São Paulo, quarta-feira, 21 de dezembro de 2005

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URBANIDADE

Escola do rio

GILBERTO DIMENSTEIN
COLUNISTA DA FOLHA

João Nojiri é daqueles exemplos da prioridade dos japoneses pela educação. Seu pai, Quimio, vendia frutas e verduras na Ceagesp, mas conseguiu mantê-lo no colégio Santa Cruz, freqüentado pela elite paulistana. "Sempre nos foi dito que o estudo era a coisa mais importante na vida", conta João, hoje com 38 anos. Ele se formou na Poli, especializou-se em explosões e montou sua própria empresa de engenharia. Está agora se preparando para criar uma escola num dos cenários mais improváveis da cidade -o rio Tietê, um esgoto a céu aberto.
A bordo de um barco, as primeiras experiências o estimulam a ir em frente. Ele vem convidando professores para um passeio. "Todos saem das aulas impressionados, nunca imaginavam que navegariam ali." A escola, na verdade, é uma conseqüência não planejada de um negócio sem nenhuma relação com a educação.
Sua empresa de engenharia foi chamada para participar das obras do Tietê, mas o serviço terminou; a inauguração deve ocorrer em janeiro próximo, mês do aniversário de São Paulo. "Não queria ir embora do rio." Trouxe para lá um barco, com capacidade para 200 passageiros, e montou com seu sócio, Andrelino Novazzi, um projeto para dar aulas para crianças e adolescentes sobre a importância daquele rio e, a partir daí, estabelecer o cruzamento com as mais diversas matérias como história, geografia ou química. "Não é possível entender a história de São Paulo, nem a do Brasil, sem estudar o Tietê."
O barco, por enquanto, está servindo para um propósito ainda mais inusitado do que o escolar. O grupo Teatro da Vertigem faz dele espaço de encenação da peça "BR-3", ainda em fase de ensaio, que, além do barco, onde fica a platéia, usa as margens do rio; os cenários são instalados debaixo dos viadutos, percorridos, à noite, a pé ou de barco pelos atores. João quer mais do que eventos episódicos e planeja até erguer, nas margens do rio, um centro educativo e cultural.
O centro cultural faz parte de uma aposta de João sobre o futuro daquela paisagem desprezada, onde, no passado, se disputavam torneios de natação. A aposta é que o Tietê será usado como meio de transporte regular para driblar o congestionamento das marginais. O que, por enquanto, ainda soa mais como um insólito roteiro teatral do que realidade. "É um desperdício não usarem o Tietê."


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