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PARAÍSO PERDIDO
Duplicação da rodovia Fernão Dias ameaça a qualidade de vida na região de Atibaia e na capital
Nova Fernão pode ser viagem frustrada
FABIO SCHIVARTCHE
MARTA AVANCINI
da Reportagem Local
A duplicação da rodovia Fernão
Dias pode piorar a qualidade de
vida dos moradores de Atibaia,
Bragança Paulista e municípios vizinhos e transformar o êxodo do
paulistano para a região em uma
viagem frustrada.
As estâncias turísticas dessa
área, ainda hoje oásis de tranquilidade, vivem um crescimento superacelerado, desde que o governo estadual anunciou a intenção
de iniciar as obras no trecho paulista da estrada, considerada uma
das mais perigosas do Estado. Foram 825 mortes só nesta década
-uma a cada três dias, em média.
Mas as projeções que indicam
que a população dessas áreas vai
dobrar em cinco anos não vêm
acompanhadas de obras de infra-estrutura, dizem especialistas
em urbanismo e até o prefeito de
Atibaia, Pedro Maturana (PFL).
Hoje, apenas 60% dos atibaienses recebem água tratada e o esgoto só serve 50% da população. Pelas projeções, a cidade vai ter mais
de 200 mil moradores em 2003.
"Não temos estrutura para oferecer a essas pessoas que estão
chegando e vamos ter os problemas normais de uma cidade que
evolui. Mas estamos trabalhando
para ampliar o sistema de ensino e
de saúde", diz Maturana.
Moradores temem que a migração da classe alta paulistana para
os municípios ao longo da nova
Fernão -que está se instalando
em condomínios fechados-
atraia também elementos indesejáveis da vida urbana: o trânsito e
a criminalidade.
"Mudar para Atibaia foi a melhor coisa que fiz na vida, mas tenho medo de que a duplicação da
Fernão Dias acabe com o sossego e
transforme esse paraíso em uma
segunda São Paulo", diz Eliana
Bastos Marquetti, que saiu da capital há menos de um ano.
O crescimento da região, que está dinamizando a economia,
atraindo indústrias e serviços para
os municípios, tem seu lado negativo e pode produzir efeitos desastrosos.
Lixo e ocupações irregulares em
áreas de mananciais comprometeriam o abastecimento de água até
na cidade de São Paulo -já que
cerca de 66% da água consumida
na capital vêm dos mananciais da
região da Cantareira.
Bragança é o único município da
região que tem aterro sanitário.
Atibaia tem apenas uma usina de
lixo reciclável.
Já a ampliação dos empreendimentos imobiliários deve reduzir
a área verde, podendo até mesmo
alterar o clima da região -que é
um dos principais fatores de atração dos veranistas e praticantes de
esportes radicais. Esse processo de
desmatamento já ocorreu em São
Paulo, sendo um dos motivos pela
diferença de até 3C na temperatura entre o centro da cidade e a
periferia, com mais área verde.
"O processo de industrialização e
ocupação e uso do solo dessa região tinha de ser pensado para que
a duplicação ocorresse com a estrutura pronta, para suportar o
impacto que vem aí", diz João Luiz
Hoefel, professor de gestão ambiental da Faculdade de Economia
e Administração da Universidade
São Francisco.
Ele diz que, se o Poder Público reproduzir o modelo de ocupação
do solo da cidade de São Paulo, estaremos reproduzindo os mesmos
bolsões de miséria localizados. "Se
não tomarmos cuidado, podemos
ter uma favelização da região."
A migração para a região de Atibaia é "inexorável", na opinião da
urbanista Raquel Rolnik.
"O eixo São Paulo-Atibaia será tão
forte quanto os eixos São Paulo-Campinas e São Paulo-São José
dos Campos, que cresceram a partir dos anos 70."
Destino marcado
A rodovia duplicada não é indicativo do fim dos congestionamentos. O destino de quem se mudar para Atibaia poderá ser parecido com o de quem, nos anos 70,
foi para Alphaville, em Barueri, e
hoje tem de conviver com os congestionamentos da rodovia Castelo Branco. Na nova Fernão, o problema ficará no entroncamento
com a marginal Tietê.
"As pessoas saem de São Paulo
para viver melhor, mas acabam
convivendo com os mesmos problemas de quem vive na cidade,
porque mantêm seus trabalhos e
vida social na capital", diz Regina
Monteiro, vice-presidente do movimento Defenda São Paulo (entidade que reúne 250 associações de
bairro de São Paulo).
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