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Excomunhão ainda causa dúvidas entre as pessoas, diz padre
Membro do Tribunal Eclesiástico de SP diz que fiel punido
pode voltar a comungar caso se arrependa do pecado
Segundo padre, quem é penalizado
não vai para o inferno e punição é registrada em documento interno da igreja
DANIEL BERGAMASCO
DA REPORTAGEM LOCAL
A excomunhão de envolvidos
no aborto da menina de nove
anos que havia sido estuprada
pelo padrasto em Alagoinha
(PE) levantou dúvidas sobre as
regras da penalidade, a maior
da Igreja Católica.
"Há muita confusão sobre o
assunto. A pessoa não vai para o
inferno e não tem seu batismo
anulado", explica o padre
Eduardo Vieira dos Santos,
membro do Tribunal Eclesiástico de São Paulo, na entrevista
abaixo.
O código de direito canônico
prevê excomunhão em nove casos, entre eles o aborto, mas sua
aplicação motiva debate dentro
da própria Igreja Católica, como no caso de Alagoinha.
Depois que o arcebispo de
Olinda e Recife, dom José Cardoso Sobrinho, anunciou no
início do mês que os médicos da
cirurgia e a mãe da menina estavam excomungados segundo
os preceitos do direito canônico, a igreja recuou. A Confederação Nacional de Bispos do
Brasil (CNBB) disse que a punição não se aplicava à mãe, por
ela ter agido sob pressão temendo a morte da filha, e que
não era possível apontar quais
médicos estavam incluídos na
pena, pois é desconhecida a responsabilidade de cada membro
da equipe na cirurgia.
FOLHA - O que acontece com quem
é excomungado?
PADRE EDUARDO VIEIRA DOS SANTOS
- Primeiro, é preciso entender o que é direito eclesiástico,
uma lei objetiva que visa o bem
da comunidade católica, e o
conceito de comunhão, que é a
sintonia dos cristãos para um
bem comum. Quem é excomungado está fora da comunhão e está privado de ter acesso aos sacramentos [matrimônio, eucaristia, confissão, etc],
que são bens espirituais da
igreja.
FOLHA - O fiel excomungado deixa
de ser católico?
PADRE SANTOS - Não. A excomunhão não anula o batismo. E ela
pode ser revertida, se houver
arrependimento. O objetivo é
esse, provocar o arrependimento. E quem é penalizado
não vai para o inferno, diferentemente do que algumas pessoas pensam. Você sabe da infinita misericórdia de Deus, que
salva nas mais infinitas formas.
Cristo morreu por todos, não só
pelos cristãos.
FOLHA - Quem aplica a excomunhão?
PADRE SANTOS - O papa ou o bispo diocesano para seus súditos.
Eles chamam [o fiel para conversar] e comunicam que houve a excomunhão segundo o direito canônico. Quem comete o
aborto, por exemplo, já não está
em comunhão, a não ser que se
arrependa do que fez. Se estiver
arrependido, acaba a pena.
FOLHA - O que acontece burocraticamente?
PADRE SANTOS - A pena é registrada em arquivos da igreja
FOLHA - A excomunhão fica registrada no batistério (certidão de batismo) do católico, que é pedido para realização dos casamentos?
PADRE SANTOS - Não. Mas, se essa pessoa se casar na igreja em
uma cidade onde não saibam
da excomunhão, esse matrimônio não valerá perante Deus e
perante sua própria fé. Ainda
que outras pessoas não saibam
da excomunhão, ela sabe o que
aconteceu.
FOLHA - Por que aborto é passível
de excomunhão e um assassinato
não é?
PADRE SANTOS - Um assassinato
é um pecado grave e há outros
tipos de punição para ele. A excomunhão é prevista para casos específicos, como apostasia
(abandono da religião) ou para
o sacerdote que deixa de punir
o cúmplice de seu pecado contra a castidade.
FOLHA - Há na internet movimentos de pessoas que dizem ter intenção de escrever
para a igreja pedindo para
ser excomungadas. Isso é
possível?
PADRE SANTOS - Esse pedido não
faz sentido. Se a pessoa negar o
batismo na Igreja Católica, ela
pode deixar de crer em Deus ou
ir para outra igreja. Basta deixar de frequentar e acreditar
[para que esteja excomungada],
mesmo que nenhum bispo lhe
comunique isso.
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