendência é crescente. E quem são
essas pessoas? São os nossos filhos? Não. Os filhos dos ricos e da
classe média já estavam na universidade. Quem está se incorporando agora são novos segmentos, de camadas mais baixa de
renda, que precisam estudar e que
precisam ter um financiamento.
A sociedade brasileira vai ter de
decidir como é que ela vai querer
financiar o sistema no futuro.
Manter o financiamento atual,
por instituição, ou partir para um
financiamento por pessoa, dependendo do nível de renda.
Folha - O atual sistema tem sobrevida de quanto tempo?
Paulo Renato - Acho que em
mais cinco ou seis anos se esgota.
Folha - Qual sua proposta?
Paulo Renato - Eu não tenho
proposta nesse sentido. Eu acho
que é um problema, não está colocado ainda, mas será colocado.
Meu tempo no Ministério da Educação termina em abril de 2002.
Folha - E se o sr. for convidado para o próximo governo?
Paulo Renato - Se eu for o próximo presidente, aí eu vou montar
uma equipe para pensar esse assunto. Por enquanto, não.
Folha - Mas o sr. disse que hoje é
por instituição e poderia ser por
aluno, por faixa de renda...
Paulo Renato - Por faixa de renda, os mais pobres, enfim. Mas isso é um problema que a sociedade
terá de discutir. É um grande dilema que o Brasil terá de enfrentar.
Folha - Como o sr. se sentiu ao ser
xingado durante a greve?
Paulo Renato - Eu sou cidadão,
mereço ser respeitado como cidadão e ainda mais como ministro.
Eu acho que esses casos nós temos de processar. Eu estou buscando a identificação destas pessoas, quem xinga tem de ser processado. A regra democrática no
nosso país tem que ser respeitada.
Folha - O sr. sente constrangimento em sair na rua?
Paulo Renato - Não. Em geral, as
pessoas me cumprimentam pela
minha política em relação ao ensino superior, pelo provão. Ele é
que dá mais ibope.
Folha - Para quem tem pretensão
política, a greve não é ruim?
Paulo Renato - Ou bom.
Folha - Como bom?
Paulo Renato - Depende. Eu não
posso pensar, em sendo ministro,
qual a consequência eleitoral de
um ato meu, porque aí eu vou deixar de ser ministro.
Folha - O sr. não se decepcionou
por causa das vaias que levou?
Paulo Renato - Ao contrário.
Não fiz outra coisa na minha vida
pública a não ser enfrentar manifestações, a favor e contra. Fui
fundador da Andes, organizei o
congresso que a fundou, em Campinas. Quando trabalhei no governo Montoro [foi secretário da
Educação", tomei muita vaia numa reunião com o funcionalismo.
Folha - O sr. participou de alguma
greve do outro lado?
Paulo Renato - Sem dúvida. Fui
daquela greve de 78 contra o Maluf. Eu era negociador pelo lado
dos grevistas. Ficamos quase dois
meses parados. Depois, enfrentei
greve como reitor da Unicamp.
Era reitor, era contra a greve, tinha a responsabilidade da administração. Então, não dá para uma
pessoa, só porque é da área, porque é professor universitário, assumir uma atitude de "sou o representante da educação no governo FHC". Não, eu sou governo. Se tenho de assumir atitudes
duras, tomarei atitudes duras.
Folha - Existe a possibilidade de
intervenção no caso de a greve não
terminar?
Paulo Renato - Não, não. Por enquanto, não. Só se algum reitor se
recusar a ser reitor.
Folha - O sr. foi muito criticado
por segurar os salários dos grevistas, segurou até daqueles que estavam trabalhando ...
Paulo Renato - Não, eu não segurei de quem estava trabalhando,
as universidades é que não pagaram. Eu pergunto: no setor privado, quantos dias, quantas horas
uma pessoa faz greve recebendo
salário? Agora, o dinheiro do setor público é nosso, por que no setor público pode? Eu acho que no
setor público temos de ser mais
exigentes do que no setor privado.
Folha - Se houvesse uma margem
um pouco maior no orçamento, seria o caso de ampliar o atendimento às reivindicações salariais?
Paulo Renato - Olha, eu acho que
os professores universitários recebem mais ou menos aquilo que o
mercado de trabalho no Brasil paga para a categoria. Os funcionários, não, eles estavam defasados e
nós atrasamos a solução.
Folha - Essa greve não prejudica
sua candidatura presidencial?
Paulo Renato - Tenho de ser ministro até sair do governo. É minha primeira preocupação.
Folha - O sr. acha que tem alguma
chance?
Paulo Renato - Olha, eu acho que
as coisas nunca estiveram tão
boas para mim.
Folha - Por quê?
Paulo Renato - No passado, houve algum momento melhor para
mim? Olha, pela quantidade de
plantações nos jornais, de gente
me batendo e tal, é porque devo
estar incomodando. Gente querendo que eu saia, plantando que
agora é Fla-Flu [Tasso e Serra", o
presidente quer isso... Eu fui falar
com todas as pessoas e ninguém
quer Fla-Flu.
Folha - Se não for o sr., qual será o
seu candidato?
Paulo Renato - Sou eu. Se não for
eu, é o do partido.
Folha - Qualquer que seja o candidato da aliança ou só do PSDB?
Paulo Renato - Eu defendo a
aliança. Mas a liderança tem que
ser nossa porque nós é que temos
o projeto de mudanças.
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