São Paulo, domingo, 22 de março de 2009

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Excomunhão ainda causa dúvidas entre as pessoas, diz padre

Membro do Tribunal Eclesiástico de SP diz que fiel punido pode voltar a comungar caso se arrependa do pecado

Segundo padre, quem é penalizado não vai para o inferno e punição é registrada em documento interno da igreja


DANIEL BERGAMASCO
DA REPORTAGEM LOCAL

A excomunhão de envolvidos no aborto da menina de nove anos que havia sido estuprada pelo padrasto em Alagoinha (PE) levantou dúvidas sobre as regras da penalidade, a maior da Igreja Católica.
"Há muita confusão sobre o assunto. A pessoa não vai para o inferno e não tem seu batismo anulado", explica o padre Eduardo Vieira dos Santos, membro do Tribunal Eclesiástico de São Paulo, na entrevista abaixo.
O código de direito canônico prevê excomunhão em nove casos, entre eles o aborto, mas sua aplicação motiva debate dentro da própria Igreja Católica, como no caso de Alagoinha. Depois que o arcebispo de Olinda e Recife, dom José Cardoso Sobrinho, anunciou no início do mês que os médicos da cirurgia e a mãe da menina estavam excomungados segundo os preceitos do direito canônico, a igreja recuou. A Confederação Nacional de Bispos do Brasil (CNBB) disse que a punição não se aplicava à mãe, por ela ter agido sob pressão temendo a morte da filha, e que não era possível apontar quais médicos estavam incluídos na pena, pois é desconhecida a responsabilidade de cada membro da equipe na cirurgia.

 

FOLHA - O que acontece com quem é excomungado?
PADRE EDUARDO VIEIRA DOS SANTOS
- Primeiro, é preciso entender o que é direito eclesiástico, uma lei objetiva que visa o bem da comunidade católica, e o conceito de comunhão, que é a sintonia dos cristãos para um bem comum. Quem é excomungado está fora da comunhão e está privado de ter acesso aos sacramentos [matrimônio, eucaristia, confissão, etc], que são bens espirituais da igreja.

FOLHA - O fiel excomungado deixa de ser católico?
PADRE SANTOS
- Não. A excomunhão não anula o batismo. E ela pode ser revertida, se houver arrependimento. O objetivo é esse, provocar o arrependimento. E quem é penalizado não vai para o inferno, diferentemente do que algumas pessoas pensam. Você sabe da infinita misericórdia de Deus, que salva nas mais infinitas formas. Cristo morreu por todos, não só pelos cristãos.

FOLHA - Quem aplica a excomunhão?
PADRE SANTOS
- O papa ou o bispo diocesano para seus súditos. Eles chamam [o fiel para conversar] e comunicam que houve a excomunhão segundo o direito canônico. Quem comete o aborto, por exemplo, já não está em comunhão, a não ser que se arrependa do que fez. Se estiver arrependido, acaba a pena.

FOLHA - O que acontece burocraticamente?
PADRE SANTOS
- A pena é registrada em arquivos da igreja

FOLHA - A excomunhão fica registrada no batistério (certidão de batismo) do católico, que é pedido para realização dos casamentos?
PADRE SANTOS
- Não. Mas, se essa pessoa se casar na igreja em uma cidade onde não saibam da excomunhão, esse matrimônio não valerá perante Deus e perante sua própria fé. Ainda que outras pessoas não saibam da excomunhão, ela sabe o que aconteceu.

FOLHA - Por que aborto é passível de excomunhão e um assassinato não é?
PADRE SANTOS
- Um assassinato é um pecado grave e há outros tipos de punição para ele. A excomunhão é prevista para casos específicos, como apostasia (abandono da religião) ou para o sacerdote que deixa de punir o cúmplice de seu pecado contra a castidade.

FOLHA - Há na internet movimentos de pessoas que dizem ter intenção de escrever para a igreja pedindo para ser excomungadas. Isso é possível?
PADRE SANTOS
- Esse pedido não faz sentido. Se a pessoa negar o batismo na Igreja Católica, ela pode deixar de crer em Deus ou ir para outra igreja. Basta deixar de frequentar e acreditar [para que esteja excomungada], mesmo que nenhum bispo lhe comunique isso.


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